Apenas um pulmão e o sentimento do mundo

Portador de uma síndrome genética desconhecida, descoberta logo após seu nascimento, Pedro Junqueira não apenas driblou os prognósticos médicos, que diziam que ele não ia sobreviver, como, hoje, aos 32 anos, nada feito um peixe. Confira esta história de superação na 6ª matéria da série “Incríveis”


Por Carla Duailibi

25/02/2018 às 07h00- Atualizada 02/03/2018 às 09h30

(Foto: Marcelo Ribeiro)

De braços dados com a mãe, ele chega com seu roupão amarelo e chinelos para a aula de natação, assim como faz há sete anos, às quartas e sextas, no meio da tarde. Sobe a rampa que leva ao segundo pavimento da Academia Arkadyas, na Graminha, onde fica a piscina aquecida, no seu ritmo, sem pressa. Seus olhos azuis, de uma doçura infinita, encaram a equipe de reportagem da Tribuna com um quê de receio. A aula com o professor e amigo Luizir Alberto Souza Lima neste dia está diferente, com mais gente do que ele está acostumado. Na próxima hora, Pedro Junqueira, 32 anos completados no último dia 14 de fevereiro, terá a piscina toda para si. A natação, que para muita gente é um baita desafio justamente pela dificuldade de se respirar em baixo d’água, para Pedro é mel na chupeta. Ele faz isso com suavidade e um sorriso no rosto.

Como explica o educador físico Luizir, a atividade tem um papel muito importante para ele, pois aumenta sua capacidade cardiorrespiratória ao mesmo tempo em que propicia mobilidade nas articulações sem impacto. O professor utiliza macarrões e flutuadores coloridos para dar equilíbrio e estimular a parte cognitiva de Pedro. Ele ri, se diverte. “Pedro vai apontando as cores que quer, pede para eu trocar as formas, e vamos nos comunicando. Ele é o grande mestre. Mergulha, nada cachorrinho. Solta borbulhas e respira com perfeição, inspirando o ar pela boca e soltando pelo nariz, em sintonia com a água”, relata Luizir.

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Ele lembra que, no começo, o aluno era tímido e interagia pouco. “Foi ele quem me ensinou, fui observando e aprendendo com ele. Pedro era mais apático, mas como é uma atividade prazerosa, foi ficando mais receptivo e melhorando sua comunicação, através do gestual. Antes ele nadava apenas alguns segundos, mas hoje consegue nadar até seis, sete minutos sem parar, o que é um grande avanço”, relata.

Uma gargalhada por dia

Quando nasceu, em 1986, os médicos acreditavam que Pedro não iria sobreviver. O bebê, de baixo peso, 2kg e 400g, veio ao mundo com atrofia no coração, tinha o palato aberto e uma síndrome genética desconhecida, apesar da gravidez normal da mãe, a psicóloga Inês Junqueira, 58 anos . “Fiz todo o pré-natal, nada foi detectado. Os problemas foram conhecidos após o nascimento. Foi uma criança frágil. Alimentá-lo exigia dedicação e paciência. Tinha muita dificuldade para mamar, se cansava logo. Aos 6, 7 anos, desenvolveu uma escoliose em função da fragilidade de sua estrutura óssea, com posterior atrofia de um dos pulmões. É portador de autismo, não fala, mas escuta muito bem. Me disseram que ele teria uma vida vegetativa, sobre uma cama. Imagina se eu tivesse acreditado… Mãe tem isso, né? Nunca tive medo de perdê-lo”, diz Inês.

(Foto: Marcelo Ribeiro)

Ela lembra que o menino andou aos 5 anos e não fala em função do autismo. “Mas entende tudo, embora não fale uma palavra”, ressalta. Desde cedo, Inês conta que procurou várias atividades para estimular o desenvolvimento do filho, e isso foi fundamental. Segundo ela, a natação é tudo para o filho. “Primeiro porque ele encara como um lazer, um prazer, e é o que o mantém vivo, por causa dos exercícios cardiorrespiratórios. E o trabalho do Luizir é maravilhoso. Ele é feliz. Quando acorda, a primeira coisa que faz é dar uma gargalhada. Ele tem tanto prazer com a vida que também se esforça, e com isso vai vencendo as barreiras que a vida impõe”, resume.

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