Fidelidade em xeque
Justiça Eleitoral age para resolver impasses partidários que soam como ingerência por falta de uma legislação moderna e consistente
A falta de uma reforma política definitiva e de uma legislação eleitoral sólida cria espaço de insegurança para os próprios partidos, o que seria motivo suficiente para o Congresso agir, fato que ainda não aconteceu. Nesse vácuo, a Justiça Eleitoral – como já ocorreu em outros tribunais, especialmente no Supremo Tribunal Federal – toma decisões que deveriam ter sido resolvidas pela via legislativa. Os parlamentares se queixam de ingerência, mas abrem margem para tais manifestações. O caso mais recente, como destacou o jornal Folha de S. Paulo, foi a decisão do Tribunal Superior Eleitoral autorizando os deputados Rodrigo Coelho (SC) e Felipe Rigoni (ES), ambos do PSB, a trocarem de partido sem a consequente perda de mandato.
Os dois políticos votaram a favor da reforma da Previdência a despeito de o partido ter fechado questão contra as mudanças nas regras de aposentadoria. Foram punidos com a retirada de assentos em comissões e o veto para assumirem a relatoria de projetos de lei. A decisão ligou o alerta entre os dirigentes partidários, que temem a criação de precedentes que abram caminho para fragilização da fidelidade partidária, além do fortalecimento de movimentos desvinculados das legendas tradicionais.
Parte dos problemas, porém, não passa pela legislação eleitoral, e sim pelo modo como os dirigentes comandam suas legendas. Em anos eleitorais, especialmente, o jogo político ganha corpo, e os acordos podem ferir as estratégias dos próprios parlamentares. Num país com mais de 30 siglas, há um expressivo contingente que só aparece em períodos eleitorais para abrigar candidatos em dificuldades com suas próprias legendas ou sem espaço para enfrentar a concorrência interna.
A fidelidade também é colocada em xeque em decorrência de pressões para votação de matérias que nem sempre estão na agenda de deputados e senadores, mas pautadas pelas executivas. Os comandos partidários costumam fazer acordos voltados para o próprio umbigo, sem consultarem seus filiados. O resultado é o descontentamento, que pode levar a impasses como o dos dois parlamentares do PSB.
Com a proximidade do próximo pleito, as articulações já estão em curso já com vistas a filiações. Em princípio, o prazo era de um ano de antecedência, mas, por pressão dos próprios políticos, ele caiu para seis meses, facilitando a elaboração de estratégias eleitorais, porque muitos candidatos só decidiram sua filiação no apagar das luzes. Até lá muitas outras articulações vão colocar a fidelidade à prova, dado que não causará surpresa pelo atraso na própria reforma.