Opinião e responsabilidade

Por Marcos Araújo

30/05/2019 às 07h01 - Atualizada 29/05/2019 às 19h41

Vivemos em uma era em que a opinião tem tido mais força do que o ato em si. Opiniões se transformaram em passaporte para se alcançar a notoriedade no mundo digital. Seus autores não se furtam de lançá-las à caça de likes e até dislikes. Viver a democracia é ter a possibilidade de se expressar. E que bom que temos condições para isso! Todavia, há um lado perverso neste processo. A interação proporcionada pelas redes sociais também despertou assombrações, que, a toda hora e acerca de qualquer tema, saem dos recônditos para nos deixar de cabelos em pé!

A palavra “espantado” serve para definir o estado em que fiquei ao me deparar, nesta semana, com duas opiniões publicadas na internet. A primeira é o comentário realizado pela dita digital influencer Day McCarthy, que é já famosa por se envolver em polêmicas nas redes sociais. Em relação à morte do cantor Gabriel Diniz, em um acidente aéreo, na última segunda-feira (27), ela direcionou seus ataques à cantora Anitta. “Que o próximo jatinho caia com a cantora #Anitta dentro”, publicou a influencer em vídeo. Claro que houve revolta dos internautas contra o discurso de ódio propalado pela moça.

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A segunda diz respeito à mobilização realizada, em Juiz de Fora, no dia 21 deste mês, por representantes do Coletivo Liberdade e da Associação Juntos Somos Fortes, ambos ligados à luta por melhores condições de cumprimento de pena nas unidades prisionais do município. O ato teve o objetivo de chamar a atenção das autoridades e da população para a morte do detento Cláudio Marcos Magalhães, de 39 anos, que teria falecido após passar mal e sentir falta de ar dentro de uma cela, na penitenciária Ariosvaldo Campos Pires, também neste mês.

O grupo se dirigiu ao Ministério Público a fim de entregar ao órgão uma representação, solicitando a abertura de investigação para apuração das causas da morte de Cláudio. Há a suspeita, por parte de familiares, de ter havido negligência no atendimento médico prestado ao detento. Imediatamente após a publicação desta matéria, os haters de plantão começaram a espalhar ódio, afirmando que presos não são gente e que, sim, deveriam morrer, já que seriam o lixo da sociedade. Em um dos comentários, uma pessoa disse que seria ótimo se uma virose acometesse os acautelados, para que houvesse mortes em massa dentro do complexo penitenciário, numa forma de higienização da sociedade. Eu pergunto: onde foi parar a compaixão dessa gente que acha normal desejar a morte de outras pessoas sem ter o menor pudor? Sem considerar a dor de parentes e de amigos dos alvos de seus ataques! Falta de empatia traduzida em palavras duras contra quem já está fragilizado.

No reino das opiniões, “seus súditos” têm opinião formada sobre tudo e sobre todos. Nada passa batido, e é obrigatório opinar a respeito de qualquer coisa. Essa explosão de comentários, segundo especialistas, é resultado da hiperconectividade, um fenômeno que pode ser explicado também como o ato de se manter on-line o tempo todo. Para as empresas que controlam as redes sociais, isso rende lucros, já que, a cada preferência exposta nas opiniões, o internauta é transformado em produto para o marketing. E, na tentativa de traçar um perfil completo do usuário, ele é incentivado a opinar a toda hora acerca dos mais variados temas.

Assim, tudo se tornou opinião e se confunde com ela. O prejuízo disso é a pulverização do que até então tínhamos como análises especializadas e pautadas em conhecimento e pesquisas. O que o Zé Ninguém pensa sobre política equipara-se à avaliação feita por um cientista político com título de doutor. Não estou me posicionando contra a liberdade de expressão, mas estou refletindo sobre como a hierarquia foi jogada para escanteio e com uma grande massa passando o pano nessa questão. Uma pesquisa científica, por exemplo, não pode ser questionada com achismo. Para contestá-la, são necessários dados também científicos. Isso é o que deve ficar claro para as pessoas! A existência de autoridades em determinados assuntos serve-nos de referência, pois senão estaríamos mergulhados na ignorância. No caso dos comentários na internet, além de promoverem essa equivalência perigosa de opiniões, há a propagação da cultura do ódio, do medo e da morte, sem remorso nem peso de consciência. É preciso dar um basta no avanço desta onda de rancor e resgatar nossa humanidade e usar nossa liberdade para opinar com responsabilidade!

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Marcos Araújo

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