Por que não investimos na atenção primária?


Por Robson Bonoto e Daniel Netto, educadores físicos

23/08/2020 às 06h54- Atualizada 25/08/2020 às 16h45

A vivência da atual pandemia deixou nítida a centralidade da narrativa na atenção terciária, com compras monstruosas de equipamentos e toda coordenação do cuidado nos centros de terapia intensiva. Não é novidade que políticos e empresas utilizam a visibilidade da abertura de vagas e dos atendimentos hospitalares como garantia da assistência em saúde e do suporte à vida.

E também não é novidade que a atenção primária, com as medidas preventivas, é uma esfera negligenciada historicamente. Ainda em relação à atual pandemia, quantas vezes debruçamos nossas reflexões sobre os agentes comunitários em saúde, técnicos de enfermagem e enfermeiros que realizam a triagem dos pacientes?

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E, para o estranhamento de vocês, gostaria de lembrar do profissional de Educação Física. O bacharel em Educação Física também constitui um recorte de trabalho do SUS e poderia ter sido peça-chave do processo de saúde-doença diante da Covid-19.

Isso porque já é consenso na literatura científica que a prática regular de exercícios físicos supervisionados é capaz de trazer benefícios no âmbito físico, mental e imunológico. E é justamente esse o objetivo do educador físico na atenção primária: promover a saúde da população através de práticas que estimulem um comportamento fisicamente ativo, proporcionando melhor qualidade de vida, o que seria essencial para o momento em que vivemos, pois estávamos presenciando uma verdadeira epidemia de doenças crônicas não transmissíveis e transtornos mentais no momento pré-pandemia. Entretanto esse quadro vai ser maximizado no momento pós-pandemia, fato este que poderia ser minimizado caso os brasileiros tivessem maior acesso a uma atenção primária mais robusta.

Mas se já é consenso na ciência que uma vida ativa é benéfica para a saúde integral, e grande parte da população sabe disso, por que ainda não temos uma política pública eficiente neste sentido? O que mudaria se a população começasse a ter acesso a profissionais que nos proporcionassem exercícios físicos de forma regular? E, se esse fato acontecesse, a grande expansão das farmácias, por exemplo, seria prejudicada?

Dessa maneira, a falta de dedicação com a atenção primária e a consequente escassez de profissionais para atuarem nesta área fazem com que as pessoas não reflitam e não conheçam a maneira que seus corpos vivenciam o mundo. Mas refletir é algo que essa narrativa centralizada na atenção terciária não permite, afinal, um corpo mergulhado em máquinas é melhor do que um corpo pensante e ativo.

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