Fora da curva
O discurso apolítico que perpassou parte da campanha municipal do mês passado, e com contornos mais graves na sucessão nos Estados Unidos, tem sido uma marca dos últimos tempos com repercussões preocupantes, pois fragiliza as instituições e dá margem para ações graves, como os episódios de Brasília e Rio de Janeiro. No Distrito Federal, um grupo, em defesa da ditadura, invadiu a Câmara dos Deputados, subiu na mesa da presidência e ignorou uma sessão que estava em curso sob a presidência do deputado Waldir Maranhão. Os manifestantes só saíram após intervenção da Polícia Legislativa, mesmo assim, depois de um confronto.
No Rio de Janeiro, em protesto contra o pacote de medidas econômicas do Governo, os manifestantes enfrentaram a polícia num cenário de guerra. O inusitado foi a adesão de dois policiais ao grupo de protesto, sendo ovacionados pela dissidência. Ambos estão sob prisão administrativa, mas, no fundo, explicitavam um sentimento de outros policiais, também afetados pelo pacote do governador Luiz Fernando Pezão.
Em ambos os casos, a intolerância se fez presente, o que exige, de pronto, uma reflexão, pois episódios semelhantes podem se espalhar pelo país. Quando a rua age dessa forma, há um ponto fora da curva, pois trata-se de um claro desafio às instituições, especialmente aos políticos, a quem cabe a representatividade.
Tais episódios, porém, não são de graça. Eles fazem parte de um processo que vem se aguçando em virtude da leniência dos próprios políticos, que continuam no vai da valsa, ignorando os temas que causam ebulição pelo país afora. O mesmo Rio de Janeiro tem dois ex-governadores presos – Anthony Garotinho e Sérgio Cabral – por uso indevido das funções e em proveito próprio. Não é um fato comum, mas significativo para indicar que a rua pede mudanças.