Fora de nossas mãos!
Caros leitores e leitoras, retorno ao tema do cuidador de pessoas idosas. Vivo essa situação na minha família há mais de dez anos ininterruptos. Dia pós dia. Desde o acordar até o anoitecer. É muito difícil, é impossível, não se estressar com esse cuidado. E não é de jeito nenhum, por falta de amor ou por falta de compaixão. Não. É limite mesmo… limite físico, limite psicológico. Há um enorme desgaste, chega até ser desumano, essa relação de cuidar. Porque também, e é muito comum, e presente essa realidade. Qual? De que mesmo a pessoa idosa, o familiar idoso, tendo vários filhos e filhas, geralmente, é uma filha, ou na certa, será uma mulher quem vai cuidar dessa pessoa idosa dentro e fora das paredes do lar. Quem cuida é a mulher. Pelo menos, tem sido assim, por enquanto. E o mundo da velhice é o mundo feminino. Já escrevi isso aqui em colunas anteriores. E vai agora uma nova preocupação. Mulheres idosas cuidando de outras mulheres idosas. As mulheres, mesmo em ocupações muito maiores e complexas do que os homens, vivem mais. Característica básica no território do envelhecimento humano. Se me permitem, caros leitores e leitoras, escrevo que o mundo é das mulheres.
Se o cuidado às pessoas idosas em e de casa é sobrecarga emocional que cai sobre os ombros e preocupação de uma filha, de uma irmã ou de uma neta ou tia, esse cuidado precisa ser terceirizado. Palavra da moda. Precisa ser revisto. Será que os familiares conversam sobre esse assunto dentro de casa: o que nós vamos fazer com a nossa mãe ou com o nosso pai doentes? Vamos institucionalizá-los ou não? Em outras palavras, vamos buscar uma instituição de longa permanência para pessoas idosas na cidade e definir aquela que nós julgamos ser a melhor? A que nos atende em vários quesitos? Desde o preço à existência de um grupo de profissionais devidamente qualificados para o exercício do cotidiano profissional.
Aí que entram os conflitos, as angústias, as lágrimas quentes que escorrem pelo rosto em direção da alma de quem cuida: simultaneamente vem sentimentos repetidos de culpa e a sensação de que estamos abandonando nossa mãe ou nosso pai ao definirmos pela institucionalização. Ao mesmo tempo vivenciamos situações sentimentais contidas em expressões do seguinte quadro de desabafo mas verdadeiros: não aguento mais, tô super cansada, não dormi nada noite passada, dormi com a roupa que eu estava, dormi assim desse jeito. Será que institucionalizar o nosso familiar idoso significa não ter mais amor por ele, por quem nos deu a vida? Achamos que somente nós, familiares, é que sabemos cuidar e que somente nós, de casa, temos carinho, amor e afeto pelo nosso familiar. Esse pensamento é ilusão. Fantasia.
Os profissionais que atuam nas instituições de longa permanência estão suficientemente preparados para o cuidado. E são monitoramentos pelos gestores dessas instituições. O controle social, através de vários Conselhos de Direitos Sociais, como o das Pessoas Idosas; Conselho de Assistência Social; de Saúde; Comissão da Pessoa Idosa da Câmara Municipal e Promotoria Pública, está de olho, e não é de hoje, no trabalho desenvolvido com as pessoas idosas nesses ambientes de residências coletivas. Os profissionais que lá trabalham são capacitados, são orientados, e tem suas habilidades pessoais estimuladas para a prática do acolhimento e humanização no trato diário com as pessoas idosas. É um equívoco pensar que cuidar da mãe ou do pai, só os de casa têm competência e sabem fazer. Considerando também que são poucas, as pessoas de casa que verdadeiramente cuidam de seus familiares idosos. Cuidar mesmo: desde acordar no meio da noite, no melhor do seu sono e trocar a fralda de xixi e de cocô a dar medicação na hora certa. Dar alimentação sem acordar de perder a paciência. É muito difícil lidar com essa rotina, sem se esgotar, eu afirmo que é humanamente impossível. Na medida que a pessoa idosa involui por causa do avanço da doença, mais próximo está a possibilidade de institucionalizar a pessoa idosa. Sem achar que ela, a sua mãe ou o seu pai não terão amor e afeto fora de nossas mãos. Terão sim!