Divisão de poderes
Câmara quer reduzir o que considera intromissão do Judiciário em atos do Legislativo, mas terá que zelar pelo comportamento de seus integrantes
Confirmando uma advertência do deputado Arthur Lira, na semana passada, quando presidiu a sessão em que os deputados confirmaram a prisão do também parlamentar Daniel Silveira (PSL-RJ), a Câmara Federal iniciou, nessa quarta-feira, a discussão em torno de uma proposta de emenda à Constituição (PEC), um projeto de resolução e um projeto de lei que, se aprovados, vão endurecer as regras que tratam da prisão de parlamentares. No seu discurso, Lira advertiu que a melhor forma de convivência entre os três poderes é cada um ficar no seu quadrado, isto é, acatou a prisão do colega, mas lembrou que haveria mudanças. Agora, elas estão em curso.
As alterações estabelecem, entre vários pontos, a criação de uma espécie de juiz de garantias no Supremo Tribunal Federal. Com isso, o ministro que declarar a prisão contra um parlamentar não poderá ser o mesmo que fará a instrução. O ministro Alexandre de Moraes decidiu monocraticamente a prisão do deputado e instruiu a votação na qual o plenário, por unanimidade, confirmou sua decisão.
A PEC e os demais projetos não surpreendem, pois há uma forte movimentação no Legislativo para evitar a prisão de deputados, sobretudo por opinião, mesmo que estas tipifiquem uma ação criminosa. O entendimento da Câmara, especialmente, é de que cabe ao seu Conselho de Ética decidir qualquer tipo de punição aos eventuais infratores. Tanto assim que já estão em pauta os processos envolvendo os deputados Daniel Silveira e Flordelis, ambos com sérios problemas. O primeiro, pelas ofensas ao STF, e a parlamentar, por estar sob suspeita de ter mandado matar o marido. Ela nega.
A despeito de o STF ter tomado sua decisão por unanimidade, há controvérsia em sua sentença, sobretudo por conta da assertividade do tribunal, que tem se envolvido sistematicamente em demandas de outros poderes. Vários juristas consideraram que, a despeito da gravidade das afirmações do deputado, à Câmara caberia resolver o caso.
Mas não é de hoje que o STF tem sido colocado sob holofotes por conta de suas ações. Salvo o caso de Daniel Silveira, a Corte tem sido palco de decisões divididas, indicando que a interpretação dos fatos tem tido um forte viés político. Como os fatos são de livre interpretação dos magistrados, a reação das ruas é marcada pela surpresa, por não entender o sentido de algumas decisões.
As regras do presidente da Câmara, Arthur Lira, indicam uma blindagem que pode resvalar para o corporativismo. De fato, os parlamentares devem ter imunidade para voz e voto, mas é necessário distinguir opinião e incitação, como foi o caso do deputado Daniel Silveira. Caso contrário, haverá danos à democracia, a mesma que ao Congresso, por obrigação e prerrogativa, cabe defender.