O papel das ruas
Movimentação nas ruas inibe implantação de medidas de flexibilização, mas a culpa não é do setor econômico, já que, mesmo num ciclo de isolamento, o movimento é intenso nas metrópoles
Quando se fala em combate ao coronavírus, a palavra recorrente é o isolamento, pois somente dessa forma será possível reduzir a curva de contaminação e antecipar medidas de volta à nova normalidade. E esse tem sido o principal desafio das autoridades sanitárias. Como é possível ver no dia a dia, o número de pessoas transitando pelas metrópoles é expressivo e preocupante. Muitas, é fato, por conta do trabalho e necessidades imediatas, mas há um elevado contingente que não considera o ficar em casa como medida mais eficiente. E aí é possível levar em conta uma tese do comércio que clama pela reabertura. “A culpa não é do setor, pois, mesmo com as lojas fechadas, as ruas e avenidas estão lotadas”.
Ao participarem ontem de debate nas plataformas digitais do Grupo Solar de Comunicação e da Rádio CBN Juiz de Fora, os prefeitos Antônio Almas, de Juiz de Fora, e Edson Teixeira Filho, de Ubá, destacaram a necessidade de conscientização coletiva, sobretudo por terem, diante de cenários de ruas cheias, dificuldade em tomar medidas de flexibilização, que contrariam protocolos estabelecidos pelo Minas Consciente, programa de combate à pandemia ao qual ambas as cidades aderiram, a despeito de nem todos os seus colegas de Executivo terem adotado a mesma postura.
Conscientizar o grande público tornou-se um problema mais complexo a partir do discurso político que permeia os debates sobre a pandemia. O presidente Jair Bolsonaro, ao ir às ruas, muitas vezes sem máscara, sinaliza para as ruas que o isolamento não é o melhor caminho para combater a doença. Daí, estados e municípios encontrarem dificuldade para cumprir suas metas.
Mas seria risível imputar somente ao presidente os impasses ora vistos pelo país afora. Há, é fato, governadores e prefeitos na mesma trilha política, agindo de acordo com conveniências eleitorais e impondo choques de instâncias. Os mineiros, para ficar no caso interno, encontram na relação do governador Romeu Zema com o prefeito de Belo Horizonte, Alexandre Kalil, o caso mais emblemático. A capital mineira, a despeito de uma população que já passa dos três milhões de habitantes, já começa a flexibilizar seus serviços. E Kalil destaca estar seguindo a ciência. A não adesão da capital ao Minas Consciente é um claro indício de enfrentamento político. Não será surpresa se ambos se encontrarem no pleito de 2022, quando os governos federal e estadual estarão à frente com o eleitor.
O diálogo é o caminho mais apropriado, por ser a via capaz de estabelecer contraditórios sem, necessariamente, soarem como enfrentamento. Há, é fato, visões diferentes de como conduzir a questão, o que só engrandece o debate. Para tanto, porém, todos devem estar dispostos a sentar-se à mesma mesa e buscar o caminho mais adequado de acordo com as características que se apresentam no período das discussões.