Ética em xeque

Levar o caso do deputado Daniel Silveira para o Conselho de Ética seria atrasar uma questão que merece desfecho imediato


Por Tribuna

19/02/2021 às 06h58

Em entrevista à Rádio CBN Juiz de Fora, o deputado Júlio Delgado (PSB) denunciou a paralisação do Conselho de Ética da Câmara, que desde o ano passado não se reúne e está, agora, sendo provocado a tratar do caso do deputado Daniel Silveira – que defendeu o AI-5 e fez duras críticas ao STF -, até esta quinta-feira preso na Polícia Federal do Rio de Janeiro por ordem do ministro Alexandre de Morais. Segundo Delgado, convocar o conselho seria prorrogar um problema, pois demandaria tempo para uma decisão de mérito, que poderia ser encontrada em plenário. Sua presidência pretende abrir o processo na terça-feira e concluir o caso em dois meses.

A ineficácia do conselho tem sido constatada no decorrer de várias legislaturas, pois, em vez de ser um órgão de fiscalização e, se necessário, punição a parlamentares responsáveis por ações ilícitas, tornou-se um território corporativista, no qual a absolvição virou palavra de ordem, a despeito da responsabilidade dos indiciados. Desde o ano passado, esse mesmo conselho está em silêncio sobre a deputada Flordelis, também do Rio de Janeiro, acusada de mandar matar o marido. A discussão não avançou. O caso do deputado Daniel da Silveira, se for para o conselho, tende a ter o mesmo caminho, apesar da gravidade de suas postagens.

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O desfecho desse imbróglio deve ocorrer no curto prazo ante a sua repercussão. O deputado, pouco conhecido em plenário e mais visível nas redes sociais bolsonaristas e em ações como rasgar uma placa da vereadora Marielle Franco, assassinada no Rio de Janeiro, provavelmente receberá algum tipo de sanção, mas o mais adequado seria ficar sem o mandato, por não prestar nenhum serviço relevante ao país e, muito menos, à democracia.

Na sua defesa, ele se escuda na liberdade de expressão, mas, no vídeo postado nas redes sociais, e matriz do mais recente impasse, defende o retorno do AI-5. Deliberadamente ou por desconhecimento histórico, ignora o conteúdo do Ato Institucional que levou o país às trevas. Ele rejeitava exatamente a liberdade de expressão, a mesma que o parlamentar diz defender. A ação do STF, questionada em parte por alguns setores, que consideram a prisão um exagero, foi um recado àqueles que agem contra a democracia.

Em meio a uma pandemia, que já matou quase 300 mil brasileiros, chega a ser um contrassenso ter em pauta uma discussão que sequer deveria ter sido iniciada. Há graves questões em torno da doença que precisam ser resolvidas, mas o país, agora, se volta a um outro tema por provocação de um deputado de pouca relevância.
Em reunião em Brasília, governadores e secretários de Saúde cobraram do Governo federal um cronograma para continuidade do processo de vacinação. Em várias regiões, ele foi interrompido pela falta de doses. O ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, garantiu que até julho a demanda será resolvida, o que demonstra uma grave falha na logística, pois o país enfrenta um dos piores índices de contaminação. No entanto, em vez de ser esse o tema prioritário, o gesto de um deputado mudou o foco dos agentes públicos.

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