Será que tem bicho na privada? Knorr responde em novo livro infantil
Nossa, o João acreditou tanto que “Tem um bicho na privada” (Paratexto, 28 páginas) que ficou com muito medo de chegar perto dela. Na cabeça dele, lá dentro, vivem aranha e peixe piranha, prontos a atacá-lo a qualquer momento. Mas a gente sabe que isso não é verdade. E a gente sabe também que, quando a dificuldade de ir ao banheiro torna-se um transtorno, acabamos com sérios problemas, como aconteceu com o João. Coitado! Ele foi ficando com fortes dores abdominais, perdendo até a vontade de brincar com o amigo.
Essa é a história do novo livro infantil do escritor juiz-forano, jornalista e músico Knorr, autor de 16 títulos já publicados, sendo quatro deles voltados para os pequenos. Lançada virtualmente durante a quarentena, a obra tem ilustração de Vinicius Chagas e pode ser adquirida no site da editora Paratexto e também diretamente com o autor. Os exemplares físicos são enviados aos leitores pelos Correios, e, em breve, o livro estará disponível em e-book. Aliás, já que tocamos nesse assunto, é na companhia de um bom livro, principalmente o digital, que muita gente tem driblado os efeitos da pandemia. E é claro que, com a criançada, a literatura também tem sido uma forte aliada em tempos tão difíceis. Não é mesmo, Knorr?
“No começo dessa coisa toda, vislumbrei uma forma de Renascimento na humanidade. Depois, vi que outros, muito mais capacitados e conhecedores da área, também estavam com a mesma visão que eu. Tenho lido e ouvido relatos de amigos e amigos de amigos dizendo que nunca leram tanto, que estão buscando até mesmo essas novas formas de ler (os digitais) porque se esgotaram as possibilidades físicas que eles tinham. E com as crianças não é diferente. Lançar esse livro em plena pandemia foi outro grande desafio para mim. A Editora Paratexto e eu havíamos entrado em acordo que o lançaríamos no primeiro semestre. Aí, veio a quarentena, e, numa atitude ousada, resolvemos fazer isso tudo durante essa loucura. Tenho recebido relatos das crianças que me emocionam profundamente. Elas tratam o livro como um troféu conseguido em meio a esse caos. Com certeza, estamos contribuindo para amenizar em parte os efeitos desse enclausuramento, as crianças agradecem do jeito delas. Estão ávidas por voltar à normalidade de ir com os pais a uma livraria e ficar petiscando livros para saborear em casa, na sua cama, antes de dormir. Até mesmo numa banca de jornais, comprando gibis. Ao mesmo tempo, estamos mostrando para elas que a vida continua, que as histórias acontecem, outras vão chegar, e que o medo do João estava só na cabeça dele.”
E já que o assunto de hoje é um livro infantil, convidei quatro figurinhas para baterem esse papo com o Knorr. Minha filhota Manuela Loures de Barros, 9 anos, e as amiguinhas Giovanna Moreira Savino, 9, Ana Beatriz Mota Valério, 8, e Giovanna Mota Valério, 5. Vocês vão ver que, espertas como são, tiraram de letra a tarefa de serem repórteres por um dia. Ah, e elas aprenderam a lição direitinho com o João. Privada não é lugar de aranha nem de peixe piranha!
Manuela Loures de Barros – Por que uma história sobre uma criança que tem medo de privada?
Knorr – Oi, Manuela. Essa história é meio verdadeira e, realmente, aconteceu com o meu filho, que, por acaso, se chama João. Mas uma ou outra característica do João eu inventei para compor o personagem. Um adulto, que não convém falar o nome, disse para ele que, na privada, tinha aranhas e peixe piranha, e que podia morder a bunda dele. Acho que era porque ele ia ao banheiro e ficava horas lá, e, além do mais, não queria fazer cocô no troninho dele e insistia em sentar-se no vaso sanitário. Como ainda era bem pequeno, miúdo, ficava escorregando a ponto de quase cair dentro da privada. E os adultos tinham que ficar acompanhando o João o tempo todo. Como ele demorava, inventaram essa história, para que ele se sentasse somente no peniquinho. Só que ele acreditou tanto que isso era verdade que não queria mais sentar-se em lugar nenhum e foi prendendo o cocô durante dias e dias. E ele foi ficando triste e emburrado com isso. Então, achei que daria uma boa história para ser contada às outras crianças, porque eu não queria ver nenhuma delas passando por isso. Não gosto de ver crianças (e nem adultos) tristes.
Manuela – Quantos anos seu filho tem hoje? Ele gostou de ver a história dele no livro?
– Ele fez 13 anos agora em julho. Disse que não se lembra muito bem dos detalhes não. Ele só lembra que, quando dava vontade de ir ao banheiro, ficava dançando para a vontade passar. Sim, ele gostou muito de saber que algo que aconteceu com ele quando bem pequeno foi transformado numa história para outras crianças lerem. E ele sempre fala que o livro pode ajudar outras crianças a não passarem pelo mesmo problema.
Ana Beatriz Mota Valério – Quanto tempo você demorou para fazer esse livro? Foi difícil escrever essa história? É difícil ser escritor?
– Desde o momento em que aconteceu o fato com o meu filho, até finalizar o texto, passaram-se algumas semanas. Principalmente porque o texto é rimado e metrificado, ou seja, as frases têm uma mesma quantidade de sílabas, um ritmo. Essa coisa toda tornou a história mais difícil de escrever. Essa vontade que tinha de rimar e ritmar dificultou muito, mas aos poucos consegui. E te digo mais, Ana Beatriz. Ainda neste ano, às vésperas de mandar o livro para a gráfica, ainda mexi em algumas palavras, troquei algumas frases, tudo isso para que a leitura não ficasse tão difícil assim para as crianças. Ser escritor não é fácil não. Além de livros para crianças, eu escrevo poesias e já tenho 16 livros publicados, boa parte deles por conta própria. É como se eu tivesse 16 filhos (mais os três de carne e osso que tenho) e tivesse que cuidar deles ao mesmo tempo. E, no nosso país o escritor, o artista, não tem o merecido reconhecimento. Mas acho que isso está mudando, e graças às crianças da sua geração, que estão crescendo com outros olhos para a leitura e as artes.
Ana Beatriz – E como o João conseguia dormir com vontade de ir ao banheiro? Isso não faz mal para as crianças?
– Pois é, Ana Beatriz, eu também ficava me perguntando isso. Mas acho que ele tinha tanto medo que nem tinha mais vontade, a cabecinha dele enganava o corpo, o intestino, e ele nem sentia mais essa vontade. Até que, num determinado momento, o corpo não aguentou, e ele começou a ter dores na barriguinha. Essa coisa de ficar prendendo, seja por medo ou por outro motivo, não pode acontecer. Conheço casos de outras crianças que prendem o xixi e o cocô até para não parar a brincadeira e perder tempo. Mas isso não é legal não. Para escrever esse livro, conversei bastante com o Dr. Dorian, que é pediatra e meu amigo desde os tempos em que tínhamos a idade do João. E ele me falou do quanto isso é ruim para a saúde das crianças. E dos adultos também. Foi dessas conversas que resolvi que iria publicar essa história para que pudesse conscientizar outras crianças, para que elas não tivessem a mesma atitude do João.
Giovanna Moreira Savino – Você tinha medos parecidos com o do João quando era criança? Medo de coisas que não existem?
– Não me lembro muito bem, Giovanna, mas acho que, como qualquer criança, eu tinha sim. E alguns ainda tenho até hoje, mas de coisas que existem, como aranhas. Mas só das maiores, as pequenas que comem moscas eu convivo bem com elas. É natural que nós tenhamos medo das coisas desconhecidas, daquelas que não existem de verdade, e isso não é motivo de vergonha. A gente deve encarar esses medos e tentar superar, mesmo que, para isso, a gente precise da ajuda de outra pessoa. No caso das crianças, de um adulto. E se o medo for muito grande, melhor cuidar disso tudo com um psicólogo, que é quem sabe melhor nos ajudar.
Giovanna Savino – E por que você escolheu estes dois bichos: aranha e peixe piranha?
– Na verdade, não fui eu quem escolhi. Como disse antes, a pessoa que, sem querer, colocou esse medo no João, é quem inventou isso, e ele acreditou. Talvez por ele saber que eu, pai dele, tinha esse medo parcial de aranhas, ele acreditou. Mas, no caso da piranha, eu não sei. Se bem que é um bicho que causa pavor na gente, né? Não quero nem pensar. Ainda bem que elas não existem nas nossas privadas (rsrsrs).
Giovanna Mota Valério – O moço que fez os desenhos é seu amigo? Você gostou dos desenhos dele?
– O moço que fez os desenhos, o Vinicius Chagas, é meu amigo há muitos e muitos anos, Giovanna. E ele é fera, um dos melhores profissionais que conheço, muito bom mesmo. Mas, apesar de toda essa amizade, nós nunca tínhamos feito um trabalho juntos. Entre idas e vindas, esse livro demorou 5 ou 6 anos para “nascer”. Muito mais que os nove meses que ficamos na barriga das nossas mães. Mas ficou do jeito que eu queria, os desenhos dele são muito bons, né? Esse foi só o primeiro que fizemos juntos. Pretendo fazer outros livros com ilustrações dele.
Giovanna Mota Valério – E por que o João da história comprou tanto papel higiênico?
– Também fiquei assustado com isso, Giovanna. Mas acho que ele comprou tanto assim porque, naquele momento, ele sabia que não ia mais ficar sem fazer cocô, e ele queria garantir que, quando ele estivesse lá concentrado, sentadinho na privada, nunca iria faltar papel. Mas essa ideia de comprar tanto papel o João contou só para o Vinicius, que não quis me falar. Só desenhou.
Sala de Leitura – Toda sexta-feira, às 11h35, na Rádio CBN Juiz de Fora (FM 91,3)
“Tem um bicho na privada”
Autor: Knorr
Ilustrador: Vinicius Chagas
Editora: Paratexto (28 páginas)
Onde adquirir o livro?
- No site da editora Paratexto
- Com o próprio autor (knorrjf@gmail.com)