Auxílio emergencial chega a 144 mil juiz-foranos e injeta quase meio bilhão na cidade

Fim do benefício causa preocupação quanto a impacto na população em vulnerabilidade social


Por Leticya Bernadete

10/01/2021 às 07h00

Para muitas famílias, o auxílio emergencial foi a principal forma de manutenção e sobrevivência no primeiro ano da pandemia (Foto: Fernando Priamo)

Mais de 144 mil juiz-foranos foram contemplados com o pagamento do auxílio emergencial em 2020, de acordo com informações do Ministério da Cidadania do Governo Federal. O benefício injetou, ao menos, R$ 477,2 milhões na economia de Juiz de Fora. Os dados, entretanto, consideram apenas as cinco parcelas de R$ 600 e R$ 1.200, pagas entre abril e agosto do ano passado. A medida chegou ao fim no dia 29 de dezembro de 2020 e, para 2021, as incertezas quanto a outros programas de auxílio à população em vulnerabilidade social trazem preocupações, considerando que a pandemia da Covid-19 ainda se mantém em alta em todo o país.

Das 144 mil pessoas contempladas pelo auxílio em Juiz de Fora, 16.800 eram beneficiárias do Bolsa Família, 20 mil estavam registradas no Cadastro Único (CadÚnico) e outras 107,3 mil solicitaram o benefício por meio do aplicativo da Caixa Econômica Federal. Ainda conforme os números do Ministério da Cidadania, R$ 73 milhões foram destinados a pessoas inscritas no Bolsa Família, R$ 65,4 milhões às que estavam no CadÚnico, e R$ 338,9 milhões aos demais. Os valores consideram apenas as cinco primeiras parcelas do benefício. O mesmo foi prorrogado em setembro e pago em quatro parcelas de R$ 300 e R$ 600. As informações desta fase do pagamento do auxílio devem ser divulgadas em breve.

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Como destacado pela professora da Faculdade de Serviço Social da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), Marina Monteiro, 48.076 famílias e 117.426 pessoas estão inscritas no CadÚnico na cidade, segundo dados disponibilizados no portal da Secretaria de Desenvolvimento Social (SDS) da Prefeitura de Juiz de Fora (PJF), referentes ao mês de maio de 2020. Considerando que o auxílio emergencial atendeu, ao menos, 36.800 pessoas cadastradas em programas sociais, a especialista aponta que cerca de 77% das famílias juiz-foranas que se utilizam da assistência teriam recebido o benefício do Governo Federal, visto que os inscritos no Bolsa Família estão, necessariamente, também no CadÚnico.

Principal fonte de renda

“Para muitas famílias, o auxílio emergencial foi a principal forma de manutenção e sobrevivência no primeiro ano da pandemia. Apesar do auxílio atender uma necessidade imediata e não contemplar as necessidades efetivas da população, se tornou o principal recurso de sobrevivência para parcela significativa da população”, explica Marina. “Ou seja, o auxílio emergencial é uma resposta pontual e absolutamente necessária a uma situação extrema e grave e, mesmo com seus limites, foi fundamental para a preservação da vida de muitas famílias que não teriam como sobreviver de outra forma.”

Repercussão em toda economia

Apesar do valor significativo injetado na economia, é preciso considerar o contexto em que foi inserido, bem como os usos que podem ter sido feitos do benefício, de acordo com o professor da Faculdade de Economia da UFJF, Fernando Perobelli. Ele aponta que o auxílio foi voltado para gastos básicos, como alimentação e moradia, pagamento de água e energia elétrica. Além disso, pode ter contribuído para comerciantes locais, por exemplo, trazendo um potencial de arrecadação de impostos.

“Essas pessoas vão estar consumindo, então o auxílio é um importante fomento ao gestor público estadual e municipal”, diz Perobelli. “Ele não tem uma movimentação ampla em termos de economia, mas ele tem um encadeamento muito grande porque esses pequenos comércios também empregam pessoas. Então, você cria o que chamamos de ‘círculo virtuoso’ na economia”, explica.

Desta forma, o fim do pagamento do auxílio emergencial pode ocasionar efeitos contrários a este círculo. Neste cenário, as pessoas terão de redimensionar sua estrutura de consumo, segundo o economista. “Sabemos que algumas famílias estavam dependendo única e exclusivamente desse auxílio emergencial. Então você vai ter um impacto negativo no que se refere a arrecadação de impostos, e você pode ter necessidade de uma repactuação de aluguéis ou de pagamento das taxas públicas, por exemplo, porque uma grande parcela desta população vai ficar sem renda nenhuma.”

Além disso, as incertezas quanto à pandemia podem ter reflexo direto na busca e oferta de empregos. Como exemplo, Perobelli cita a questão de famílias com crianças pequenas, em um cenário onde as creches estão fechadas. “Você tira o auxílio emergencial e as pessoas não podem buscar emprego, muitas vezes, porque não tem com quem deixar os seus filhos”, conta.

Preocupação com o aumento da pobreza

Os demais juiz-foranos que receberam o auxílio emergencial a partir de solicitação pela Caixa Econômica Federal – 107,3 mil – englobam aqueles que não estavam inseridos na política de assistência social do país. Como ressaltado pela professora da Faculdade de Serviço Social da UFJF, Marina Monteiro, são os que possuíam vínculos trabalhistas fragilizados ou inexistentes. “Ou seja, esse dado sinaliza que, com a não existência de novo programa e as dificuldades de expansão de postos de trabalho, essa parcela da população ficará desassistida.”

Conforme a professora Marina Monteiro, o contexto econômico e social brasileiro pode ser ainda mais impactado caso novos programas não sejam instituídos. “O cenário que temos nos afirma, mais uma vez, a necessidade de efetivação pelo Estado de uma política de proteção social estruturada, mas esta proposta não esteve na agenda do Governo federal durante 2020. Com altas taxas de desemprego e cortes profundos nas políticas sociais, a finalização do auxílio e o não anúncio de novas medidas apontam para um cenário de ampliação das históricas desigualdades sociais que, somadas aos déficits de proteção social, exporão milhões de pessoas à condição de pobreza”, alerta.

‘Economia não está em recuperação’

Enquanto parte dos beneficiados pelo auxílio emergencial podem perder sua principal fonte de renda durante o período da pandemia, o cenário econômico não se demonstra favorável mesmo para aqueles que contam com outras rendas. De acordo com o economista Fernando Perobelli, o próximo ano dependerá de como as pessoas se organizaram durante o período do auxílio emergencial. “O trabalhador autônomo conseguiu reverter o seu processo produtivo ou adaptá-lo a situação de pandemia? Se sim, o impacto vai ser um pouco menor”, exemplifica. “Mas como esse auxílio emergencial entra no conjunto da população que tem uma restrição orçamentária muito grande, com certeza vai haver um impacto significativo, mesmo porque a economia não está em recuperação.”

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Para o especialista, a manutenção do auxílio emergencial ou de outros programas sociais se torna necessária neste contexto, considerando que pesquisas já demonstraram a importância do benefício durante a pandemia. “Por exemplo, no início da pandemia, com auxílio emergencial, nós teríamos 23% da população no índice de pobreza. Sem o auxílio emergencial, esse valor passaria para 36%”, diz.

Parlamentares pressionam União para prorrogação do auxílio

Após o fim do socorro social, parlamentares têm pressionado o Governo federal a lançar uma nova rodada em 2021 ou turbinar o Bolsa Família. Na quarta-feira (6), o candidato à presidência da Câmara, Baleia Rossi (MDB), defendeu a volta do auxílio emergencial e ou um Bolsa Família maior. Baleia enfrenta o deputado Arthur Lira (PP), apoiado pelo Palácio do Planalto, na disputa. Nesta quinta, o candidato avulso à presidência da Câmara Fábio Ramalho (MDB) também defendeu, a retomada do pagamento do auxílio. O Congresso Nacional ainda não votou o Orçamento de 2021.

Conforme a Agência Estado, em conversa com simpatizantes, um dos apoiadores disse ao presidente Jair Bolsonaro que ele recebeu muito apoio no interior do Amazonas após o pagamento do auxílio. O presidente, no entanto, evitou se comprometer com um benefício em 2021 e ironizou a situação afirmando que, se pagar R$ 5 mil por mês para a população, ninguém mais vai trabalhar.

Em todo o Brasil, cerca de 68,2 milhões de pessoas foram elegíveis para o auxílio emergencial. Destas, 19,5 milhões estavam cadastradas no Bolsa Família, 10,5 milhões no CadÚnico, e 38,2 milhões solicitaram o benefício pela Caixa. Ao todo, R$ 230,98 bilhões foram pagos nas cinco primeiras parcelas do auxílio emergencial, divididas entre R$ 600 e R$ 1.200, de acordo com informações do Ministério da Cidadania.

Tópicos: coronavírus

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