Ser gentil é um ato de coragem

Por Marcos Araújo

12/03/2023 às 07h00 - Atualizada 10/03/2023 às 17h41

Na porta da escola, antes de se despedir, ouço a  mãe dizer para a filha: “Seja gentil com as pessoas”. A criança, que parece ter idade para estar nos anos iniciais do ensino fundamental, abre um pequeno sorriso e parece compreender o que sua mãe lhe pediu. A cena, de tão singela, poderia arrancar lágrimas dos mais sensíveis, caso fizesse parte de um filme. Diante de um mundo tão embrutecido, em que cada vez mais torna-se raro alguém desejar “bom dia” ou “boa tarde” para quem está a seu lado, ensinar às novas gerações a necessidade da gentileza nas relações entre as pessoas é vital. Sem essa qualidade de sermos amáveis uns com os outros, perde-se aquilo que há de humano em nós. 

Há quem pense que gentileza é sinal de fraqueza. Em uma época em que viver é tão competitivo, em que chegar primeiro é sempre o desafio a ser vencido, estender a mão ao colega é visto como “baixar a guarda”. Uma espécie de vacilo, que seria uma contribuição para se “dar sorte ao azar”. Mas, diante do pedido da mãe para sua filha, quero crer que algo possa estar começando a mudar, mesmo que essa minha crença pareça ser inocente. Existe uma movimentação de pessoas, que ainda é muito pequena e quase invisível, em prol da amabilidade. O propósito dessa gente é transformar a ideia de gentileza, para que, em vez de fragilidade, possa indicar coragem. Sim, porque em meio à tanta estupidez, ser gentil é um ato de coragem. 

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É tudo papo-furado vão pensar muitos ao lerem este texto. Conversa para boi dormir, outros pensarão. Mas, você que chegou sua leitura até aqui, vasculhe suas memórias e reflita como uma simples palavra ou um gesto atencioso já fez toda a diferença na sua vida num momento de apuro. Se é assim com você, é assim com todo mundo. E, se é assim com todo mundo, por que todo mundo não é assim? A gentileza não é a chave que vai consertar as mazelas de nossa sociedade, mas, indubitavelmente, vai contribuir para que o fardo seja menos pesado. 

Muito do que precisamos fazer ao longo de nossa trajetória de vida precisa de treino. “A prática leva à perfeição” é o conselho que ouvimos para melhorar nossa habilidade em quase tudo que nos propomos a realizar. Ninguém nasce sabendo tudo, não é assim? Até o beijo, quanto mais se beija, fica melhor. Então, gentileza é algo que requer hábito e necessidade de prática para que seja melhorada. É difícil, eu sei, mas não deveria ser. Nos manuais de comportamentos sociais, existem receitas de como começar a ser gentil. Sugerem que, sempre ao acordar, é bom pensar em um ato de gentileza para destiná-lo a alguém.

Parece até brincadeira, mas sem dedicação é impossível uma mudança de comportamento. Para se alcançar resultados, é preciso estabelecer metas, dirão os mais pragmáticos. E também não dá para esquecer que a gentileza tem o poder de contaminar as pessoas, porque, quando se recebe um gesto gentil, tem-se a vontade de ser gentil com o outro alguém. O grande problema atual é como acender essa fagulha. Aquela mãe na porta da escola, com certeza, já aprendeu a importância de ser faísca.

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Marcos Araújo

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