Território marcado
Não é de hoje que o controle de determinadas áreas tem provocado a exclusão às avessas: pessoas em situação de risco são obrigadas a mudar de residência ante a pressão dos “donos do pedaço”, que impõem suas leis de dominação, marcando territórios e decidindo quem fica e quem tem que sair. O caso mais recente envolve uma adolescente de 14 anos, que, de acordo com o boletim de ocorrência, foi mantida em cárcere privado e estuprada. Os autores teriam avisado que ela não pertencia ao local e estava apenas pagando pelo abuso de transitar na região. A mãe, em entrevista à Tribuna, já disse que não fica nem mais um dia no Bairro Cidade Nova por conta das ameaças.
As autoridades lembram que há programas para integrar as comunidades, hoje apartadas por tais personagens que não permitem essa aproximação, punindo, como foi o caso, quem mora no bairro rival ao Jardim Gaúcho, na Zona Sul, mas admitem que o problema tem raízes mais profundas. E é fato. O pertencimento tornou-se matriz de uma série de questões que extrapolam os livros acadêmicos e se explicitam nas ruas. Muitos confundem pertencer com ser dono e, por isso, agem de tal forma, contrariando os limites impostos pela lei. Tais personagens criam seus guetos, dando-lhes uma identidade própria, que acaba tornando-se peça para a prática de atos insanos, em vez de promover questões ligadas à cultura e à promoção desses mesmos bairros.
Os tempos estranhos, que são o ponto central dessa pós-modernidade, têm sido desafiadores não só para os analistas mas para o próprio sistema, que não consegue reverter a situação. As redes sociais, pelas quais transita essa discussão, são as mesmas utilizadas para disseminação de falsos conceitos, capazes de provocar equívocos, como o de rejeitar o vizinho, como a jovem, impondo-lhe castigos de consequências graves.
A educação tem sido a ferramenta central para mudar esse cenário, mas as instâncias de poder precisam agir na busca de outros elementos. E aí reside outro problema: elas também estão em xeque, pois os episódios identificados pelas operações da Polícia Federal e pelo Ministério Público apontam para um caos sistêmico, no qual nem sempre é possível dissociar o mocinho do bandido. E, numa situação como essa, que exemplo essas instâncias podem dar ao andar de baixo?
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