Gripe espanhola, Covid-19 e distanciamento social
Há poucos dias, recebi a fotografia de um jogo de futebol no Rio de Janeiro, no ano de 1920, precisamente nas Laranjeiras. Um grande número de torcedores se aglomerava usando máscaras para assistir a uma partida. Era o período final de quatro anos da temida gripe espanhola.
A base da foto trazia como ironia uma crítica ao nosso modelo de distanciamento social aplicado hoje, como se nada tivesse ocorrido de mais grave naquela época. Eram poucos os recursos de que dispunha a ciência e outros avanços nos anos 1920: o microscópio eletrônico (importante para a identificação de vírus) foi descoberto em 1931, e os primeiros vírus identificados por esta ferramenta se deram em 1935. A primeira empresa de aviação comercial surgiu em 1919, o que certamente influenciou pouco na disseminação desta doença naquela década.
A gripe espanhola matou 50 milhões de pessoas no mundo e contaminou cerca de 500 milhões, ou seja, um quarto da população do mundo naquela época. Hoje, temos 3,5 vezes mais a população daquela época, e a conexão pela aviação tornou o mundo pequeno e mais próximo nos contatos.
Conhecemos bem mais os vírus e temos um bom arsenal terapêutico, que não tem sido capaz de estancar a pandemia, mas tem contribuído para a diminuição proporcional de uma doença que ainda provoca uma mortalidade muito dolorosa.
Nos tempos atuais, a medida eficaz e que muda o contorno dessa doença é o distanciamento social, a higiene das mãos e as máscaras, que foram utilizadas como única arma na gripe espanhola e que também o são nos dias atuais.
Nossa autossuficiência nos faz ser pouco cuidadosos com nossa saúde coletiva. E é bom lembrar que mais da metade do mundo vive nas mesmas condições (ou até piores) do que se vivia na década de 1920 com relação a recursos básicos, como água e esgoto, e uma distância considerável de avanços da ciência para uso próprio.
Se sairmos dessa situação em condições de voltar à nossa vida “normal”, teremos que rever nosso “modus operandis”, pois, numa próxima pandemia (que certamente ocorrerá), poderemos não sair ilesos como espécie.
Aplicar ações simples, como as de dificultar a disseminação de doenças com cuidados de higiene associados, faz muita diferença no resultado final. É preciso enxergar o mundo como lugar único de todos nós. Cada boa e consciente ação individual poderá ser redentora para muitas outras pessoas coletivamente.
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