Delícias da maturidade!

Por Jose Anisio Pitico

05/06/2022 às 07h00 - Atualizada 03/06/2022 às 18h53

Que a velhice não é um tema ou um assunto de fácil aceitação por um grande número de pessoas, e que recebe resistência nas sociedades ao longo da nossa história, não é novidade. Estudos especializados demonstram como é variável e como muda de uma região para outra o tratamento dispensado às pessoas mais velhas das diversas organizações humanas. Há um estudo clássico na literatura gerontológica que evidencia com muita clareza e objetividade essa visão antropológica das culturas africanas e asiáticas, no olhar atento e profundo da pesquisadora e grande escritora Simone Beauvoir no seu tratado “A velhice”. Referência para quem deseja entrar no mundo do envelhecimento humano. E principalmente para quem busca refletir e se conscientizar sobre o universo feminino.

Entre nós, no nosso país, e posso afirmar que em várias cidades e na nossa também, esse assunto é muito pouco visto, debatido e comentado publicamente. Não dá mídia e nem dá voto. A velhice, nosso caminho natural na vida, se não subirmos para “o andar de cima” antes da hora, é desprezada e hostilizada no nosso cotidiano de pessoas comuns. Não entra ou caminha muito devagarinho na agenda da organização das políticas públicas. Não temos uma cultura pública favorável ao nosso envelhecimento. Só vemos perdas, doenças, gritos e ausências nesse período existencial que, politicamente, ligando para ele ou não, vamos viver mais. A velhice é vista no debate público, quando (esse) acontece, com muita rejeição pessoal e social. Para alguns setores da sociedade, principalmente para os representantes do mercado consumidor, somente interessado em vender, trata-se da “Melhor Idade”. Embalados pela propaganda consumista somos levados a crer que é nessa fase da vida que podemos realizar todos os nossos sonhos. Tudo são flores. É a velhice do café da manhã de uma família feliz exibido em um comercial de TV de uma marca de margarina. Não é bem assim! Envelhecer não é fácil. Ainda mais quando nós temos velhices e velhices. E um histórico de negação. Temos então, uma velhice real e uma velhice idealizada – romanceada. O que falta em nós é educação para o nosso envelhecimento. Nem melhor idade e nem o pior dos mundos quando estamos velhos. Temos vida. Somos vida. Como em todos as estações temos perdas e ganhos; dor e delícia.

PUBLICIDADE

Precisamos falar mais sobre a nossa maturidade para que seja natural a apresentação de fantasmas, medos, conquistas e celebrações de nossas vitorias durante a trajetória. Delícias da maturidade: me apresente algumas delas? Falo de cadeira. Ter a oportunidade de exercitar o autoconhecimento. É fácil e está cada vez mais mecanizado, olhar o que acontece fora, no espetáculo do que fazemos com o que acontece na vida dos outros. Penso que precisamos, e eu tenho feito isso, estar atento para enxergar o que acontece de dentro de nós. Construir um inventário, ou deixar de legado, as percepções, lugares, cafés, mimos, abraços, livros, presentes, gostos, beijos, sensações, cheiros, músicas, pudim de leite condensado, sentimentos, goiabada com queijo, peixes, bolas de futebol, escolhas que nos motivam a existir, a levantar da cama e ter um objetivo, um planejamento de coisas a serem feitas nos dias, que nessa altura do campeonato, são verdadeiramente nossos, porque sentimos o sabor deles. São umas delícias. Outra delícia da maturidade, entre muitas não apresentadas aqui, é ter um propósito de vida ou mais de um. Faça uma pequena lista das coisas que você deseja e realize ações que te ajudem ser o que você sempre quis ser. Vai dar certo!

Jose Anisio Pitico

Jose Anisio Pitico

Assistente social e gerontólogo. De Porciúncula (RJ) para o mundo. Gosta de ler, escrever e conversar com as pessoas. Tem no trabalho social com as pessoas idosas o seu lugar. Também é colaborador da Rádio CBN Juiz de Fora com a coluna Melhor Idade. Contato: (32) 98828-6941

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade pelo seu conteúdo é exclusiva dos autores das mensagens. A Tribuna reserva-se o direito de excluir postagens que contenham insultos e ameaças a seus jornalistas, bem como xingamentos, injúrias e agressões a terceiros. Mensagens de conteúdo homofóbico, racista, xenofóbico e que propaguem discursos de ódio e/ou informações falsas também não serão toleradas. A infração reiterada da política de comunicação da Tribuna levará à exclusão permanente do responsável pelos comentários.



Leia também