Covid-19 em JF: número de novos casos em junho foi duas vezes maior que em maio

Além da queda da taxa de isolamento social e do aumento da média diária, mês passado teve registros de recordes diários


Por Carolina Leonel

16/07/2020 às 07h00- Atualizada 16/07/2020 às 07h34

O número de novos casos confirmados de Covid-19 em Juiz de Fora durante o mês de junho mais que dobrou em comparação a maio, conforme dados da Secretaria de Saúde da Prefeitura de Juiz de Fora (PJF), em análise feita pela Tribuna. Em maio, foram 436 diagnósticos positivos da doença, enquanto que, em junho, foram registrados 1.115 novos casos ao longo de todo o mês. O aumento de 155,7% também reflete na média diária de confirmações: em maio, eram 14,5 novos casos por dia, enquanto que, no mês passado, a média foi de 37 confirmações diárias.

Apesar disso, os índices de isolamento social no município têm apresentado progressiva queda, de acordo com dados divulgados pela PJF e disponibilizados pela empresa Inloco, que mensura o deslocamento na cidade por meio do GPS de celulares. Conforme a Prefeitura, a média de isolamento social ao longo das quatro semanas de maio foi de 51%. No mês seguinte, os dados apontaram média de 50,6%. Por outro lado, a Inloco registrou uma taxa média de isolamento de 42% em maio e de 40,3%.

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Até esta quarta-feira (15), data em que estava prevista a ocorrência do pico de contágio em Minas Gerais, 2.778 casos já foram confirmados na cidade. Cerca de quatro meses após a publicação de decreto municipal que determinava o isolamento social como medida de prevenção ao contágio pelo coronavírus em Juiz de Fora, a média de isolamento social nos últimos sete dias era de 50,03% por volta das 17h desta quarta, taxa ainda menor que a apontada em junho.

Para o infectologista Marcos Moura, os números são preocupantes, pois, apesar de diferentes fatores contribuírem para o aumento de casos, a queda no isolamento social está diretamente ligada à progressão da doença. “A não percepção da eficácia do isolamento pela população como um todo tem causado essa diminuição gradual do índice de isolamento. Apesar das normativas da Prefeitura para que se faça o isolamento, na prática vemos ruas e ônibus lotados, estabelecimentos que não deveriam estar abertos em funcionamento. Além disso, a gente tem um problema enorme, porque há a falsa sensação de que quem está ‘saudável’ não transmite (o coronavírus), a pessoa não percebe ninguém doente nesses locais e acaba indo. Porém, pode ter havido contato com pessoas contaminadas, e a doença acaba sendo levada para o ambiente intradomicilar e contaminando familiares, porque a essa transmissão é muito mais frequente e forte”, analisa o especialista.

Dados apontam para diminuição do isolamento, que caiu de 42% para 40,3%, segundo empresa que mensura deslocamento na cidade por meio de GPS de celulares; nesta quarta, movimento nas ruas era grande (Foto: Fernando Priamo)

‘Epidemia social’

Esse fenômeno tem causado o que o médico assinalou como “epidemia social”, contribuindo para que a doença se propague para regiões afastadas dos centros urbanos e atinja pessoas de baixas camadas sociais, principais usuárias do Sistema Único de Saúde (SUS). “A propagação do coronavírus em todas as cidades do Brasil começou em pessoas de classes sociais mais altas, cujo estilo de moradia é diferente, a convivência com pessoas dentro de uma mesma casa é menor, há mais cômodos. Porém, quando há a fragilidade das medidas preventivas e queda no isolamento, as pessoas começam a se encontrar fora do ambiente domiciliar. Com isso, a doença alcança outra classe social, a que depende exclusivamente do SUS”, pontuou. Ainda na avaliação do profissional, Juiz de Fora, assim como outras cidades do país, entrarão agora em um momento “crucial e de impacto na saúde pública”. “É proporcional: aumento no número de casos, maior mortalidade e lotação de leitos têm relação direta”, pontua.

Ainda de acordo com o infectologista, a população mais pobre também pode apresentar mais comorbidades, o que pode agravar a evolução da Covid-19. “Agora a doença chega nas periferias, e o número de casos em pessoas, inclusive com outras comorbidades (obesidade, hipertensão, por exemplo), aumenta, e nesse grupo a doença tende a evoluir bem rápido. Nesses locais, as medidas de mitigação não funcionam bem, pelas próprias características da região, das pessoas. Há a necessidade de a população trabalhar, pegar ônibus, as casas têm poucos cômodos (…). Com isso, saímos de uma fase de epidemia tradicional para uma epidemia social.”

‘É bem evidente que estamos caminhando para o pico”

Ainda conforme os dados dos boletins epidemiológicos da Prefeitura, na terceira semana de junho foram registrados três recordes em relação ao número de casos confirmados em 24 horas: no dia 16, foram 62 novos casos; no dia 18, mais 95, e no dia 19 de junho, mais 136 confirmações. O maior registro diário, no entanto, aconteceu entre 30 de junho e 1º de julho, quando 214 confirmações da doença foram notificadas de um dia para o outro.

Esse cenário, avalia Marcos Moura, tem apontado para o pico da doença no município. Ele pontua que, ao passo que houve ampliação da capacidade diagnóstica em Juiz de Fora, aumentou também o número de casos e a propagação da doença. Portanto, na análise do médico, ainda não se pode pensar que há controle da doença na cidade.

“Agora nós temos uma propagação geométrica da doença, e os número começam a chamar atenção. Isso é esperado em todo local que não fez lockdown, ou que não se fez uma barreira ou onde não se manteve o isolamento por um tempo maior (…). Começaremos a pensar em algum tipo de controle da pandemia quando observarmos uma redução progressiva a cada 14 dias. No entanto, no momento, o que temos visto é o contrário: a cada 14 dias, subimos um patamar na curva. Eu acho que é bem evidente que estamos caminhando para o pico, e depois que se tem uma ascensão vertical da curva, não se consegue, com medidas de mitigação, controlar a infecção.”

Por conta disso, o médico defende que o isolamento proposto pelo Município seja mantido, mas argumenta que, em caso de “perda do controle da doença”, outras medidas sejam analisadas e implementadas, já que as ações de mitigação, como uso de máscaras, por exemplo, não serão suficientes. “Mas para outras medidas teria que haver um estudo, ver o que poderia ser feito. Em outros países, quando começou a se perder o controle da doença, foi feito lockdown, pois não havia outra alternativa e tiveram que tomar medidas drásticas”, exemplifica.

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Taxa de letalidade voltou a subir

Apesar de novas confirmações de mortes pela doença terem diminuído cerca de 7% de maio para junho, com 26 e 24 óbitos registrados em cada mês, respectivamente, desde 6 de julho, a taxa de letalidade da Covid-19 voltou a subir na cidade, chegando a 2,9%, conforme a quinta edição do boletim informativo feito por pesquisadores de estatística e saúde coletiva da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF).

O documento ainda aponta que, em cerca de duas semanas, o número de óbitos aumentou 40%: no dia 18 de junho, o total de falecimentos acumulado era de 45; já no dia 4 de julho, eram 63 óbitos. O que também tem se observado é o aumento do número de mortes de pessoas abaixo dos 60 anos. Na última semana, o óbito de pessoa mais jovem vítima da Covid-19 foi registrada em Juiz de Fora: uma mulher de 29 anos, portadora de doença renal crônica, faleceu no último domingo (12).

“No Brasil há mais jovens que idosos, e a tendência é que tenha mais jovens doentes. E, diferente do que se pensa, muitas pessoas mais jovens têm comorbidades, são obesas, hipertensas, cardiopatas, fumantes (…). Então poderão ter um quadro agravado da doença. Além disso, o jovem é o primeiro a se contaminar, porque sai mais à rua. Isso é tradicional em curvas epidêmicas, pessoas mais jovens e homens se contaminam mais”, analisa o infectologista Marcos Moura.

Tópicos: coronavírus

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