Como chegamos a isso?


Por Mônica C. Ribeiro, jornalista e antropóloga

10/03/2021 às 06h55

Li esses dias que o grupo mineiro Boca Livre se separou, e o motivo é o mais estúpido de todos: no planejamento para voltar a gravar em estúdio, seus integrantes esperavam ansiosamente a vacina, enquanto um deles disse que se negava a tomar o imunizante, única possibilidade que temos de brigar para valer com esse vírus pandêmico.

Há alguns anos essa polarização maldita nos engoliu. Hoje temos um grupo, felizmente minoria, mas barulhento, que se alinha ao negacionismo científico, que mente sem nem mesmo corar o rosto, que se acha mais entendido em certos assuntos do que pesquisadores que dedicam sua vida a estuda-los. Que defende o autoritarismo, a ignorância, que não respeita a diversidade e não tem um pingo de empatia por outras pessoas.

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E temos o grupo que acredita que o mundo é melhor com a ciência, que tenta, quase sempre em vão, argumentar com esse outro grupo, afinal há nele mães, pais, irmãos, amigos dos quais nos vemos obrigados a nos separar por causa justamente desse autoritarismo que fabrica notícias falsas como se fossem mantras, de acordo com a narrativa que lhe convém, e não aceita o debate.

Para desvendar como chegamos a isso, cientistas sociais e políticos têm lançado seus estudos e nos feito refletir sobre uma série de coisas: como as redes sociais propiciam a formação de bolhas de ódio, como a manipulação faz com que muitos de nós nos tornemos fantoches e repetidores de mentiras, nos tirando a capacidade crítica. O desgaste da política, a qualidade de nossos parlamentares, a própria formação do Brasil, a realidade da nossa educação…esse papo vai longe.

A perplexidade com os comportamentos de ódio, em ver pessoas que antes eram tão próximas sucumbirem a isso, está comigo há alguns anos e se acirrou desde 2018, quando os brasileiros escolheram eleger esse presidente.

Essas pessoas, muitas delas integrantes das mais diversas correntes religiosas, ignoram o que seus deuses pregam. Tanto ódio, tanta raiva, tanta narrativa mentirosa…é preciso mais amor. Empatia. Respeito ao próximo e à diversidade. Atuação no coletivo.

A vacina, meus amigos e amigas, é o remédio para cuidar do outro, para vivermos na coletividade, exercendo nossos direitos, mas também nossos deveres.

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