Crise financeira atinge trabalhadores da PJF
Sem perspectivas de pagamento de salários, benefícios e verbas rescisórias, famílias relatam enfrentar sérias dificuldades
A crise financeira do Município tem atingido diretamente milhares de trabalhadores da Prefeitura de Juiz de Fora (PJF) – entre servidores efetivos, contratados e terceirizados -, que seguem sem a perspectiva de recebimento de salários, benefícios e verbas rescisórias. Para algumas categorias, a incerteza já se arrasta por meses, o que tem deixado famílias em grave situação de dificuldade financeira. A Justiça já foi acionada por parte dos terceirizados, que buscou apoio junto ao sindicato. No entanto, este respaldo tem sido mais difícil para os profissionais temporários que tiveram contratos rescindidos. Sem uma entidade de classe que represente a categoria, eles afirmam que se sentem completamente desamparados.
A uma semana do Natal, os servidores efetivos convivem com a indefinição sobre o pagamento do 13º salário. Em entrevista concedida ao programa Pequeno Expediente da Rádio CBN Juiz de Fora, na última quinta-feira (13), o secretário de comunicação da PJF, Michael Guedes, informou que ainda não há previsão para o cumprimento da gratificação natalina. Ele afirmou que o não recebimento das verbas por parte do Estado prejudicou as contas do Município. “A crise se agravou muito em 2018, devido à ausência e aos atrasos de repasses de recursos constitucionais. Isso fez com que a Prefeitura, ao longo desse ano, fosse injetando, cada vez mais, recursos do Tesouro para cumprir suas obrigações. Assim, chegamos na segunda metade do ano sem o provisionamento para essa reta final, quando a arrecadação já é mais baixa.”
Em agosto, a PJF criou um gabinete de enfrentamento da crise com o objetivo de minimizar os impactos na saúde financeira da cidade. “Nesses quatro meses, nos reunimos diariamente para fomentar medidas para que a Prefeitura conseguisse vencer o ano”, afirmou Michael. Em outubro, durante a apresentação do projeto da Lei Orçamentária Anual (LOA) para 2019, o prefeito Antônio Almas (PSDB) afirmou que o Executivo não tinha garantias financeiras de que poderia efetuar o depósito do 13º salário aos servidores. A situação segue indefinida.
Sinteac exige pagamento de trabalhadores na Justiça
O Sindicato dos Trabalhadores em Empresas de Asseio, Conservação e Limpeza Urbana (Sinteac-JF) moveu ação coletiva na 4ª Vara da Justiça do Trabalho de Juiz de Fora solicitando tutela para que o Município deposite faturas pendentes a fim de que a empresa MB Terceirização repasse aos trabalhadores os pagamentos referentes aos salários e os benefícios de vale-transporte e tíquete-alimentação do mês de outubro. O pedido de tutela é possível quando há caráter de urgência e o requerimento da parte não pode esperar a execução da sentença.
Conforme já noticiado pela Tribuna, cerca de 400 funcionários terceirizados da Prefeitura de Juiz de Fora (PJF), contratados pela MB Terceirização, enfrentam atrasos no pagamento de forma recorrente. Eles são responsáveis pelos serviços de conservação e limpeza nas unidades de saúde municipais, que incluem o Hospital de Pronto Socorro (HPS), o PAM-Marechal, a Regional Leste e as UPAs. A expectativa do sindicato é de que a ação traga resultados antes do recesso de final de ano.
A advogada do Sinteac, Cristiane Souza Fernandes, informou que a PJF já realizou parte dos depósitos e que a empresa se manifestou favorável ao repasse. “A ação pretende amenizar a situação dos trabalhadores, que é grave. Eles não receberam os salários e os benefícios dos meses de outubro e novembro. Agora a Prefeitura rescindiu o contrato com a MB Terceirização, e ainda é preciso pagar as verbas rescisórias. Decidimos cobrar na Justiça aos poucos para garantir que, pelo menos, uma parte seja recebida neste momento.”
Ajuda de parentes e amigos
Em entrevista à Tribuna, uma trabalhadora que preferiu não se identificar relatou que tem enfrentado sérias dificuldades financeiras. “Tenho contado com a ajuda de parentes e amigos para não deixar faltar nada em casa. É muito triste você trabalhar, confiar que vai receber e isso não acontecer.” Segundo ela, há colegas que estão em situação ainda mais difícil. “A gente sabe de pessoas que estão com a vida ainda mais complicada porque as contas estão atrasadas, alguém na família perdeu o emprego, e o dinheiro está fazendo muita falta.”
A advogada Cristiane afirma que o sindicato tem monitorado o andamento da ação diariamente. “Conversei com o juiz responsável, e ele me disse que deve sair um despacho com a possibilidade de marcação de audiência”, adianta. “Nossa expectativa é resolver essa pendência relativa aos pagamentos de outubro até terça-feira (18), antes do recesso.” Com relação aos demais pagamentos que não foram feitos, ela firma que outras ações coletivas serão movidas.
A assessoria da Secretaria de Saúde da PJF informou, em nota, que “por determinação judicial, fez o depósito em juízo do último mês de contrato com a MB”. A pasta declarou, ainda, que “reitera que não há qualquer dívida com a empresa e que o acerto com os trabalhadores é de responsabilidade da contratante.” A Tribuna tentou contato com a empresa, mas os telefones disponíveis não atenderam.
Temporários estão sem rescisão
A demora para o acerto das verbas rescisórias aflige outro grupo de mais de 30 trabalhadores que foram contratados temporariamente para atuar como agente de atendimento ao público em postos de saúde do município. A contratação foi feita por meio do edital 288, lançado em janeiro de 2016, e tinha vigência até abril deste ano. No entanto, conforme o relato do grupo, a Secretaria de Saúde teria solicitado a permanência dos profissionais após este prazo. No segundo semestre, eles começaram a ser dispensados, mas até agora não receberam os direitos trabalhistas.
De acordo com uma profissional, que preferiu não se identificar, após a aprovação no processo seletivo nenhum documento foi assinado. “Busquei orientação com um advogado que me disse que sem esse contrato, a situação fica bem difícil. A orientação no Sindicato dos Servidores Públicos (Sinserpu) é para que procuremos o Ministério do Trabalho. Nós estamos indo de um lado para o outro para tentar receber o que é de nosso direito. É uma sensação de total desamparo.” Segundo ela, nos contatos feitos diretamente com a Secretaria de Saúde, a informação é que “não há previsão para o pagamento”.
Outra trabalhadora diz que as demissões foram feitas de forma repentina. “No meu caso, ligaram para o posto onde eu trabalhava e me disseram para não ir no dia seguinte. Há pessoas que foram dispensadas por WhatsApp”, relata. “A informação era que eu não precisaria ir até à Secretaria de Saúde, pois o pagamento seria depositado em conta, e eu deveria aguardar. Saí em outubro e estou esperando até agora”, lamenta. “Estou contando com a ajuda da minha família para pagar as contas e já pedi cesta básica na igreja. A minha situação só não é pior porque tenho casa própria. Há colegas que estão com dificuldades maiores, passando aperto para pagar aluguel, luz e fazer supermercado.”
Para outra trabalhadora, a espera pelo pagamento acontece desde setembro. “Nós estamos muito desamparados. É uma situação cruel o que estão fazendo. Quando precisaram manter o nosso trabalho, nós ficamos. Depois fomos dispensados sem a menor consideração. Não foi nada conversado, não temos expectativa para o pagamento e não tivemos nossos contratos assinados.” Ela diz ter ocorrido uma série de irregularidades durante o período de contratação. “Eu fazia trabalho de farmacêutica, apesar de não ter essa formação e não ter sido contratada para isso. Já passei, mais de uma vez, pelo constrangimento de receber a notificação do Conselho Regional de Farmácia.”
“Precariedade”
O presidente do Sindicato dos Servidores Públicos (Sinserpu), Amarildo Romanazzi, afirma estar ciente da situação. “O sindicato repudia veemente essa atitude cruel por parte da Prefeitura. Por isso, somos contrários à contratação temporária. Os trabalhadores são submetidos à precariedade, mas como não assinam contrato fica muito difícil garantir um respaldo jurídico. Infelizmente, não temos o que fazer, e cabe a eles acionarem o Ministério do Trabalho.” Amarildo afirma que o problema não é restrito aos contratados como agente de atendimento ao público. “É muito recorrente. No entanto, os trabalhadores só procuram o sindicato ao final do contrato quando tudo já aconteceu. Se nos procurassem quando foram contratados, nós orientaríamos, por exemplo, a não começarem a trabalhar antes da assinatura do contrato.”
Procurada pela Tribuna, a Secretaria de Saúde assegurou que “o pagamento das referidas rescisões será realizado na próxima quarta-feira, 19 de dezembro, reforçando todos os esforços feitos pelo Município diante da grave crise financeira enfrentada decorrente dos atrasos e não repasses de recursos constitucionais pelo Governo do Estado de Minas Gerais”.