Abraçar o absurdo

Por Marcos Araújo

04/09/2022 às 08h10 - Atualizada 02/09/2022 às 17h54

“Esta vida está um absurdo”, me disse um amigo que há tempos não encontrava. Logo perguntei: “O que aconteceu?” Ele respondeu que vivenciava um vazio, mas que era difícil explicar tal sentimento. Segundo ele, nossa realidade era o motivo para sua profunda tristeza e que, por mais que tentasse, não encontrava maneira de desfazer-se dela. Percebi, naquele momento, que ele ainda não estava pronto para externar suas aflições. Respeitei, pois compreendi que aquele lamento havia sido um instante de abstração da sua parte. Mudamos de conversa, e a vida seguiu.

Todavia, esse tipo de encontro fortuito sempre nos deixa alguma coisa. Sabe aquela sensação de que cada um que passa pela nossa vida sempre deixa um pouco de si e leva um pouco de nós? Acho que foi bem isso que aconteceu. Fiquei a pensar sobre o absurdo da vida e o quanto ela pode ser absurda de várias maneiras. O conceito de absurdo, que o dicionário traz como aquilo que é destituído de sentido, é tão diverso e depende da visão de mundo de cada um.

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No final das contas, essa minha discussão mental a respeito do absurdo me levou a lembrar de Albert Camus, que certa vez disse: “A vida será mais bem vivida se não tiver sentido”. Essa ideia do filósofo francês aparece no ensaio “O mito de Sísifo”. Vale lembrar que Sísifo, na mitologia, foi um rei da Grécia que, ao perder o apoio dos deuses, foi condenado ao inferno, onde tinha como tarefa rolar uma pedra gigante morro acima, para depois soltá-la e subir novamente, repetindo esse trabalho por toda a eternidade.

Dessa forma, Sísifo, sob o olhar de Camus, pode significar algo de absurdo, reconhecendo que muito do que fazemos nas nossas vidas parece ser sem sentido. Tal proposição, à primeira vista, soa como pessimista, mas, para o filósofo, essa é uma ideia que nos habilitaria a viver de forma tão plena o quanto fosse possível, já que o sentido, que tanto almejamos, não existe além da nossa cabeça.

Meu amigo, na nossa rápida conversa, não me explicou os porquês que o levaram a achar a vida um absurdo. Mas gostaria de que ele soubesse dessa filosofia e que pudesse encontrar alguma utilidade nela. Para ele, naquele momento pelo qual estava passando, talvez fosse válido pensar que a vida não tem sentido e que é absurda mesmo.

Gostaria de fazê-lo pensar que, ao abraçar o absurdo, na concepção de Camus, o indivíduo fica liberto dessa busca por sentido, a fim de viver de forma livre. Adverti-lo que, apesar da falta de significado para a vida, não é errado ter esperança e, quando tudo parecer desesperador, é bom lembrar que a inexistência de sentido é uma possibilidade de oportunidades, de abandonar desilusões e de até enxergar um lado positivo no caos.

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Marcos Araújo

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