A próxima ‘Buddy Rich’ será uma mulher

Como o projeto Hi Hat Girls, que hoje completa 5 anos, pode ajudar a transformar uma geração de meninas em bateristas


Por Carime Elmor

22/09/2017 às 07h00- Atualizada 23/09/2017 às 09h16

Grupo de mulheres da Hi Hat Girls, em oficina de BH; Hoje o projeto da revista completa 5 anos. (Foto: Iana Domingos)

Hi Hat Girls” é uma revista independente e on-line, disponível na plataforma Issuu, criada por uma rede de bateristas brasileiras, que se afirmam como a primeira e única publicação sobre o tema da América Latina. As próprias garotas produzem o conteúdo da publicação que começou em setembro de 2012 – feito por bateristas, sobre bateristas e para bateristas, com a seguinte premissa:

“Não há instrumento que não possamos tocar”

Preciso começar contando que eu sou frustrada por nunca ter levado adiante minhas aulas de música, que comecei desde a adolescência. Logo no inicinho deste ano, retomou em mim uma vontade súbita e incontestável, só ouvia a bateria das músicas e a cada show ficava vidrada, principalmente, na “cozinha” das bandas. Faço aulas há alguns poucos meses e comecei a seguir a Hi Hat Girls e notar o movimento de “Oficina de bateria para garotas!”, e fui surpreendida quando as inscrições começaram em Juiz de Fora. Hellen Kelmer, baterista das bandas S/A Blues, Kelmer e Hangover, vai liderar esse encontro neste sábado (23), das 15h às 17h, no Museu Ferroviário.

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Um grupo no Facebook criado pela Julie Sousa, baterista carioca há dez anos, reuniu mulheres que ao longo do tempo foram percebendo a vontade de outras meninas em aprenderem a tocar o instrumento. “Vários motivos fazem as garotas não irem para frente com as aulas. Por exemplo, por estarem condicionadas a pensar que bateria é um instrumento de menino ou que faria barulho em casa e os pais não iriam deixar”, explica Julie, ex-baterista da banda Mortarium.

Leia a edição #5 da Hi Hat Magazine:

A última edição da “Hi Hat Girls Magazine” foi lançada em 2016, quando Julie Sousa elaborou o projeto de oficina de bateria para garotas. Ela sempre escutou e acompanhou muitas bandas de rock e metal, e ficava a vontade latente de poder tocar.

“Eu quero fazer parte, mais do que assistir”

Começou por instrumentos de corda, mas se encontrou quando sentou pela primeira vez em uma bateria, foi assim que a música fluiu. A decisão por deixar a banda foi muito por querer se dedicar integralmente às oficinas, que já vão atingir quase todas as regiões brasileiras. As primeiras edições foram no Rio, cidade onde vive, sempre gratuitas e com o interesse principal em um público de garotas que tenham o sonho de tocar bateria, mas nunca tiveram contato com o instrumento. Continua acontecendo duas vezes ao mês no MOTIM, espaço para arte e cultura independente e também em um local cedido pela prefeitura do Rio.

Julie, baterista de rock e heavy metal e organizadora da Hi Hat Girls Magazine em oficina que aconteceu no Rio, em 15 de setembro. (Foto: Fernanda Werneck)

Julie idealizou o projeto, que, para funcionar e se espalhar, é o mais descentralizado possível. Colaborativismo e união de forças de mulheres bateristas estão agitando encontros que já passaram por cidades dos estados do Rio, São Paulo, Minas, foram para Brasília e tem data em breve em Salvador e Porto Alegre. Bateristas mulheres que já dão aulas ou tenham bastante experiência com o instrumento podem assumir uma data de oficina na região onde moram e contar com o suporte da Hi Hat Girls.

Atualmente são sete líderes de oficinas: além, de Julie e Hellen, Nathalia Reinehr e Ariadne Souza ensinam em Brasília. Bya de Paula, Lorena Martins e Lary Durante são quem fazem o movimento no Rio Grande do Sul, na Bahia e em São Paulo, respectivamente. “A gente vai ver o resultado a longo prazo, de 15 meninas que participam por turma, normalmente, cinco começaram a fazer aulas e estudar bateria após a oficina”, conta Julie.

#LugarDeMulheréNaMúsica

Hellen Kelmer durante o encontro de bateristas da Hi Hat Girls que rolou em São Paulo, em julho no ano passado. (Foto: Andrezza Silva)

Hellen Kelmer explica que a intenção do encontro de sábado é quebrar o gelo das meninas com o instrumento, para perderem qualquer medo. Ela conheceu a Hi Hat Girls no ano passado em um encontro de bateristas mulheres que aconteceu em São Paulo. As oficinas, apesar de bem livres para cada instrutora, seguem um roteiro básico que conta brevemente a história do instrumento, apresenta as peças, seus nomes e funções e depois parte para exercícios e uma atividade prática, em que cada menina senta sozinha na bateria, pela primeira vez, para acompanhar uma música.

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A baterista começou a fazer aulas já adulta, rapidamente foi para os palcos e hoje está gravando o primeiro disco autoral de seu duo, Kelmer.

“O que me ajudou foi o fato de eu gostar de música desde criança, quando, inclusive, fiz quatro anos de aula de teclado. Também escolhi bons professores para me ensinar, e isso eu sempre falo que faz toda a diferença.”

A cultura do instrumento está sendo disseminada e naturalizada entre meninas desde novas, esse encorajamento vai mudar o rumo da história da música. Se Buddy Rich, um dos bateristas mais famosos do mundo, nasceu em 1917, aguardem, que um século depois pode estar nascendo a melhor baterista de todos os tempos, e ela será uma mulher.

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