55% dos projetos aprovados na Câmara tratam de nomes de rua, títulos e datas

Polêmicas marcaram o ano de estreia da atual Legislatura


Por Renato Salles

20/01/2018 às 07h00

Dos mais de cem projetos de lei aprovados pelos vereadores na Câmara Municipal em 2017, 55% dizem respeito à denominação de ruas e espaços públicos, concessão de títulos honoríficos e acréscimos de datas no calendário oficial do Município. O balanço foi feito pela Tribuna, que analisou todas as proposições apresentadas pelos 19 parlamentares ao longo do ano (ver quadro).

Sobre o aspecto propositivo, é possível afirmar que o primeiro ano da Legislatura 2017/2020 foi mais movimentado que o ciclo que a antecedeu. Deixando de lado dispositivos parlamentares como requerimentos, representações, pedidos de informações e outros, os 19 vereadores apresentaram um total de 297 projetos de lei ordinários. O número é 32% maior que o registrado em 2013, ano de estreia da Legislatura 2013/2016, quando 224 matérias ordinárias foram sugeridas. Entre as propostas que iniciaram tramitação em 2017, 104 foram aprovadas e transformadas em normas jurídicas.

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Vale lembrar que ano de 2017 teve um início marcado por uma renovação de 37% dos parlamentares, com o debute de oito novos vereadores em seus primeiros mandatos, que estrearam um período legislativo cercado de polêmicas. Como de costume, o Palácio Barbosa Lima foi palco de discussões relevantes para a cidade. Entre leis recorrentes, como as aprovações de peças orçamentárias, por exemplo, os parlamentares protagonizaram debates acalorados, que resultaram em presença expressiva de juiz-foranos na audiência do plenário em deliberações de maior apelo e até mesmo em atritos e bate-bocas entre legisladores.

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Cenário nacional fomenta tom belicoso

Do ponto de vista político, também foi possível observar uma mudança de perfil no cotidiano da Câmara no ano de 2017. Em reflexo das transformações pelas quais o país claudica desde o advento das manifestações populares de 2013 e dos desdobramentos da operação Lava Jato, algumas discussões na Casa ganharam tons mais passionais e, por vezes, conservadores. Dois momentos em especial evidenciaram a nova agenda e atearam fogo entre grupos de posicionamentos políticos distintos dentro e fora do plenário do Palácio Barbosa Lima.

O primeiro deles ocorreu durante a votação do Plano Municipal de Educação (PME), cujas discussões legislativas se concentraram no mês de março. Mesmo sob protestos e duras críticas de setores ligados à educação acerca de mudanças feitas pela Prefeitura no documento original aprovado durante Conferência Municipal de Ensino realizada em 2015, o texto foi validado com acréscimo de emendas consideradas prejudiciais e de viés conservadores por parte dos docentes. Os pontos mais polêmicos na ocasião disseram respeito a adendos propostos pelos vereadores André Mariano (PSC) e José Fiorilo (PTC), que, de certa forma, restringiram as interpretações dos termos “diversidade”, que aparece oito vezes no corpo de texto do projeto de lei, e “direitos humanos”.

Polêmica semelhante se deu na aprovação de moção de repúdio à direção do Colégio João XXIII, vinculado à Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), por conta de um vídeo publicado na internet em que o artista performático Nino de Barros, que incorpora a drag queen Femmenino, visita o colégio para saber dos alunos como estava a expectativa para o 12 de outubro, Dia das Crianças. Sob o argumento de que a atividade fomentava o que alguns parlamentares chamam de “ideologia de gênero” o repúdio foi proposto pelos vereadores André Mariano, Carlos Alberto Mello (Casal, PTC), Júlio Obama Jr. (PHS) e Charlles Evangelista (PP).

Uma vez mais, a proposição levou um grande número de pessoas à Câmara e ateou fogo no confronto de ideias e posicionamentos, que acentuou características da atual discussão pública nacional, colocando os discursos moralista e de defesa da diversidade em lado opostos. Em uma votação apertada, o repúdio acabou aprovado por dez votos a sete.

Controvérsias devem seguir em 2018

Se 2017 foi um ano marcado por polêmicas, o ano deixa o legado para seu sucessor. Isto porque algumas propostas polêmicas apresentadas no ano passado devem voltar à baila nos próximos meses. A mais controversa delas deve colocar novamente setores da educação em rota de colisão com o discurso conservador que tem pautado as ações de alguns parlamentares. Trata-se do projeto de lei ordinário de número um da atual Legislatura. De autoria do vereador José Fiorilo (PTC), o texto pretende implementar um programa denominado “Infância sem pornografia” na rede municipal de ensino.

Em tese, o teor central da proposição visa obrigar que a “dignidade especial de crianças e adolescentes” e o direito das famílias de “educar seus filhos menores de acordo com suas convicções religiosas e morais, em consonância com a Convenção Americana sobre Direitos Humanos” sejam respeitados em unidades Municipais. Na prática, a redação traz uma compilação de legislações federais já vigentes e é criticada por educadores pelo entendimento de que o Fiorilo tenta utilizar do apelo provocado pela combinação das palavras “infância” e “pornografia” para criminalizar os docentes de maneira geral ao colocá-los sob constante suspeição.

A partir de setembro do ano passado, a proposição apareceu na ordem do dia em oito sessões até ser aprovada em primeira discussão no dia 27 de novembro. A maioria dos debates foi marcada pela presença de grupos contrários e favoráveis ao projeto de lei, o que chegou a elevar a tensão de alguns debates. Quando o dispositivo chegou para discussão em segundo turno, o autor apresentou um projeto de lei substitutivo de teor semelhante ao original. A movimentação fez que com a peça retornasse para a apreciação das comissões permanentes da Câmara, ficando a decisão final de seu mérito postergada para 2018.

Outra polêmica iniciada no ano passado é a que gira em torno de projeto de lei de autoria de José Márcio (Garotinho, PV). O texto prevê a aplicação de restrição legal a bares, cervejarias e similares que forem reincidentes em infrações à legislação municipal de posturas no que se refere a desrespeitos aos limites de emissão de ruídos, colocação de mesas e cadeiras em via pública e sujeira no entorno do estabelecimento. Nestes casos, a sanção poderia restringir os horários de funcionamento de estabelecimentos infratores até as 22h, por um período de seis meses a um ano. O texto tem sido bastante criticado por comerciantes do setor. Ainda tramitando em primeiro turno, a proposição já apareceu na pauta de votação no atual período legislativo.

Tramitação reiniciada

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Única proposição rejeitada em 2017, o projeto de lei de Wanderson Castelar (PT) que pretende dar maior transparência com relação às finanças pessoais de agentes públicos municipais deve voltar a ser debatido este ano. Isto porque o petista fez valer prerrogativa regimental e, em janeiro, reapresentou a proposta que visa obrigar que seja publicado no Portal da Transparência Municipal dados relativos à evolução patrimonial de detentores de mandatos como prefeito, vice-prefeito e vereadores e ocupantes de cargos de confiança como secretários municipais e dirigentes máximos de autarquias, fundações, empresas e demais órgãos da Administração indireta. Se, no ano passado, a polêmica em torno da iniciativa ficou restrita à Câmara, este ano Castelar quer fomentar o interesse coletivo pela proposta, de forma a valer-se do apelo popular para garantir a aprovação do texto.

Realização de concurso é aguardada

Nem só de polêmicas, no entanto, viveu a Câmara em 2017. Além dos mais de cem projetos aprovados ao longo ano passado, a política interna da Casa mostrou-se linear. Após presidir a Casa no biênio 2015/20116, o vereador Rodrigo Mattos (PSDB) assumiu seu segundo mandato à frente da Mesa Diretora já em janeiro. No mesmo mês, José Márcio (Garotinho, PV) foi indicado como líder do prefeito Bruno Siqueira (PMDB) no Palácio Barbosa Lima. Apesar de casos raros de defecção, a bancada governista se mostrou fiel ao Poder Executivo e garantiu a aprovação de 27 projetos de lei e um projeto de lei complementar de autoria da Prefeitura, encaminhados à Câmara por meio de mensagem do Executivo.

A Mesa Diretora conseguiu tirar do papel alguns projetos. Destaque para a consolidação da JFTV Câmara. O canal televisivo do Poder Legislativo, que transmite as sessões ordinárias da Casa, audiências pública e outros eventos ao vivo – além de programação produzida pela equipe de comunicação do Palácio Barbosa Lima -, começou a ser transmitido em canal aberto, pelo dial 35.1, em maio. Antes, em fevereiro, a Casa lançou o programa E-Câmara- Transparente e Digital, que tem por objetivo modernizar os processos de circulação de informações, dar mais transparência aos projetos em tramitação e diminuir a utilização de papel e, assim, reduzir custos.

Por outro lado, a realização de concurso público para a contratação de 30 profissionais efetivos pela Câmara se revelou uma novela. Sinalizada por Rodrigo Mattos quando o vereador assumiu seu primeiro mandato como presidente da Câmara, ainda em janeiro de 2015, a proposta teve em 2017 seu ano mais rocambolesco. Os problemas no cronograma se acentuaram a partir de março, quando o Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) questionou contrato firmado por dispensa de licitação entre a Casa e a Fundação Mariana Resende Costa (Fumarc), que, inicialmente, seria responsável pela realização do certame.

À época, o promotor Paulo César Ramalho, titular da Promotoria de Direitos Humanos e Patrimônio Público em Juiz de Fora, recomendou a realização da concorrência. A indicação foi acatada pela Câmara, que, desde então, oficializou a celebração do distrato com a Fumarc e se debruçou na confecção das regras da para efetivar a licitação. Em dezembro, enfim, o Legislativo lançou edital para a contratação de empresa especializada na prestação de serviços técnicos profissionais para a organização, a operacionalização e a execução de concurso público. O texto foi revisto após impugnação apresentada por uma empresa interessada no pregão e a data para realização da concorrência ficou definida para o próximo dia 17 de janeiro.  Agora, com a definição da empresa responsável, a Consulpam, a expectativa é de que os próximos passos para a realização do concurso incidam ainda em 2018. A conferir.

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