O que fica é o afeto!
Meu tempo de trabalho na PJF chega ao fim. Nos próximos três meses, estou habilitado à aposentadoria. Deixo a rotina do exercício profissional, mais de 30 anos dedicados à parcela da população idosa da cidade. E saio pela porta da frente. Graças a Deus.Trago no coração e na memória gratidão a muita gente que contribuiu para a construção dessa trajetória. Do começo à saída, procurei sempre ajuntar, articular profissionais e serviços. Certo de que integrados, trazemos melhores resultados para a população que servimos. Uma população numerosa, que mais cresce no país. Juiz de Fora conta hoje com aproximadamente cem mil pessoas na faixa etária de 60 anos e mais. Sabidamente, nossa cidade é uma cidade que tem muitas pessoas idosas no seu contexto sócio-demográfico.
Nesse caminho público como assistente social na PJF, experimentei outras facetas da vida: casei, constitui família, tive filho, refiz minha dinâmica afetiva. Continuei na luta profissional junto às pessoas idosas da cidade. No ano de 2000, o mundo não acabou. E a cidade recebeu o Centro de Convivência do Idoso. Momento histórico para o trabalho geriátrico e gerontológico. Não só para a cidade e para o nosso estado, mas para o Brasil. Tenho muito orgulho de ter feito parte dessa história, ao lado de tantos profissionais e agentes públicos e políticos.
Nesse momento de destaque para as conquistas realizadas, como se fosse uma retrospectiva da minha carreira pública, indico a criação da Comissão Permanente de Defesa dos Direitos da Pessoa Idosa, localizada na Câmara Municipal, no Poder Legislativo. Holofotes para a Câmara Sênior. Um expediente público para o exercício do protagonismo das pessoas idosas, constituída por idosos que vão indicar projetos, programas e ações para a coletividade, não só para os mais velhos, mas também para as outras idades. O que eu desejo é uma cidade para todas as idades!
O que eu levo e o que eu deixo desse período da minha vida? Não consigo separar em mim o lado profissional do lado pessoal. Ou dito de outra forma, contrariando os manuais corporativos. E ao amigo, que na pelada das quartas-feiras, já na resenha pós-futebol, vinha com essa: “Me desculpa aí, fulano, foi mal… Dentro de quadra sou um, fora dela, sou outro.” Não acredito nisso. Eu sou bem o mesmo dentro e fora do ambiente externo. Porque eu estou em mim. Eu levo as amizades bem escolhidas e colecionadas para a vida afora. Coloco na mochila da minha vida, as conquistas alcançadas e compartilhadas. Dou um laço bem apertado e guardo para dentro do meu coração e da minha memória os vários momentos de aprendizagem que tive. Como desfrutei de muitos mestres na caminhada, que foram as pessoas idosas, que me ensinaram a ter a importância da fé e da esperança no dia de amanhã. E de que Deus ama seus filhos e filhas.
Entreguei nesse tempo do meu trabalho social público o acordo com a minha consciência, ou o comportamento expresso na música cantada
pelo grupo Pato Fu: “Tudo é uma questão de manter a mente quieta. A espinha ereta e o coração tranquilo.” Cumpri bem o contrato quando assinei minha carteira de trabalho. O dever foi cumprido. Usufruí de poucos dias de atestado médico. Licença do trabalho, somente quando do processo de morte do meu pai no ano de 2014.
A expressão do afeto é o que importa. Por muito tempo me acompanhou, em treinamentos e capacitações de trabalho, o que virou um mantra
depois – a frase atribuída à autoria do poeta Fernando Pessoa – “Tudo vale a pena, quando a alma não é pequena.” E assim caminhamos. E assim
saio desse ambiente com a alma lavada. Certo de que dilatei o espírito durante essa rotina. Pouco eu sei. Muito eu levo. Fica a lição de que não tenho o domínio de tudo na vida. E muito menos sobre a vida. Mas agarro à certeza e ao firme desejo de que novos cenários de existência são possíveis, principalmente, em tempo de pandemia. Toda ocupação humana, por mais desprezível que possa parecer ser, é uma oportunidade para o conhecimento de si. Não teremos um novo amanhã. Poderemos ter e desejar o desabrochar de uma nova potência de vida para o encontro de nós mesmos. E quem sabe ela nos espera na próxima esquina!