Preparadores defendem um mês de treinos antes de retorno aos jogos

Profissionais do futebol de Tupi e ex-Tupynambás reforçam ser necessária uma nova pré-temporada para readaptação física e redução de lesões


Por Bruno Kaehler

21/06/2020 às 07h00- Atualizada 01/07/2020 às 16h54

“Você pode jogar uma partida depois de três semanas nas férias, mas passamos dois meses no sofá sem fazer muita coisa. É por isso que os jogadores não estão totalmente prontos. Mas isso é porque precisamos terminar a temporada, temos que limitar o dano econômico dos clubes.” O relato do técnico Pep Guardiola em entrevista antes da vitória do Manchester City sobre o Arsenal por 3 a 0, na última quarta-feira (17), em uma análise sobre a retomada da temporada com a Premier League, na Inglaterra, ajuda a resumir o que pensam também profissionais que trabalham ou tiveram vínculo com os times profissionais de Juiz de Fora sobre a necessidade de um maior período de preparação nos treinamentos até que os jogos, normalmente disputados duas vezes por semana, voltem com maior segurança às condições físicas dos atletas.

Em defesa da necessidade de uma nova pré-temporada, o que Fluminense e Botafogo, por exemplo, têm buscado, inclusive no âmbito jurídico, contra as decisões da Federação de Futebol do Estado do Rio de Janeiro (Ferj), o ex-preparador físico do Tupynambás, Robert Yoshio, de vínculo com o time local até a paralisação do Estadual por conta da pandemia do novo coronavírus, contextualizou os diferentes cenários dos clubes brasileiros. Para ele, as distintas situações financeiras, estruturais e consequentes formatações de elenco requerem um tempo de preparação dos jogadores ainda maior aos times de menor investimento.

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“Acho que poucas pessoas sabem o que acontece por trás do futebol, que é dividido entre clubes grandes, médios e menores. As equipes maiores geralmente têm atletas com um lastro do ano inteiro de trabalho, então qualquer estímulo, ativação muscular, fortalecimento ou manutenção física e esses atletas conseguem ter uma capacidade muito boa. Em clubes menores, como o Tupynambás, que sabemos que não é do tamanho de um Cruzeiro, Atlético, como gostaríamos que fosse, geralmente vêm atletas de vários lugares, parados há dois, três meses, sem treinar. A dificuldade é muito grande com ou sem a pandemia”, inicia Robert.

“A realidade dos clubes menores é essa, de virem atletas de diversos locais do país, às vezes sem lastro físico, acima do peso, porque são mais baratos. O que vai modificar mesmo no retorno são os cuidados com o coronavírus. No clube menor você vai fazer uma pré-temporada com treinamento físico, voltar a readaptar a musculatura, tentar homogeneizar ao máximo o percentual físico do grupo. É quase igual a uma pré-temporada, mas com os cuidados de saúde pela pandemia”, explica o preparador físico.

Logo, em síntese, conforme a observação de Robert, é como se os clubes grandes estivessem em janeiro e os pequenos em novembro ou dezembro, quando iniciam a pré-temporada.

Robert (segundo da esquerda para a direita) acredita em pré-temporada normal sobretudo nos clubes de menor expressão (Foto: Régis Melo)

Um mês de treinos

O profissional, que também acumula passagens por clubes como o Mixto (MT), URT (MG) e Boa Esporte (MG), reforçou que, cientificamente, o período mínimo de trabalho para que os atletas voltem à sequência de partidas capacitados fisicamente é de um mês.
“Seria ideal, na parte da ciência, quatro semanas. Como no futebol hoje é tudo em cima da hora, em três semanas o clube já está pronto para iniciar o campeonato”, conta Robert, que lembra, ainda, da evolução dos exercícios no período que antecede o início dos torneios. “Antigamente você usava só uma valência, fazia apenas o físico. Hoje, não, mudou muito. Você consegue trabalhar a parte física com bola, já adaptando os trabalhos. Tem uma variedade muito grande de atividades para chegar aos seus objetivos.”

Se Botafogo, Fluminense, Tupynambás ou qualquer outra equipe entrar em campo oficialmente em período inferior ao citado pelo preparador físico, as consequências podem prejudicar atletas e clubes de curto a longo prazo. “Se não derem um tempo mínimo de 15 a 21 dias para fazer um trabalho com uma pré-temporada, o impacto vai ser grande no número de lesões. É um alto risco. Além do baixo índice de rendimento dos atletas, que não vão conseguir responder às expectativas exigidas pelo campeonato. É desumano voltar com uma semana, por exemplo”, garante Robert.

Negrette entende que os goleiros precisam de um mês, ao menos, para retomar valências específicas da função (Foto: Arthur Abrahão/Tupi FC)

Readaptação dos goleiros requer mais tempo

No caso dos goleiros, há ainda os treinamentos específicos para que recuperem diversas características essenciais em sua função, como destaca à Tribuna o preparador dos arqueiros do Tupi, Negrette Silva.

“Primeiro tem a parte física, a qualidade cai muito. Às vezes o atleta não tem condições de manter a forma em casa. E a técnica, que não dá para fazer aqueles trabalhos diários que são realizados no clube, principalmente com bola, de queda, velocidade de reação, saída de gol e tomada de decisão. Isso que vai dificultar bastante e vai afetar muito o rendimento dos goleiros. E tem a parte tática, que é mais do treinador, e geral do elenco. Quando voltar, tem que ser devagar, com a readaptação de movimento, a parte técnica, o trabalho de fortalecimento do core, muscular e a prevenção de lesão”, esmiuça o profissional.

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Ainda conforme o ponto de vista de Negrette, que trabalha tanto com atletas amadores como profissionais em sua carreira, no futebol e futsal, “são necessários de 40 a 45 dias de preparação porque estamos todo esse período parados. Precisamos de uma outra pré-temporada para fazer ajustes de movimento, trabalhar a parte de resistência, de força, melhorar o condicionamento físico na questão aeróbica e anaeróbica. Isso depende do que o clube vai nos oferecer até o reinício da competição. Ainda não sabemos quando volta e quanto tempo teremos. Sem contar as indefinições do elenco, mas pode ser que alguns atletas continuem”, relata, lembrando que a Federação Mineira de Futebol, até o fechamento desta edição, se posicionou apenas em relação ao retorno da primeira divisão do Campeonato Mineiro, disputada pelo Tupynambás. No caso do Módulo II, onde o Galo Carijó se encontra nesta temporada, ainda não há uma projeção de retorno.

Enquanto este hiato de treinos e jogos se estende no ano, também é fundamental continuar as conversas com os atletas para entender como cada um tem lidado com a distância dos gramados. “Tenho mantido contato praticamente diário com os goleiros, apesar das incertezas, como se os três permanecerão no Tupi. Estão todos fazendo um trabalho em casa. O Rafael, por exemplo, que é de São Paulo, tem um amigo preparador de goleiros que o ajuda, então deixo eles bem à vontade. O Diego e o Vinícius também mantêm o trabalho. Temos que esperar o retorno para ver o nível de cada um para voltar com tudo. É esperar essa pandemia passar primeiro”, opina Negrette.

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