O Republicano Rei Charles III


Por Renan da Cruz Padilha Soares, graduado em História pela Universidade Federal Fluminense e mestre em Práticas na Educação Básica pelo Colégio Pedro II. É docente da área de Linguagens e Sociedade, Curso de História, no Centro Universitário Internacional Uninter

06/11/2022 às 07h00

A monarquia está ameaçada! Sabemos que isso é somente um exagero poético de um historiador que viu como incrivelmente anacrônico o pomposo funeral real que ocupou grande parte dos noticiários do mundo. Mas digamos que a morte da rainha Elizabeth II e a consequente ascensão ao trono de seu filho como rei Charles III é, no mínimo, um abalo na mais importante monarquia do mundo.

Este abalo se relaciona ao próprio significado da existência da monarquia britânica em pleno século XXI. Se enganam aqueles que atribuem à realeza deste império um papel meramente figurativo. Para isso, seria necessário ignorar o poder dos símbolos e dos ritos para a cultura de um povo. Não é pouco que a Premier League, o mais rico campeonato nacional de futebol, tenha paralisado sua rodada. Não é insignificante que os sindicatos que representam os correios do Reino Unido suspenderam uma greve já programada para começar. E, definitivamente, não podemos ignorar uma fila de oito quilômetros, composta por anônimos e famosos, para o velório da rainha. O papel da realeza britânica é o de preservação da ordem e do status quo a partir de seu importantíssimo papel simbólico.

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Elizabeth II cumpriu, magistralmente, esse papel. Principalmente nas últimas décadas, como não simpatizar com uma senhorinha que amava seus cachorros corgi, tomava uns drinks e dirigia seu Range Rover? Séculos de violência colonial se desfaziam diante do sorriso da “vovó” em suas roupas impecáveis. Bom, pelo menos para aqueles que não sofreram a violência do império britânico na pele.

Mas agora a rainha se foi e o Rei Charles III está muito longe de cumprir esse papel à altura. Sua rejeição e falta de carisma são anteriores à sua ascensão ao trono do Reino Unido. Lembrando que, enquanto Príncipe de Gales, estampou os tabloides britânicos ao trair sua esposa Diana, “a princesa do povo”. Seus primeiros gestos públicos como monarca, durante os diversos e essenciais rituais reais, em nada ajudaram a melhorar sua popularidade. Pequenas grosserias e irritações, que poderiam ser completamente aceitáveis em um senhor de 73 anos de idade, não caem bem àquele que cumprirá o papel de preservar a realeza mais conhecida do mundo. Há um descompasso geracional também, afinal, não podemos esperar que o Rei Charles III crie uma conta no TikTok.

Evidente que não é a impopularidade de um rei que derruba uma longeva monarquia. Porém, tenho certeza de que todos os republicanos, de dentro do império britânico, se agitam ao analisarem o atual momento histórico. Mas a monarquia inglesa não está viva até hoje sem motivos. A falecida rainha Elizabeth mostrou como é possível que este anacrônico regime se conecte com a sociedade para se autopreservar. A História é uma roda viva sempre a girar, nos cabe agora estar atentos como a família real britânica se movimentará para não ser atropelada por ela.

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