A ditadura será inevitável

“Notas de repúdio são inócuas. É hora de as forças democráticas do país, de direita e de esquerda, barrarem um notório projeto autoritário”


Por Antonio Gasparetto Júnior, professor, historiador e bacharel em Administração Pública

19/05/2020 às 06h59

A paralisia com que se observam as ações da Presidência da República é preocupante, uma vez que Jair Bolsonaro insiste em tensionar a democracia. O presidente participa de atos contra o Supremo Tribunal Federal e contra o Congresso, sugere o armamento da população contra os governadores e almeja o controle da Polícia Federal, por exemplo. Dentre outros absurdos, Bolsonaro fere gravemente o princípio ético de harmonia entre os Três Poderes.

Não estamos diante de algo imprevisível ou surpreendente. Desde o início de seus tempos na legislatura, Jair Bolsonaro demonstra o seu desprezo pela democracia, pela independência e pela harmonia dos poderes, bem como sua perspectiva aniquiladora de possíveis adversários políticos. Ninguém tem o direito de se dizer iludido ou surpreso com suas condutas, elas são públicas desde a década de 1980.

PUBLICIDADE

Porém sua visão de mundo parece mais antiga, remetendo à década de 1920. Sua frase sobre ser a Constituição assemelha-se, num contexto republicano, ao pensamento de Carl Schmitt. Conforme o jurista autoritário alemão, o soberano decidiria sobre um estado de exceção e suspenderia direitos e liberdades fundamentais em nome de uma luta contra o inimigo. Nos pronunciamentos de Bolsonaro, isso é muito evidente. Inimigo é todo aquele que discorda de suas palavras/ações e devem ser eliminados, bem como as liberdades de imprensa e de manifestação. Os resultados dessa perspectiva na história são de conhecimento geral.

No rol de suas manifestações estão declarações sobre a defesa do assassinato de mais pessoas durante a ditadura militar, o fechamento do Congresso, o ataque a minorias, a exaltação de torturadores, a perseguição a veículos de imprensa e, mais recentemente, a recorrente participação em atos autoritários. A saída de Sérgio Moro do Ministério da Justiça acrescentou mais elementos à lista, como o indício de se transformar a Polícia Federal em uma polícia política com interferência direta da Presidência.

Parecemos assistir a tudo isso imobilizados. Notas de repúdio são inócuas. É hora de as forças democráticas do país, de direita e de esquerda, barrarem um notório projeto autoritário. A inoperância somente levará ao que é evidente, ornado pela surpresa hipócrita. Ou a ditadura será inevitável.

O conteúdo continua após o anúncio

Os comentários nas postagens e os conteúdos dos colunistas não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é exclusiva dos autores das mensagens. A Tribuna reserva-se o direito de excluir comentários que contenham insultos e ameaças a seus jornalistas, bem como xingamentos, injúrias e agressões a terceiros. Mensagens de conteúdo homofóbico, racista, xenofóbico e que propaguem discursos de ódio e/ou informações falsas também não serão toleradas. A infração reiterada da política de comunicação da Tribuna levará à exclusão permanente do responsável pelos comentários.