Braços cruzados
Paralisação no transporte coletivo tem que ser discutida além das relações de trabalho, devendo ser uma agenda de mobilidade urbana
É preciso encontrar uma solução para o impasse que se estabeleceu no transporte público de Juiz de Fora, a fim de garantir aos usuários do sistema o direito constitucional de ir e vir, sem que isso signifique ferir princípios básicos das relações de trabalho entre empregados e patrões. O que ora se vê é um processo em que, por questões de uma parte do setor, se aponta, com base em dados, uma redução do número de passageiros em detrimento dos custos que crescem permanentemente, sem que haja uma saída. Os acordos firmados não são cumpridos, e os profissionais são induzidos a cruzar os braços.
Mas há consequências. A legislação estabelece limites para qualquer tipo de paralisação em serviço essencial, e isso não está sendo cumprido. A população, por uma medida paliativa que se repete, está utilizando vans escolares disponibilizadas por decreto municipal, o que apenas resolve parte do problema, sobretudo em tempos em que qualquer tipo de aglomeração é questionável.
As discussões, porém, não se esgotam num processo trabalhista entre patrões e empregados, quando se sabe que há questões que vão além da relação de trabalho. O sistema de transportes, há anos, carece de reformulação, e as discussões até então encetadas não chegam a uma saída definitiva. A Câmara criou uma Comissão Parlamentar de Inquérito que apontou uma série de pontos que precisam ser superados, a começar por uma nova licitação do sistema. A Prefeitura, por sua vez, diz que encaminhou mensagem à Câmara tratando do assunto, mas a matéria não entrou na ordem do dia.
Em vez do jogo em que as partes se questionam mutuamente, a melhor alternativa é todos se reunirem para tratar do assunto. E aí cabem também os empresários e trabalhadores, que são a parte diretamente interessada. Pode-se até convidar alguma entidade que represente os usuários, mas os próprios vereadores, cujo mandato lhes foi concedido pela população, podem fazer esse papel.
A discussão, porém, tem que se afastar do inevitável viés eleitoral. Faltando pouco mais de dois meses para as eleições, o interesse político pode pesar numa questão que deve extrapolar o embate das urnas. É fato que os candidatos, legitimamente, têm pontos distintos sobre a mobilidade urbana e terão tempo de apresentá-los durante o período de campanha, mas a discussão, agora, deve servir para um primeiro passo, a fim de moldar o próprio projeto do futuro prefeito ou prefeita de Juiz de Fora.
Este é um dos principais desafios da gestão a ser inaugurada em 1º de janeiro de 2021, por ser uma demanda de interesse coletivo. A cidade, como é próprio das metrópoles, vê cotidianamente o aumento de bairros e logradouros, o que exige transporte, sem que haja correspondência na formulação dos custos. A conta acaba caindo no colo do usuário.
Há embrionariamente no Legislativo uma discussão sobre o financiamento parcial do setor, como ocorre em vários municípios. É um ponto a ser colocado à mesa, mesmo que não seja, ao olhar de muitos, a solução ideal. O que não pode, porém, é manter o status quo, que tem deixado a população literalmente a pé quando mais precisa.