Decreto permite redução de ICMS sobre querosene de aviação
Medida pode até zerar cobrança do imposto caso companhias aéreas cumpram contrapartidas
Com o intuito de incentivar a expansão do setor aéreo no estado, o Governo de Minas Gerais publicou, no fim do mês de janeiro, um decreto que prevê a redução do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) cobrado sobre o querosene de aviação (QAV) revendido às companhias aéreas brasileiras nos aeroportos mineiros. A medida, que exige uma série de contrapartidas das empresas, pode até mesmo zerar a alíquota do imposto, que atualmente consta em 18%. A isenção completa, todavia, prevê o cumprimento de todos os requisitos listados pelo dispositivo. As aéreas que aderirem parcialmente às condições também podem receber redução do imposto, que pode vir a incidir entre 2% a 7%.
Dentre as regras gerais que definem as contrapartidas, é necessário que as aéreas cumpram um ou mais dos seguintes itens: possuir um centro de manutenção de aeronaves no estado; ter, no mínimo, 80 decolagens diárias do Aeroporto Internacional de Belo Horizonte; ter voos regulares em 14 municípios mineiros; além da operação de voos internacionais a partir do estado com aviões de corredor duplo, que carregam em média 200-300 passageiros em seu interior. Para conseguir a isenção total do ICMS na compra do QAV, todavia, é necessário que as empresas cumpram com todos os itens listados acima até o fim do ano. De acordo com a Secretaria de Fazenda de Minas Gerais (SEF/MG), até o presente momento, somente a Azul Linhas Aéreas está em processo de assinatura do protocolo de intenções com o Estado.
Mesmo que os requisitos exigidos pelo Executivo estadual, de certa maneira, não sejam suficientes para contemplar todas as particularidades operacionais das aéreas que operam em Minas Gerais, a concessão de benefícios fiscais para o setor é sempre vista de maneira benéfica pelo mercado, na visão do doutor em engenharia de transportes e idealizador do perfil no Instagram “Papo de Aeroporto”, Rafael Castro. “O Brasil é o único país do mundo que possui um imposto estadual sobre o querosene de aviação. Esse fato, somado aos aumentos que aconteceram nos últimos anos e à dolarização do combustível (mesmo que mais de 93% do que consumimos seja produzido no próprio Brasil), faz com que nós tenhamos um dos QAVs mais caros do mundo. O combustível responde, hoje, por cerca de 40% dos custos globais das empresas aéreas brasileiras, então programas de redução do ICMS são vistos com muito bons olhos pelo mercado”, analisa.
Ainda durante o mês de Janeiro, o Governo do Estado de São Paulo anunciou uma redução de 1,3% na alíquota do ICMS cobrado sobre o QAV no estado, que passou de 13,3% para 12%. Juntamente com o anúncio da medida, o governador paulista Tarcísio de Freitas (Republicanos) também divulgou a criação subsequente de 150 voos domésticos no estado devido à redução do imposto. Para Castro, ambos os projetos beneficiam o setor da aviação de maneira geral. “Tendo em vista o impacto do altíssimo custo dos combustíveis na aviação, programas como esses devem corroborar para uma diminuição das tarifas aéreas, deixando o mercado doméstico mais competitivo e o transporte aéreo mais acessível aos passageiros brasileiros”, avalia.
Medida tende a beneficiar Azul, que tem hub em MG
De acordo com o próprio decreto nº 48.566, publicado em 26 de janeiro, a criação do benefício está diretamente atrelada à implementação, pelas companhias aéreas, de um centro de conexões de voos (hub aéreo), no Aeroporto Internacional de Belo Horizonte. Dentre as três maiores empresas que operam atualmente no país, somente a Azul Linhas Aéreas possui um hub de conexões no local. Diante da adesão às medidas requeridas pelo Estado, a companhia já anunciou a criação de três novas rotas em Minas a partir de Confins, com voos para Araxá, Divinópolis e São João del-Rei. Além disso, também foi criada a primeira conexão aérea direta do Brasil com a cidade de Curaçao, no Caribe, que tem previsão de início em junho.
Análise realizada pela Tribuna a partir de dados disponibilizados pela Agência Nacional de Aviação Civil e pelo site aeronáutico Flight Radar 24 permite observar que as outras duas maiores companhias do país, Latam Airlines e Gol Linhas Aéreas, ainda estão longe de atingirem a média requirida de 80 decolagens diárias do Aeroporto de Confins, tendo em vista que, em média, ambas possuem cerca de 20 decolagens diárias do local – enquanto a Azul possui cerca de 90. Por outro lado, ainda que essas duas empresas sejam as principais detentoras do mercado doméstico, com participação total no setor de 38,5% e 33,6% em novembro de 2022, respectivamente, Latam e Gol também estão distantes de possuírem ligações aéreas com 14 munícipios mineiros, um dos itens necessários para a concessão do benefício fiscal.
A Tribuna questionou as três empresas sobre uma possível adesão ao projeto de incentivo fiscal. Em resposta, a Azul afirmou que vê com bons olhos a iniciativa do Governo estadual em reduzir o custo fiscal do abastecimento de aeronaves nos aeroportos de Minas Gerais. “Essa política, que está em linha com outras administrações estaduais no país, gera melhores condições para o desenvolvimento e crescimento da aviação comercial.” Já a Latam informou que também aprecia a iniciativa e que as reduções de carga tributária são extremamente relevantes para diminuir a pressão de custos altos no setor. “Para o momento, seguimos em negociação com as autoridades locais buscando uma possível redução parcial da alíquota do querosene de aviação (QAV) com base na legislação vigente”, afirmou a companhia. Por fim, a Gol respondeu que “sempre mantém diálogo com os representantes dos estados em que opera seus voos e, em conjunto, trabalha para garantir a melhor conectividade para todos os brasileiros que viajam pelo país”.
Aeroportos da região dependem das aéreas
Diferentemente da iniciativa realizada em São Paulo, que reduziu a alíquota do ICMS sobre o QAV sem a necessidade de contrapartidas, o novo decreto promulgado pelo Governo de Minas pode não ser eficaz, de imediato, na criação de novos voos no estado fora das regiões que já possuem operações mais consolidadas. Anteriormente à publicação da medida, o setor já contava com redução da alíquota do imposto sobre o QAV em Minas, diante da existência de um regime de Tratamento Tributário Setorial (TTS) que prevê cargas tributárias, que variam de 4% a 10%, para companhias áereas que operem em, pelo menos, dez municípios. Vale lembrar que a Azul tem operações em 14 cidades do estado. Já a Gol e Latam possuem atualmente, respectivamente, seis e quatro bases operacionais.
A Tribuna questionou os dois aeroportos que atendem Juiz de Fora e região se ambos estão em negociações para uma possível expansão nos voos. Sem operações comerciais desde 2014, o Aeroporto da Serrinha continua buscando novos operadores aéreos. “A Infraero segue com o trabalho de planejamento conjunto com a Prefeitura para o desenvolvimento aeroportuário em curto, médio e longo prazo, incluindo melhorias necessárias à infraestrutura para a viabilização de novas rotas e ampliação da conectividade da região da Zona da Mata”, afirmou a concessionária do local. Já o Aeroporto da Zona da Mata, que recentemente ganhou uma ligação nova por meio da Azul Conecta para Belo Horizonte, avaliou a medida do Governo de Minas de forma positiva, e informou que mantém interlocução com os operadores aéreos a fim de atrair novas rotas e frequências.