Associação de Belas Artes Antônio Parreiras inaugura mostra e clama por visibilidade

Para ver e ser visto: Associação de Belas Artes Antônio Parreiras inaugura sua primeira exposição virtual, abre espaço para visitação e pede socorro ao Poder Público para não fechar as portas


Por Mauro Morais

26/11/2020 às 11h43

Prédio na Praça da Estação serve de espaço para aulas e exposições, além de preservar importante acervo sobre a arte juiz-forana nos séculos XX e XXI. (Foto: Fernando Priamo)

Há cerca de nove meses fechado, o prédio da Associação de Belas Artes Antônio Parreiras abre as portas nesta sexta-feira (27), para a exposição “Primeiro Panorama das Artes de Juiz de Fora”, primeira iniciativa que a instituição leva para o ambiente on-line. Ainda que receba visitações durante as tardes da semana, das 13h às 17h, a mostra será derivada para as redes sociais da entidade: Instagram, Facebook e YouTube. Manter as portas abertas, no entanto, é o grande desafio da Antônio Parreiras, que, fundada em 1934, enfrentava graves problemas financeiros quando comemorou 85 anos, ano passado. A pandemia, no entanto, foi golpe duríssimo para a instituição com sede no prédio da estação ferroviária, bem diante da Praça da Estação.

“Este ano nós tivemos aulas no início de fevereiro e logo parou. O pouco dinheiro que tinha já foi embora. Sem alunos, sem dinheiro”, diz a presidente da casa, a artista plástica Irene Barros Costa, que esteve no cargo entre os anos 2000 e 2004 e regressou em julho passado para mais quatro anos. De acordo com a gestora, a atual crise sanitária e econômica reduziu o número de contribuições dos associados e a grande maioria dos alunos parou de pagar as mensalidades. Sem receber recursos públicos, o lugar vive da receita das aulas. Os cinco professores que ministram turmas de pintura, desenho e escultura recebem um percentual das mensalidades, e o restante é gasto com a manutenção do local e o pagamento de um único funcionário.

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“Todo trabalho lá é voluntário. Se não podemos ter um único funcionário, a única possibilidade é fechar. E acho difícil reabrir depois”, lamenta Irene, clamando por visibilidade para o espaço que é cenário de importante capítulo das artes visuais em Juiz de Fora, formando diferentes gerações de artistas na cidade. A exposição chega a tempo, segundo a presidente da associação, de colocar a instituição no debate eleitoral. “A Prefeitura precisa tomar a frente”, diz ela, apontando para o fato de nenhum dos dois candidatos ao mais importante cargo do Executivo ter demonstrado, em seus planos de governo, interesse pela continuidade da casa. “Se o próximo prefeito não tomar uma providência quando sentar-se na cadeira, a associação não dura mais um ano”, assevera.

Situação se agravou com a pandemia: Sem recursos, associação com 86 anos de história corre risco de fechar as portas. (Foto: Fernando Priamo)

Alunos idosos temem retorno
Palavra de ordem, quase desgastada, na pandemia, a reinvenção também se apresentou à Associação de Belas Artes Antônio Parreiras, mas dia a dia, mês a mês, mostrou-se cada vez mais inalcançável. As aulas, principal atividade da instituição, foram paralisadas e a perspectiva de retorno é absolutamente incerta. A esmagadora maioria dos alunos é formada por pessoas acima dos 60 anos, faixa etária considerada de risco para a Covid-19. Outro grupo, bem menor, é de adolescentes, faixa etária que apresenta o maior número entre os assintomáticos, o que propicia transmissões silenciosas. Muitos alunos temem retornar, conta a presidente Irene Barros Costa, certa de que quando isso se tornar realidade será necessário repensar a dinâmica das turmas.

No acervo: retrato de Antônio Parreiras, pintado por C. Gonçalves em 1932. (Foto: Fernando Priamo)

O número de alunos, já decrescente nos últimos anos, despencou, e Irene, assim que assumiu a gestão, começou a ligar para a casa de alguns. “Fui telefonando para as pessoas, para que voltassem a ajudar a associação. Depois de oito meses fechada, essa casa, que já é velha, precisava de muita coisa”, diz, referindo-se à necessidade de pinturas e reparos. Num retrato em nada parecido com o passado efervescente e de grande prestígio, a Antônio Parreiras encara o presente contando com a solidariedade da pequena comunidade que atende. “Quantas pessoas já passaram por ali, quantos artistas!”, exalta Irene, apontando, também, para a geração contemporânea, enfocada na exposição que entra em cartaz.

Patrimônio em risco

Registro de janeiro de 2019, quando associação já enfrentava crise financeira, pela redução, ano a ano, no número de alunos, sua única receita. (Foto: Fernando Priamo)

“Estou fazendo uma aposta nessa exposição, para que as pessoas vejam e leiam e decidam agir em prol da associação. Juiz de Fora é uma cidade com pessoas que possuem a condição de ajudar, assim como a Prefeitura”, conclama a presidente, valorizando a função terapêutica da arte, que a associação desenvolve em suas aulas, e a questão patrimonial, que o prédio e a entidade preservam. “É um prédio muito grande, com um custo muito grande. O imóvel é muito antigo, tem mais de 100 anos, e vai acabando. Precisamos da atitude do Poder Público para conservar esse prédio”, sugere, observando, ainda, o risco iminente que a casa enfrenta. Há alguns meses, o imóvel foi atingido por chamas de uma fogueira acendida por pessoas em situação de rua.

No interior do local, que se divide entre área para aulas e espaço expositivo, ficam mais de 300 obras de arte de nomes fundamentais para a arte visual juiz-forana no século XX, como Dnar Rocha e Claro de Campos. “Todo ano fazemos uma mostra de nosso acervo, que tem muita coisa boa, mas precisa de conservação também, de restauração das molduras e das próprias pinturas”, avalia Irene, chamando atenção para outro desafio da instituição. As cerca de 60 obras de técnicas distintas, entre pintura, fotografia e escultura, assinadas por 30 artistas que a Antônio Parreiras expõe a partir desta semana, são um grito de presença e também de socorro. Para Irene, são, ainda, um chamado para o Poder Público: “Não adianta a imprensa mostrar se as autoridades não querem saber”.

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