Na bagagem, muita aprendizagem!
Como é bom aprender! Que sensação gostosa eu tive ao participar, no último fim de semana, do X Congresso Mineiro de Geriatria e Gerontologia, na belíssima capital mineira, Belo Horizonte. Lembro que o assunto foi pauta desta coluna, na última semana que passou. Trago muitas lições. Não só no plano objetivo, científico, de conhecer e atualizar conhecimentos sobre a população idosa, mas, também no campo amistoso e subjetivo de conhecer outras pessoas e outras realidades. Tudo muito bom. Pelo lado do aprimoramento profissional, participar desse congresso me deu a rica oportunidade de atualização, mas também, de acessar outros e novos conteúdos na crescente tarefa profissional de atuar com pessoas idosas.
Como tinha gente no congresso! A maioria do público de mulheres. E não é mera coincidência, não. O mundo da velhice é o mundo feminino. As mulheres vivem mais do que os homens, E são as mulheres as principais cuidadoras de pessoas idosas. Pelo aspecto pessoal tive muita satisfação – e até coragem, porque não? – em tietar alguns ícones da gerontologia mineira e nacional, como a Dra. Karla Cristina Giacomin. É claro que tirei foto com ela, fiz uma selfie. Ela cada vez mais competente e envolvida com um envelhecimento ativo e cidadão para todas as pessoas.
Mas o ponto alto mesmo para mim foi ter entrevistado uma das maiores autoridades científicas da gerontologia brasileira e referência internacional. Eu me refiro ao simpático, bem-humorado, carioca morador de Copacabana, Dr. Alexandre Kalache. Apresento, nas próximas linhas, alguns trechos dessa conversa com ele. Inicialmente, ao ser indagado, se o Brasil está preparado para o seu envelhecimento, ele afirma, categoricamente, que não. Segundo ele, “o Brasil está envelhecendo em pobreza. A maioria das pessoas idosas hoje no Brasil depende do SUS para serviços de saúde. Tem muito pouco serviço social .Existe um abandono crescente de pessoas idosas, porque as famílias não estão dando conta. As pessoas estão vivendo mais. Hoje nós temos 30 milhões de pessoas com mais de 60 anos, em 2050, que é amanhã, nós vamos ter 68 milhões .Um tremendo desafio! Estamos preparados? Prepare-se já, você que é mais jovem, que tem 50, que tem 75 anos, comece já. Quanto mais cedo, melhor. Nunca é tarde demais”.
Ainda na entrevista, quando eu perguntei a ele, sobre as respostas dos municípios brasileiros em relação às necessidades das pessoas idosas, o autor assim se expressa: “o problema, meu caro, é que os países que se prepararam para o envelhecimento foram países que tiveram mais tempo e recursos, para, paulatinamente, se prepararem. Nós ainda temos problemas seríssimos de ensino público. Os municípios estão com o caixa esvaziado. Nós ainda temos problemas maciços de descontrole ambiental. Nós estamos com o SUS, lamentavelmente em derrocada. É uma sucata o que está acontecendo. Muitas vezes, a enfermeira não tem sabão para limpar a mão de um paciente para outro. Nós temos ainda problemas e desafios do ensino público, do meio ambiente, do preparo do entorno urbano, de diminuir a violência, de repente, em cima disso, vem muito rapidamente o desafio do envelhecimento. Os municípios em geral, não estão preparados. Eu rezo para que Juiz de Fora, uma cidade que eu tenho ligações, até de família, possa vir a ser uma cidade mais amiga do idoso. Existe uma cartilha para isso. Quando eu fui diretor da Organização Mundial da Saúde, lá em Genebra, nós lançamos um movimento global que se chama Cidade Amiga do Idoso, presente em mais de mil cidades, mundo afora. Não está sendo feito no Brasil”.
Finalizando essa rica e impagável entrevista, quando perguntado sobre o protagonismo das pessoas idosas, ele foi enfático: “Em primeiro lugar, saia do aposento. Essa palavra infeliz, com que traduziu uma ideia de você ter uma renda regular no fim de sua vida, se traduziu para português num aposento, como naquelas casas antigas, lá do interior de Minas, e puseram o velho no aposento. Saia do aposento, meu caro! Vá para o centro da casa. Vá para a sala de visita. Vá prá rua. Procure se organizar. Procure estar ativo, contribuindo. Há muita coisa prá fazer. Faça um trabalho que seja voluntariado. Com tanta necessidade que a gente tem. Seja um protagonista. O que você faz individualmente, procure fazer para a sociedade como um todo. Nós não temos um sindicato dos idosos. Mas nós temos conselhos dos idosos. Por enquanto, pelo mesmo, nós temos conselhos ativos dentro da maioria dos municípios e dos Estados. O nacional já não conta, porque sob intervenção. Existe agora apenas um ministério que tudo manda. Eles próprios desenvolvem as políticas, eles próprios monitoram. É isso que a gente tem que fazer. Nós idosos vamos monitorar e não dar a outros o privilégio.” No encerramento da entrevista, em suas considerações finais, Dr. Alexandre Kalache, assim se posicionou: “Pensem bem. Envelhecer é bom, morrer cedo é que não presta. Vamos aproveitar esses anos extras de vida, mas vamos exigir que eles sejam, realmente, de qualidade”.
Caros leitores e leitoras, foi uma bela conversa com uma pessoa, um profissional, altamente capacitado e que, no cafezinho, no intervalo de uma mesa de trabalho e outra, me concedeu essa histórica entrevista. Foi mesmo o ponto alto de minha participação no congresso. Primeiro, tomei consciência de que, eu não sabia que tinha tanta coragem, ou “cara de pau”, para me arriscar na busca desse meu desejo. Entrevistar o Dr. Kalache. Segundo, a partir daí, posso acreditar que eu posso. Nós podemos. Como bem nos ensinou o negro ex-presidente do EUA, Barack Obama. Fiquei feliz também em participar e ver a atuação sempre brilhante do professor e médico geriatra Dr. Giancarlo Lucchetti, da nossa UFJF, na roda de conversa intitulada “O idoso e o sentimento de solidão em um mundo veloz e em transformação”. Registro também que a participação coletiva em eventos dessa natureza, através de conferências, mesas redondas, rodas de conversas fortalecem a gente e também o trabalho que a gente desenvolve na nossa cidade. Certamente, tivemos, em Belo Horizonte, a representação de vários municípios mineiros, o que evidencia que o trabalho social e público com as pessoas idosas está ganhando cada vez mais a entrada de várias instituições, empresas e profissionais na busca de respostas para um envelhecimento ativo, saudável e cidadão. Até o próximo congresso!