A ex-garota de programa, o cinema e a imbecilidade

Por Marcos Araújo

25/07/2019 às 07h15 - Atualizada 25/07/2019 às 07h16

O cinema é uma das janelas para o mundo. Por meio da sétima arte, temos a oportunidade de conhecer outros lugares, outras culturas, outras gentes, outras visões de mundo. Mas também é o cinema que tem a capacidade de nos unificar e nos identificar enquanto nação, enquanto povo que comunga de uma mesma língua e de uma mesma cultura. O grande poeta, dramaturgo e teórico russo Maiakovski já dizia, lá no início do século XX, que o cinema é “concepção de mundo”, “veículo em movimento” e “difusor de ideias”. Que perigo, não é verdade? Uma arte com tanto potencial assim é de amedrontar qualquer tipo de governo que, por meio da imbecilidade, quer impor apenas um horizonte aos que buscam enxergar além.

O cinema também é uma arte que desperta o temor daqueles que menosprezam o diferente, que são infelizes e incapazes de amar o que desconhecem. Porque, de modo geral, o cinema nos incentiva à empatia, a ver o mundo pelos olhos dos outros. É uma tentativa também de nos fazer vestir a pele do outro, de sentir como o outro, de chorar e doer como o outro. Uma arte tão revolucionária no que diz respeito a nos ajudar a colocar para fora sentimentos e vozes que não conhecíamos em nosso interior. O cinema nos conscientiza! Que perigo, não é verdade? Pois é exatamente isso o que querem que não façamos e que não sejamos!!!

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É espantoso saber que há um movimento que, de forma tacanha, quer atacar o cinema nacional que, sim, é um dos melhores do mundo (pessoalmente eu acho que é o melhor mesmo), e o filme “Central do Brasil” é um dos exemplos (porque são diversos) que sustentam essa minha afirmação. E também é burrice embalada num puro e simples complexo de vira-latismo que, cruelmente, insiste em classificar o que é nosso como inferior ao que é dos outros.

Quando se diz que não se admite no cinema brasileiro filmes como “Bruna Surfistinha”, tachando-o, mentirosamente, com a pecha de pornográfico, é uma maneira de roubar de nós nossa inteligência, porque é possível ler o longa-metragem de diversas formas, inclusive a de ser um alerta sobre os riscos de se escolher os caminhos trilhados pela protagonista. Quando se diz que é preciso “filtro” para que filmes possam ser realizados com recursos públicos é também uma forma de roubar nossa criatividade e, pior, nossa liberdade.

A cineasta Laís Bodanzky, da qual sou admirador, e diretora dos filmes “Bicho de sete cabeças” e “Como nossos pais”, afirma que uma das características do audiovisual é a inovação, isso aqui no Brasil, e, também, no mundo, porque o público precisa do novo. E, para ter inovação, é preciso ter liberdade. Para Laís, qualquer coisa que esteja na contramão disso é uma forma de envelhecimento. Assim, digo que liberdade é preciso para que não padeçamos da falta do novo, mas do novo de verdade, porque de velho travestido de novo já estamos saturados.

Para terminar, recorro a Raquel Pacheco, a própria ex-Bruna Surfistinha, que saiu em defesa do filme que conta a sua história. Assim como ela, penso que os nossos políticos, no lugar de fazer juízo de valor sobre a vida dos outros, deveriam olhar para a moral dos próprios umbigos e fazer mais para, realmente, termos um país melhor.

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Marcos Araújo

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