Tragédia mais do que anunciada

Por Marcos Araújo

05/03/2023 às 07h00 - Atualizada 05/03/2023 às 19h22

Quando se pensa na ocorrência de eventos extremos, determinar o que será tragédia, ou não, é saber como nós, seres humanos, estamos nos preparando para lidar com as consequências das mudanças climáticas. Especialistas alertam que o clima já está alterado, e a forma de evitar a morte de mais 50 pessoas, como ocorreu no litoral norte de São Paulo durante o carnaval, é justamente ter uma preparação, a fim de reagir de forma adequada ante os riscos provocados por fenômenos meteorológicos de grandes proporções.

Quando uma tragédia está mais do que anunciada, a catástrofe é não fazer nada antes que o pior aconteça, antes que vidas sejam perdidas em tsunamis de terra. Categóricos, estudiosos do clima sentenciam: não existe naturalidade em desastres ocorridos em ambiente urbano. O que se sucede é a omissão, é a falta de políticas públicas para amenizar as sequelas da mudança do clima. Diante do futuro que se anuncia, saber adaptar-se é uma questão de vida ou de morte.

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Pesquisadores do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas da Organização das Nações Unidas (ONU) não se cansam de indicar que a nossa influência, como moradores da Terra, nosso planeta-casa, foi capaz de promover, ao longo de nossa trajetória, o aquecimento mais rápido em um período de dois mil anos. E já produzimos uma temperatura média que supera o período pré-industrial em mais de 1°C.

A ação humana acumulada desde a Revolução Industrial, nos séculos 18 e 19, já produziu significativas alterações no clima global. Em razão disso, ambientalistas e pesquisadores avisam que adaptar moradias e cidades a essa realidade é uma necessidade que requer respostas urgentes. Estimativas dão conta de que a temperatura pode aumentar 1,8°C daqui a 80 anos, mesmo se forem cumpridas todas as metas do Acordo de Paris, realizado em 2015, quando foi feito um pacto para a redução das emissões de gases de efeito estufa. Se as propostas não forem cumpridas, cenários devastadores para a biodiversidade são o que nos aguardam em um mundo mais quente, com aquecimento de até 3°C.

Com mais calor, além da extinção de espécies e do desequilíbrio de ecossistemas, episódios como temporais, inundações, secas e ondas de frio e calor se tornarão mais frequentes. E como não podia deixar de ser, nessa Terra mais hostil que se vislumbra, são os mais pobres que mais vão sofrer. As vítimas desse problema mundial serão, principalmente, as pessoas que já acumulam outras vulnerabilidades sociais, como menor acesso à saúde, a moradias seguras, a empregos formais e à infraestrutura urbana, mesmo que elas sejam as que menos contribuíram para tal situação.

As mudanças climáticas funcionam como motriz de geração de pobreza e desigualdade social e vão atingir de forma mais cruel a população preta e periférica e, principalmente, as mulheres que, diante desse quadro que foi pintado, encontram-se em um nível maior ainda de fragilidade. Já os que mais contribuem para o aquecimento global, os ricos, donos dos grandes conglomerados e consumidores natos, serão os que terão mais chances de amenizar os resultados do aquecimento global, pois, quando necessário, poderão até deixar as áreas de riscos em seus helicópteros fretados.

Nossa sociedade é desigual e continua sendo desigual mesmo em tempo de tragédias. Diante dessa realidade, é preciso encontrar novas formas de lidar com essas mazelas. A adaptação a esse novo clima se faz imediata antes que mais cidades brasileiras tenham que chorar seus mortos em plena festa de carnaval.

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Marcos Araújo

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