Flamenguistas de JF e região que acompanharam o time em Lima relembram histórias

De primeiro torcedor no Estádio a pedido de casamento: confira cinco relatos dos rubro-negros


Por Bruno Kaehler

01/12/2019 às 07h00- Atualizada 01/12/2019 às 10h04

O dia 23 de novembro de 2019 está marcado na memória de milhões de rubro-negros espalhados por todo o mundo – e que agora desejam o mundo. O título do Flamengo da Copa Libertadores, com virada sobre o River Plate no final da partida, em um espaço de apenas três minutos entre os dois gols de Gabriel Barbosa, jamais será esquecido pelos torcedores do clube – sobretudo os que vivenciaram, in loco, cada minuto da decisão mais aguardada do clube carioca nos últimos 38 anos.

De viagem e torcida com a família, lembranças do pai e do filho nas comemorações, concentração com torcedores em ruas desconhecidas e até pedido de casamento, a Tribuna conversou com fervorosos flamenguistas de Juiz de Fora e Conceição de Ibitipoca que relataram histórias durante os dias de estadia na capital do Peru, que sediou o evento futebolístico mais importante do continente na temporada. Confira os relatos dos torcedores:

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Família em peso e primeiro no Estádio

(Foto: Arquivo Pessoal)

De Conceição de Ibitipoca, Jhon, Adelvo, Adalto, Luciane e Ângelo Carelli partiram rumo ao Peru, com chegada quatro dias antes da decisão. Proprietária do Hotel Alpha Ville Chalés, do Distrito de Lima Duarte, a família Carelli acompanhou, pessoalmente, o crescimento do número de flamenguistas em Lima. “Quando chegamos não havia muitos. Com o passar dos dias, a movimentação foi aumentando, e a cidade foi ficando vermelha e preta!”, conta Adelvo, em contato com a Tribuna ainda quando estava fora do país.

“Parece exagero, mas a nação literalmente invadiu Lima. A partir de quinta-feira (21), era possível encontrar flamenguistas a todo instante. Brincamos que haviam mais flamenguistas que peruanos nos arredores de Miraflores e Barranco (distritos locais)”, complementa o rubro-negro.

Ainda antes do duelo, um vídeo de flamenguistas recebendo autógrafos do técnico Jorge Jesus viralizou na internet. Era a família Carelli, que por meio de uma gambiarra, conseguiu a atenção do Mister. E mais: no dia do jogo, foram para o estádio às 7h30 do horário local, quase três horas antes da abertura dos portões e quase oito horas antes do início da partida. O resultado também foi registrado em vídeo.

“O Jhon foi o primeiro torcedor a entrar no Estádio! Entramos às 10h15, sendo que o jogo só começaria às 15h do horário local. O estádio fica perto de umas ruínas de pedra. Lembra muito uma pedreira, só que no deserto. Apesar de cansativa essa espera, cantávamos a todo o tempo”, relata Adelvo.

Dos 19 jogos da Série A, mais cinco da Libertadores já assistidos de perto pela família, certamente nenhum emocionou mais do que o duelo em Lima. “A experiência que vivemos aqui foi única. Jamais vivida em nenhum dos jogos que fomos. O gol do River foi como um balde de água fria, pensamos em toda a nossa trajetória até chegar ali. Mas havia esperança. O tempo voava. E como Galvão Bueno diz, ‘haja coração.’ Na virada… o que foi aquilo? Não estávamos acreditando. Nosso sonho se tornava realidade. Gritamos, pulamos, agradecemos a Deus. Choramos. Recebíamos abraços de pessoas que nunca havíamos visto, flamenguistas que compartilharam todos os tipos de emoção durante o jogo conosco”, relembra.

Emoção por três gerações

(Foto: Arquivo Pessoal)

O economista Alexandre Leal, juiz-forano, é rubro-negro, principalmente por influência de Fred Leal, seu pai. A magnética cresceu, ainda, com o filho de Alexandre, Arthur Leal, de apenas 6 anos e com um nome escolhido em homenagem ao camisa 10 do time campeão da Libertadores de 1981, Arthur Antunes Coimbra – o Zico.

Aos 34 anos, Alexandre esperava vivenciar de perto as histórias contadas pelo pai. Comprou a passagem para o Chile, antes da mudança de local pela crise vivida no país. “Ainda não tive o estorno da primeira compra”, pontua, como detalhe perto das emoções que viveu. “Saí de JF na segunda-feira e cheguei ao Peru na terça à noite. Dormi no Aeroporto de Guarulhos mesmo, peguei ônibus que consegui pelo Facebook para o estádio.

No Monumental de Lima, “veio a emoção à flor da pele. O gol dos caras trouxe uma aflição, uma tensão, mas depois veio a recompensa. Indescritível, sensacional.” E justamente as imagens do pai, Fred, e do filho, Arhur, vieram na cabeça de Alexandre no auge de sua trajetória como torcedor rubro-negro.

“Meu pai faleceu há cinco anos. E ele me fez ser rubro-negro, sempre contava as histórias do time de Zico e cia. Então nesses momentos marcantes eles sempre vêm em minha cabeça. E meu filho, por ainda ter 6 anos, e já estar tendo o prazer do seu time ser campeão brasileiro e da Libertadores… queria que ambos estivessem lá nesse momento”, explica o juiz-forano.

Na saída do palco da final, a festa seguiu “em um guincho com umas 50 pessoas, com policiais e o povo peruano parando para filmar e tirar fotos.” Questionado se pensou em ir ao Mundial, contudo, outra familiar foi mencionada, em brincadeira. “Pensar eu até penso em ir, mas aí a patroa não vai liberar (risos). E tem a questão financeira também!”

Títulos, trocadilhos e casamento

(Foto: Arquivo Pessoal)

Rubens Muller deixou o país decidido a não apenas ver a história acontecer, como também escrever um dos capítulos mais importantes de sua vida pessoal. O designer gráfico juiz-forano, 24, que se disse acostumado com decepções rubro-negras desde 2014 na competição continental, ganhou confiança, jogo a jogo, no sucesso flamenguista. Nem mesmo as horas de espera no telefone o fizeram ficar no Brasil e seguir o plano B de organizar um churrasco no dia da decisão.

“Quando o Flamengo ganhou do Inter, o primeiro jogo, eu já comprei a passagem pra final. O ingresso foi o menor dos problemas, a Conmebol estornou todo mundo e quem quisesse comprar de novo tinha prioridade, aí foi tranquilo. A luta mesmo foi pra trocar a passagem. Foi a semana inteira ligando pra Latam. Na sexta-feira eu cheguei a ligar 27 vezes e não trocaram. Quando eu já tinha desistido, um amigo me passou um macete: você tinha que ligar para lá, apertar 8, colocar o código de registro e apertar asterisco. Caiu direto no canal de trocas, tive que ficar esperando ‘só’ uma hora e meia ouvindo a musiquinha para o atendente fazer a troca. Mas no final deu tudo certo”, conta.

No Peru, Rubens passou a publicar postagens em seu Instagram com trocadilhos com o nome do país – entrando na brincadeira de amigos e aproveitando experiências em pontos turísticos locais.

A estadia em Lima começou com a namorada Lara Ribeiro, na quarta, e terminou com a noiva, domingo. “Pedi ela em casamento! Foi lá em Lima mesmo, mas não foi no estádio, e sim no hotel. Eu levei o Nintendo Switch e montei uma fase para ela no Mario Maker. Difícil pra caramba e que no final tinha a mensagem. Ela nem esperava, porque a gente joga Mário direto, nem percebeu!”, descreve Rubens.

No dia do jogo, o nervosismo só aumentava. “Fomos entrar no estádio lá pelas 11h, ficamos esperando no sol, sem protetor, sem óculos e sem cerveja, para aumentar ainda mais a ansiedade (risos). Mas o jogo valeu a pena, foi o momento mais épico da minha vida! A torcida no segundo tempo empurrou o time, cantando demais, os argentinos não entenderam nada! E no final a gente tinha que ser campeão. Depois de tantos anos de decepção, esse é nosso! Se não é sofrido, não é Flamengo!”

Se os custos impedem a ida ao Mundial, no Catar, Rubens já planeja nova viagem. “Como o Flamengo já está classificado para o Mundial de 2021, na China, esse eu já estou planejando para ir. Tem mais tempo e dá pra juntar o dinheiro.”

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‘Será que é verdade?’

(Foto: Arquivo Pessoal)

A guia de turismo Thaís de Oliveira Campos, 23 anos, integrou quarteto de amigos flamenguistas durante três dias em Lima. A viagem, para a rubro-negra, quase foi cancelada em cima da hora.

“Tive problema dois dias antes. Tinha comprado a passagem há duas semanas e veio um colega meu dizer que havia conseguido também. E perguntou qual seria a minha escala. Aí eu disse que na ida teria Panamá, e na volta, Bolívia. Ele me disse, então, que havia comprado com escala para o Panamá, mas que o passaporte não havia ficado pronto. Aí eu falei: ‘Danou-se’. Porque não tinha passaporte e precisava pelo Panamá ser da América Central. Entrei em desespero. Liguei para a empresa, que disse que não tinha mais voos. Todos estavam fugindo do Panamá. Tive que comprar outro voo, com escala em Santiago na ida. E aproveitei a volta do voo que tinha comprado”, relembra Thaís.

Com o desembarque em Lima, a atmosfera detectada era similar à que ela se acostumou nos jogos com mando de campo rubro-negro. “Parecia o Rio de Janeiro, não senti muita diferença do Bar dos Chicos, das concentrações no Maracanã. O clima era de confiança total. Respeitando o adversário, mas com confiança. Esperamos tanto tempo para chegar nesse nível e não pensávamos em perder”, analisou.

Desde a concentração de torcedores no Shopping Larcomar, até a comemoração do título, o comportamento dos nativos chamou a atenção da flamenguista.

“Achei bacana a aceitação dos peruanos com aquele clima. Até porque foi do nada, não seria em Lima, mas em Santiago, e muitos não entenderam muito bem… acho que não eram tão ligados ao futebol. Não estão ainda no mesmo nível que o nosso e acho que ficaram assustados e felizes ao mesmo tempo. E depois da festa de Barranco (distrito local), vendo a quantidade de flamenguistas, e do jogo, paravam a gente na rua para perguntar tudo. Diziam que ficaram surpresos com a virada em três minutos e procuravam saber o que estava acontecendo. Tinha peruano no nosso ônibus, porque a Prefeitura de Lima disponibilizou 12 ônibus para a gente ir ao Estádio. Todos pediam pra tirar foto com a gente, parecíamos famosos”, recorda.

Com a virada e o título inesquecíveis, Thaís e a maioria dos flamenguistas, segundo ela, só foi dimensionar o tamanho do acontecimento que vivenciou momentos após o troféu ser levantado, já fora do estádio. “Ninguém acreditava no que tinha acontecido. Era uma choradeira danada. Demorou bastante para cair a ficha. Sentamos em um lugarzinho depois do jogo e paramos para perguntar: ‘Será que é verdade?!’

Rumo ao Mundial!

(Foto: Arquivo Pessoal)

O juiz-forano Artur Villela vivenciou intensamente cada minuto em Lima. Desde quarta-feira pela manhã na capital peruana, o empresário de 37 anos participou de caminhada com centenas de flamenguistas até o hotel onde a delegação da equipe carioca se hospedaria. Conseguiu, ainda, entrar no prédio e registrar a chegada dos atletas em vídeo.

“Na quarta-feira saímos em um grupo grande de uma rua onde os flamenguistas se concentraram, a pé, rumo ao hotel do Flamengo. Foi bem legal como passeio, ir parando a cidade uma rua de cada vez. E acabou sendo ainda mais especial porque consegui entrar no hotel com um amigo, através do restaurante anexo. Ficamos por horas lá, cumprimentamos todos os jogadores na chegada, conversamos com o Marcos Braz (vice de futebol do Flamengo). Foi um dia para nunca mais esquecer”, detalha Artur.

O rubro-negro, após ver reportagem do Olé informando que o caminho até o Estádio prometia ser caótico, optou por chegar no Estádio Monumental seis horas antes do apito inicial. “Foi um dia bastante exaustivo por conta do calor, sol e tensão. Mas o final fez tudo valer a pena”, destaca.

As emoções in loco de Artur certamente não têm data para terminar. Isto porque o apaixonado pelo Clube de Regatas Flamengo, que também acompanhou o time nos jogos em Porto Alegre, contra a dupla Grenal, além das partidas no Maracanã pela Libertadores, estará no Catar para a disputa do não menos sonhado Mundial de Clubes.

“Já pensava antes mesmo da final. Passagem, hotéis e ingressos já estão comprados e reservados desde novembro. Saio dia 13 do Brasil rumo a Doha, fazendo escala no Marrocos”, revela Artur.

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