Impactado pela pandemia, mercado de trabalho paga 9% menos a trabalhador mineiro
Pesquisa compara salário médio do segundo trimestre de 2020 com o mesmo período deste ano
O salário médio do trabalhador mineiro reduziu 9% nos últimos dois anos. O dado é do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e compara o segundo trimestre de 2022 com o mesmo período de 2020, época em que o Estado sofria com as primeiras restrições por conta da pandemia da Covid-19. A pesquisa leva em consideração o rendimento médio real de pessoas com 14 anos ou mais, empregadas formalmente. Em 2020, o salário médio em Minas Gerais era R$ 2.474, já em 2022, esse valor foi reduzido para R$ 2.251.
Não há dados que forneçam esses números em âmbito municipal, porém, segundo o economista do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), Thiago Rodarte, a pesquisa aponta um fenômeno geral do mercado. “Mesmo sem saber o que está acontecendo em Juiz de Fora, pelo que observamos no estado, podemos dizer que há uma queda média do salário.”
Ele ainda afirma que os valores são enviesados para cima, devido a salários maiores que o funcionalismo público recebe. “A pesquisa trata, exclusivamente, de trabalhadores que possuem algum vínculo formal de empregabilidade, não abarca os trabalhadores informais, que, nesses últimos dois anos, foram os que mais cresceram no país como um todo, principalmente por conta da perda de postos durante a pandemia da Covid-19.”
O salário dos trabalhadores por conta própria, que, segundo Rodarte, mais se aproximam do trabalhador informal, caiu cerca de 3%. Em 2020, o salário médio dessa parcela era R$ 1.915. Em 2022, passou para R$ 1.857. “Isso aconteceu também com outros grupos de trabalhadores, como o doméstico sem carteira, que está ganhando 7% a menos do que em 2020. O empregador também está ganhando 6% a menos do que ganhava em 2020.”
Entidades sindicais lutam por reajuste do piso
A reportagem entrou em contato com algumas entidades sindicais e constatou que a média salarial de trabalhadores rurais, metalúrgicos e do comércio fica na faixa de 1,5 salários. No entanto, esse valor, conforme apontam as categorias, pode ser acrescido de benefícios que não estão contemplados na média. Os salários médios apurados junto às entidades de classe são: trabalhador rural, R$ 1.500; comércio, R$ 1.340,85 e metalúrgicos, R$ 1.800.
De acordo com os líderes sindicais que conversaram com a reportagem, os acordos por reajuste salarial têm como objetivo tornar a remuneração mais justa para cada classe, no entanto, a pressão inflacionária corrói os ganhos do trabalhador. No caso do trabalhador rural, o impacto da pandemia é destacado. O presidente do Sindicato Rural, Domingos Frederico, afirma que o salário que a categoria recebe em Juiz de Fora é superior ao observado em outras localidades da região. “Por menos de 1,5 salário você não contrata um trabalhador braçal mais. Hoje, para você ter um bom empregado, é preciso ter uma boa remuneração, porque, além do salário, ele recebe moradia e luz elétrica, além de parte da produção, como no caso dos produtores de leite, por exemplo.”
O comércio foi um dos setores mais afetados nos últimos dois anos, exatamente o período mais crítico da pandemia. Em 2022, gradualmente, as contratações voltam a acontecer, porém o grande número de trabalhadores informais ainda é uma realidade nesse setor. O presidente do Sindicato dos Empregados no Comércio de Juiz de Fora (Sindicomércio), Silas Batista da Silva, afirma que, em comparação a 2019, o salário médio de admissão da classe caiu. “O poder de compra reduziu. Pode-se dizer que o trabalhador perdeu cerca de 3% a 4% nos últimos anos. Tanto porque o salário está menor, mais próximo do piso, quanto por conta do aumento no valor dos serviços básicos.”
O Sindicato dos Metalúrgicos também observou uma diminuição do salário médio nos últimos anos. Isso porque, segundo o presidente João César da Silva, houve uma diminuição do valor de contratação. “Os trabalhadores foram demitidos na pandemia e estão sendo contratados com salários iniciais mais baixos. Isso colabora para uma diminuição do salário médio.” Ele afirma que, assim como em qualquer classe, entre os metalúrgicos há uma disparidade entre os vencimentos. “Nas três maiores empresas da cidade, o trabalhador recebe bem, mas nas médias e pequenas, o salário tem sido cada vez mais reduzido.”
O professor da Faculdade de Economia da Universidade Federal de Juiz de Fora, Ricardo da Silva Freguglia, explica que isso ocorre, porque vivemos um momento no qual há uma grande quantidade de pessoas desempregadas, ou no trabalho informal, à procura de um emprego estável. “O período de recessão econômica fez com que as empresas reduzissem custos. Para isso, elas podem demitir ou deixar de contratar novos trabalhadores. O custo da demissão é elevado, por isso as firmas deixam de contratar ou reduzem o salário de admissão.”
De acordo com ele, o salário mínimo não conta com ganho real nos últimos anos. “Como a maioria dos trabalhadores brasileiros tem salários atrelados ao valor do mínimo, há uma diminuição do poder de compra da parcela da população que detém os menores rendimentos. Isso pode contribuir para o aumento da desigualdade salarial no país, fato que já tem sido constatado em pesquisas recentes.”
Salário mínimo ideal deveria ser de R$ 6,3 mil
Conforme cálculos do Dieese, o salário mínimo ideal, em agosto de 2022, deveria ter sido de R$ 6.388,55. A pesquisa leva em conta gastos básicos que a Constituição de 1988 estipula como direitos universais de todo cidadão. Dentre eles, alimentação, moradia, saúde, vestuário, higiene, educação, transporte, previdência e lazer.
O economista do Dieese, Thiago Rodarte, afirma que o cálculo supõe uma família de quatro pessoas, dois adultos e duas crianças, e que esse valor representa, em média, 35,7% daquilo que a família teria que gastar com o que precisa. “Ou seja, a renda média não é suficiente para suprir as necessidades. Se você levar em consideração que, entre 2020 e 2022 tivemos uma inflação em torno de 20%, o poder de compra é muito reduzido.”
Ele cita uma pesquisa sobre rendimento familiar, de 2018, do IBGE. Na época, o percentual da renda destinado para serviços essenciais chegava a 64%. “Considerando alimentação, educação, transporte e saúde, nos últimos anos, esses itens tiveram uma inflação muito alta. Nos últimos 12 meses, a alimentação aumentou quase 15%, transporte, quase 13% e saúde, 7,5%. Já a habitação aumentou um pouco menos, 4,4%, mas ainda apresentou elevação.”