Cargos de confiança
Mudar postos é uma prerrogativa dos dirigentes, mas nem sempre é uma operação de simples execução
O ex-presidente Tancredo Neves, do alto de sua sabedoria, dizia sempre que não se deve contratar quem não seria possível demitir, pois postos de assessoria sempre são passíveis de turbulências no decorrer da gestão. O caso que fechou a semana foi a possível recriação do Ministério da Segurança Pública, um pleito de secretários estaduais interessados em uma interlocução direta com a União em torno de seus pleitos. Não têm queixas do Ministério da Justiça, mas entendem que uma pasta específica seria melhor.
O ponto central, no entanto, é o ministro da Justiça Sérgio Moro, a principal estrela do Governo do presidente Jair Bolsonaro. Ele já fez chegar ao presidente que não aceita a divisão de sua pasta, salvo se comandar as duas, algo impensável em qualquer mudança na estrutura ministerial. Caso contrário, pedirá as contas e voltará para casa. Na Índia, para participar de eventos oficiais, o presidente disse que a divisão do ministério tem chance zero, mas deixou um “por enquanto” como ponto de interrogação.
O presidente pode mudar qualquer assessor, pois os cargos de confiança são demissíveis ad nutum, mas a questão Moro tem ingredientes especiais por conta de seu prestígio, sendo o ministro mais bem avaliado. Tirá-lo seria criar um desgaste desnecessário, embora no âmbito interno haja críticos severos ao estilo do ministro. Moro não fala, mas pode ser um problema para 2022. O Podemos, oportunamente, já avisou que gostaria de tê-lo como candidato à Presidência. O jogo, a despeito de uma eleição municipal no meio, já começou.
Os próximos dias serão emblemáticos, pois o assunto, certamente, será mantido na agenda mesmo diante do desmentido do presidente. A eleição para postos executivos é um exercício permanente de olho na reeleição em todas as esferas, dando margem a toda sorte de especulação. Caberá ao próprio presidente resfriar a discussão ou, o que é mais provável por conta de seu estilo, deixá-la pendente.
A divisão dos dois ministérios já tinha ocorrido no crepúsculo da gestão Michel Temer e também à época gerou desconforto, pois o titular da Justiça, Torquato Jardim, ficou em segundo plano enquanto o titular da Segurança, Raul Jungmann, tornou-se protagonista. Moro não quer sair dos holofotes.