Criação de empregos pode indicar novo momento econômico em JF

Cidade registrou 634 novos postos de trabalho no primeiro trimestre; economista prega cautela ao observar os dados


Por Renato Salles

29/05/2022 às 07h00

Na última quarta-feira, Juiz de Fora recebeu o anúncio da instalação na cidade de duas fábricas da multinacional Ardagh Group. A perspectiva é de que cerca de 680 empregos diretos sejam criados até 2024, com as primeiras oportunidades surgindo ainda este ano. Outra novidade aconteceu neste sábado (28), quando a Prefeitura realizou o primeiro mutirão de empregabilidade de Juiz de Fora, o “GerAÇÃO JF – Emprego, Renda e Negócios”, que disponibilizou cerca de 800 vagas para os interessados em ingressar no mercado de trabalho. As duas boas notícias acontecem às vésperas do aniversário da cidade, que completa 172 anos na próxima terça-feira, 31 de maio, quando o município, de certa forma, poderá comemorar um momento importante no que diz respeito à empregabilidade, após momentos difíceis trazidos pela pandemia da Covid-19.

O ano de 2020, o primeiro da pandemia, que impôs uma série de restrições em todo o país a partir de março, foi o mais duro em termo de empregabilidade na cidade. Naquele ano, conforme dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) do Ministério da Economia, foram computadas em Juiz de Fora 44.195 admissões. Contudo, o registro de 49.424 desligamentos resultou em um saldo negativo de 5.229 postos de trabalho em Juiz de Fora. O cenário se inverteu em 2021, quando foram contabilizadas 57.417 admissões e 51.168 desligamentos, resultando no saldo positivo de 6.249 empregos formais na cidade. Esta curva se manteve nos três primeiros meses deste ano, quando o balanço foi positivo segundo o Caged.

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Entre janeiro e março deste ano, foram registradas 15.899 contratações e 15.265 demissões, o que implica saldo positivo de 634 novos postos de trabalho em Juiz de Fora criados em 2022. Em março, por exemplo, a cidade computou 5.406 contratações e 5.227 demissões, conforme o levantamento do Caged. O comércio foi o setor que teve a melhor performance, com a criação de 284 empregos de carteira assinada. Os serviços abriram 183 vagas, enquanto a construção civil criou 78. Por outro lado, o setor da indústria teve saldo negativo de 352 postos, e a agropecuária perdeu 14 vagas.

Economista e professor da Faculdade de Economia da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), Fernando Perobelli classifica o atual cenário como positivo, contudo, prega cautela. “Estamos vindo de dois anos de muita restrição. Mas, em um primeiro momento, estes são pontos positivos no sentido de que, ainda no início do ano, já observamos esse cenário de maior empregabilidade. Mas sempre olhamos estes números com cautela, pois ainda estamos saindo de um período recessivo muito grande”, pontua o especialista. Para Perobelli, a característica dos resultados de março, em que foi registrada a criação de novos postos nos setores de comércio e serviço, também é vista como algo positivo, dado o perfil econômico da cidade.

“Os setores que apresentaram maior recuperação foram os mais tradicionais do município, como comércio, construção e serviços. O que é positivo, porque comércio e serviços são muito sensíveis à crise. Há uma instabilidade e uma volatilidade muito grandes. Assim, nosso olhar deve ser de cautela, mas também de positividade. Isso porque setores que têm uma grande volatilidade na sua demanda e, portanto, em sua empregabilidade, têm mostrado recuperação”, afirma Perobelli. Da mesma forma, o economista destaca que a construção civil não apresentou perdas significativas no período da pandemia, o que sinaliza perspectivas de perenidade do investimento e de disponibilidade do crescimento, o que resulta na geração de empregos.

Empregos públicos

Outra situação que pode trazer impactos positivos para a empregabilidade e a economia local é a oferta de oportunidades no serviço público. Em janeiro deste ano, matéria publicada pela Tribuna mostrou a existência de vários concursos públicos em andamento com oportunidades que, juntas, somam cerca de 1,2 mil vagas na cidade e na região. Entre as instituições públicas locais, há seleções em aberto para a Prefeitura de Juiz de Fora, para o preenchimento de 630 vagas na rede municipal de educação, além de oportunidades na Cesama, na Câmara Municipal e na UFJF. “Juiz de Fora é um município em que o setor público tem uma participação importante, e essa expansão também traz efeitos positivos”, avalia o economista Fernando Perobelli.

Milhares de pessoas procuraram o mutirão de empregabilidade realizado no sábado, no Parque Halfeld, para conseguir uma oportunidade; foram oferecidas cerca de 800 vagas por 20 empresas (Foto: Fernando Priamo)

Para economista, desempenho local reflete tendência nacional

O economista Fernando Perobelli ainda considerou que o desempenho na criação de emprego nos setores de comércio e serviços está em linha com as peculiaridades econômicas de Juiz de Fora. “Nós somos uma cidade onde o comércio e o serviço têm uma participação muito importante no PIB. Assim, essa recuperação está em linha com as características do município. Olhando os dados por setores, percebemos que, apesar de estarmos saindo de uma recessão, este é um momento de recuperação que não é marcado por sazonalidades. Esse período em que estamos agora é de baixa para o setor do comércio, por exemplo”, explica o economista.

Para Fernando Perobelli, resguardando as características específicas do município, a recuperação de postos de emprego em Juiz de Fora, indicada pelo Caged, segue tendência nacional. Exatamente por isso, o economista pontua uma vez mais a necessidade de se observar os números com cautela. “O cenário macroeconômico ainda é de muita instabilidade. Estamos com um processo inflacionário muito alto se comparado à série histórica dos últimos anos. Também temos uma instabilidade política que se coloca neste momento e ainda temos uma instabilidade não mais pandêmica, mas endêmica no que se refere a Covid-19 e cenário internacional de retomada de crescimento”, considera o economista.

Chegada de multinacional impacta diversos setores

Realizado na última quarta-feira, o anúncio da chegada da multinacional Ardagh Group a Juiz de Fora foi marcado por pompas e contou com a presença de representantes da empresa, do governador Romeu Zema (Novo) e da prefeita Margarida Salomão (PT). Na ocasião, o secretário adjunto de Desenvolvimento Econômico do Governo de Minas Gerais, Fernando Passaglio, avaliou que a instalação das fábricas da Ardagh Metal Packaging (AMP), que fabrica latas de alumínio, e a Ardagh Glass Packaging (AGP), que produz embalagens de vidro, em terreno às margens da BR-040, terá impactos maiores para o município do que a chegada da montadora Mercedes-Benz, no final da década de 1990.

“Para se ter uma ideia, a fábrica da Mercedes, lá atrás, trouxe R$ 400 milhões. Atualmente, esses valores correspondem a R$ 1,9 bilhão. Esse anúncio trata da primeira fase de um investimento de R$ 1,4 bilhão e que, com a fase dois, vai chegar a R$ 2,5 bilhões. Ou seja, estamos falando de um investimento superior ao da Mercedes”, afirmou Passaglio. A pedido da Tribuna, o Laboratório de Análises Regionais e Territoriais da Faculdade de Economia da UFJF realizou um estudo para avaliar os impactos da chegada da Ardagh a Juiz de Fora. Para a avaliação, foi utilizada uma metodologia de análise sistêmica (insumo-produto).

Segundo o laboratório, “para cada R$1 mil de gastos no setor de fabricação de produtos de metal, no qual a unidade da Ardagh Group de latas de bebida está inserida, são gerados R$ 1.990 adicionais na economia brasileira e R$ 1.240 na economia de Juiz de Fora”. “De outra maneira, o município de Juiz de Fora tem o potencial de internalizar cerca de 62% desses gastos”, diz o estudo. Da mesma forma, no caso da fábrica de vidro, a análise afirma que, para cada R$ 1 mil gastos, “são gerados R$ 2.113 adicionais na economia brasileira e R$1.136 na economia de Juiz de Fora”. Assim, o município “tem o potencial de internalizar cerca de 54% desses gastos” Nos dois casos, a análise afirma que é “importante salientar que isso se refere às despesas típicas do setor e os efeitos indiretos na cadeia de valor associada”.

“Tomando por base a intenção de investimento da Ardagh Group de R$ 2,5 bilhões, a distribuição dos potenciais impactos de tal investimento nos setores produtivos localizados no município seria de 0,4% na agropecuária; de 46,56% na indústria; 0,26% na construção; 19,81% no comércio; 12,07% no transporte; e 19,34% nos serviços; entre outros”, diz o estudo.

Capacidade de encadeamento e efeitos multiplicadores

Ante aos números, o economista Fernando Perobelli considera que, quanto maior for a integração entre as atividades desenvolvidas pelas fábricas da Ardagh e os demais setores produtivos de Juiz de Fora, maiores serão os efeitos multiplicadores trazidos pela multinacional. “Muito provavelmente, a integração vai ser muito grande, o que vai potencializar o efeito multiplicador, impactando até a empregabilidade e a geração de renda dos outros setores.”
O economista aponta ainda que os primeiros reflexos já poderão ser percebidos em breve. Serão várias fases. A primeira é a fase de instalação, que vai empregar, por exemplo, mão de obra da construção civil em um primeiro encadeamento”, avalia Perobelli, que externa a expectativa de que esses encadeamentos atinjam os demais setores à medida que o projeto de instalação das duas fábricas da Ardagh se consolide.

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Secretário de Desenvolvimento Sustentável e Inclusivo, da Inovação e Competitividade, Ignacio Delgado afirma que os trabalhos da Prefeitura estão voltados, exatamente, para fomentar o encadeamento entre os investimentos e todos os setores da economia local, com foco em aspectos tecnológicos e sustentáveis.

“A Ardagh, por exemplo, é uma indústria que fabrica latas e garrafas. Mas muita gente não sabe que Juiz de Fora tem 63% das jazidas de alumínio do Estado de Minas Gerais. Outro aspecto é que apenas uma empresa no Brasil produz a lâmina lata. Assim, nosso próximo passo é trabalhar para trazer uma outra empresa que esteja nesse elo da cadeia. Por outro lado, a Ardagh vai nos ajudar, porque ela pode ter clientes locais aqui, uma vez que somos polo cervejeiro. Estamos desenvolvendo uma política de desenvolvimento que fortaleça os setores tradicionais, por isso criamos os arranjos produtivos locais (APL) da indústria têxtil confeccionista e da cerveja artesanal e vamos fazer os APLs do queijo e laticínio e da saúde”, explica Ignacio.

O secretário reforça que iniciativas como os APLs fomentam uma maior integração entre fornecedores locais e instituições de pesquisa e atividade produtiva. “Se você faz essa integração, a renda geral cresce e aqueles setores que predominam na cidade vão dispor de uma demanda também maior para crescerem juntos.”

Mutirão atrai juiz-foranos em busca de oportunidades

O primeiro mutirão de empregabilidade de Juiz de Fora aconteceu neste sábado, com a realização de várias ações no Parque Halfeld. A iniciativa ofereceu oportunidades de emprego, capacitação, orientações e informações sobre geração de renda, seja por meio do mercado de trabalho formal, empreendedorismo ou autogestão e organização coletiva do trabalho. Até a última quinta-feira, já havia 725 vagas cadastradas, além de oportunidades de inserção em bancos de talento oferecidas por cerca de 15 empresas e entidades representativas. Secretário de Desenvolvimento Sustentável e Inclusivo, da Inovação e Competitividade, Ignacio Delgado afirma que o mutirão é um detalhamento do programa Vagou JF, criado pela Prefeitura em março para a divulgação de vagas em aberto na cidade.

“O mutirão é uma iniciativa com o propósito de fazer o encontro entre as empresas da cidade que têm vagas a ofertar e, frequentemente, têm dificuldade de localizar pessoas habilitadas para aquelas funções, e os trabalhadores em busca de uma oportunidade. Nós procuramos empresas de todos os setores de Juiz de Fora e elas nos apresentaram as suas necessidades, especificando, inclusive, as funções de que necessitam. Divulgamos as vagas disponíveis para que as pessoas pudessem preparar seus currículos para participarem deste mutirão”, afirma Ignacio.

A atividade também está atrelada às comemorações dos 172 anos de Juiz de Fora. “Provavelmente, faremos outros mutirões. Mas esse tem um elemento simbólico específico, porque faz parte da programação do aniversário de Juiz de Fora”, explica o secretário. Participaram das atividades a Gerência Regional do Trabalho, do Ministério do Trabalho, que fez orientações sobre carteira de trabalho e direitos dos trabalhadores; e o Centro de Referência da Assistência Social (Cras), da Secretaria de Assistência Social, que realizou o encaminhamento para serviços, programas e benefícios sociais e documentação civil.

Também foram feitos cadastro e divulgação de cursos gratuitos pelo Senac e Instituto Mix (Fort Educação). O Senai apresentou novas tecnologias e tendências utilizadas na indústria. “Simultaneamente, desenvolvemos uma grande programação de atividades de capacitação, dirigida não só aos trabalhadores mas também a cooperativas e associações”, explica Ignacio.

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