Nós e o complexo de vira-lata

Por Marcos Araújo

22/05/2022 às 08h10 - Atualizada 21/05/2022 às 14h54

Nós, brasileiros, como já é sabido, sofremos da síndrome do complexo de vira-lata. Tal enfermidade pode ser entendida como um sentimento que nos coloca, voluntariamente, como inferiores diante do resto do mundo. Essa expressão teria surgido em razão do trauma sofrido pelo Brasil, quando, em 1950, nossa Seleção Brasileira foi derrotada pelos uruguaios na final da Copa do Mundo, em pleno solo tupiniquim, na meca do futebol nacional, o nosso pomposo estádio do Maracanã. O estrondo dessa decepção, na época, só teria sido recuperado oito anos depois, quando ganhamos o mundial pela primeira vez. 

Deixando de lado o ponto de vista futebolístico, o vira-latismo, na verdade, nunca deixou de estar entre nós, como disse no início do texto. Pois bem, em pleno 2022, temos que nos deparar com um projeto, de iniciativa de nossos deputados, que quer liberar o ensino de nossas crianças e adolescentes em casa, o chamado homeschooling. A iniciativa é polêmica, eu sei, mas merece muita reflexão. Diante de tudo que sabemos sobre como anda a educação em nosso país, vale considerar se seria a hora oportuna de se levar à frente uma proposta como essa, uma vez que ainda temos muitas mazelas a serem superadas, principalmente, no campo da educação.

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Tal projeto que merece ser mais debatido, à primeira vista, parece que é uma mania, como tantas outras, de copiar o que vem de fora, sem o mínimo de atenção para a nossa realidade social e cultural. É fácil entender que, no contexto da pandemia, a ideia de ensino em casa teve até certo mérito, já que foi uma opção melhor do que nada. Mesmo assim, ainda vamos ter que colher os frutos do que foi todo esse processo. E, já adiantando, os primeiros diagnósticos apontam resultados desanimadores. 

Durante a pandemia, muito se discutiu a respeito do preparo dos professores e das escolas para o ensino remoto. Agora, cabe também a pergunta: temos pais preparados para enfrentar a grandiosidade desse compromisso? A proposta prevê que um dos responsáveis pelo estudante tenha ensino superior, que sejam realizados relatórios das atividades, que haja acompanhamento de um docente tutor e outros requisitos. Mas será que educação é só isso? Será que a educação é algo assim tão limitado? 

Enquanto estudante que fui e ainda sou e, diante da minha formação de professor, digo que a educação vai além. Não dá mais para encarar o ensino apenas como transmissão de conhecimento. É na complexidade e diversidade da sala de aula e do ambiente escolar que somos capazes de entender sobre respeito, tolerância, disponibilidade à mudança, e, sobretudo, humildade. Educação tem a ver com isso. É impossível falar em desescolarização quando nem escolarização de qualidade ainda temos! A escola que existe hoje está bem longe daquela que sonhamos. Entretanto, antes de avançarmos para modelos copiados de outros países, é preciso dar uma chance de reinvenção para nossa educação.

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Marcos Araújo

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