Banda independente de Belém apresenta seu fuzz rock em JF

Molho Negro está viajando o Brasil inteiro, com a meta de fazer shows em todos os finais de semana de 2018. Conversamos com o vocalista e guitarrista do trio sobre a turnê, o disco “Não é nada disso que você pensou” e outras questões da música independente BR


Por Carime Elmor

20/04/2018 às 20h12- Atualizada 22/04/2018 às 23h44

Molho Negro, de Raony Pinheiro, João Lemos e Augusto Oliveira, está viajando o Brasil inteiro, com a meta de fazer shows em todos os finais de semana de 2018 (Foto: Divulgação)

Molho Negro é de uma leva de bandas nacionais independentes que querem resgatar a experiência de shows que, há um tempo, se tornaram raridade: fazer uma apresentação de puro rock’n’roll, pesado e caótico, com direito a se jogarem do palco ao público do Se Rasgum, festival de música que rola em Belém do Pará, cidade de origem do trio. Outra intenção de João Lemos, vocalista e guitarrista, com suas composições bem-humoradas, é colocar a canção como centro de suas criações.

“O fundamental é a canção. Não importa se você a toca de forma simples ou elaborada, se ela for uma grande canção, ela vai continuar sendo uma grande canção, com muitos ou poucos elementos. É nesse ponto que os Ramones tem a ver com os Beatles. As músicas eram legais, então você consegue ouvir sendo bastante rudimentais ou bem elaboradas” (João Lemos, guitarrista, vocalista e compositor)

Após serem aprovados pelo edital da Natura Musical, a Molho Negro não saiu mais da estrada. Estão viajando todas as regiões do Brasil desde o início do ano, constam nas line-ups dos principais festivais de rock independente (inclusive se apresentam no início de maio no Bananada, em Goiânia) e pretendem alcançar o público da América do Sul, realizando shows no entorno do Brasil. O último disco lançado, de maneira independente, “Não é nada disso que você pensou” é o principal repertório desta superturnê.

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Com letras irônicas, a Molho Negro debocha da classe média em “Classe média losers” e da produção e indústria musical em “Mainstream”. “Souza Cruz”, faixa-homenagem à indústria do cigarro, diz que seu “melhor amigo encontrou Jesus, enquanto ele fica dando lucro para a Souza Cruz”. A música ganhou um clipe que será divulgado no próximo mês e conta a narrativa de um cara que já se entregou a um estilo de vida sem volta (“fica claro que eu só quero ser do tipo que vai se fuder no final”), conectando muito bem com as letras pessimistas, mas tão sinceras de “Ansioso, deprimido e entediado”. Talvez a mais franca seja sobre sua própria maneira de compor: “Escrevo mal”, (“eu começo alguma frase e já vira piada, e eu sinto que isso vai acontecer mais uma vez), uma faixa auto-explicativa do porquê das letras criativas e bem humoradas.

“Eu sinto muita falta de ir para um show e me conectar com a música, com aquilo que aquele cara está falando. Talvez, a perseguição unicamente por uma estética tenha tirado um pouco a relevância do movimento. Esse fator de você se apaixonar por uma música passa muito pela comunicação, pela linguagem, pela capacidade das bandas de falarem sobre um mundo real”.

O cuidado com a identidade visual da banda está nas fotos, produção audiovisual – como em um clipe-presente editado por um amigo para “Black Rebel Marambaia Club Pt.2” – mas também no palco. João Lemos, Augusto Oliveira e Raony Pinheiro usam instrumentos de mesma cor. João Lemos tem uma Firebird (que se assemelha ao formato de uma Jaguar), aparece, às vezes, com uma guitarra White Falcon da Gretsch (semi-acústica). Em seu set de pedais, o mais marcante de seu som é um Fuzz War, para se chegar a um timbre ainda mais pesado do que um efeito de Big Muff. Raony Pinheiro utiliza um baixo Rickenbacker e um pedal Pro Co Rat, mas especificamente nesta turnê, os dois têm se apresentado com um par de instrumentos Ampeg, de corpo acrílico transparente. Augusto Oliveira utiliza um set de bateria de rock convencional, porém apenas com um surdo, sem utilizar tom. Sua caixa “Tama”, assim como seu estilo, remetem à bateria de Dave Grohl, revelando a total relação da banda com Nirvana. Querem, sobretudo, ser uma banda de rock, grunge, sem gastar em letras profundas e profundamente existenciais, e sim em um trabalho sincero e honesto (de letras e arranjos) capaz de causar uma identificação nos mais diversos tipos de pessoas.

“Eu gosto muito da reação de quando estou tocando em um show gratuito e, ao cantar o verso de uma música, o tio que vende pipoca, a criança que foi com os pais, todos eles reagem imediatamente. Eu acho importante ser democrático, se não a gente vai continuar usando a camisa do shoegaze, mas fazendo um som para a mesma bolha para o resto da vida.”

A banda lançou seus quatro discos, de 2012 até 2017, de forma independente, mas acaba de ser convidada a entrar para a Flecha Discos. Estão gravando as prés de um quinto álbum, ainda sem previsão de lançamento, mas que certamente tem como pano de fundo a sonoridade das bandas que João tem se dedicado a pesquisar e ouvir, entre elas Fidlar, Oh Sees e Ty Segall.

“Hoje um selo não é mais importante no sentido de infraestrutura, você não precisa de um selo para gravar. Como existe um avalanche de conteúdos, muita banda e muita coisa acontecendo o tempo todo, esse abraço estético que um selo proporciona ajuda a filtrar o ouvinte. Se eu gostei de cinco discos que lançaram por lá, então provável que um sexto trabalho eu vá me identificar também. Essa filtragem é a principal importância de um selo hoje”.

A banda toca neste domingo, 22, no Rise Together Festival, que acontece no estúdio Maquinaria. A partir das 17h, começam os shows da Molho Negro, Traste (Juiz de Fora), e Sleeping Scissors (Rio de Janeiro), além disso, terá flash de tatuagem, piercing e campeonato de videogame, principalmente de jogos retrô.

“O show é a única coisa que eu posso oferecer para a pessoa que ela ainda vai depender de mim completamente. Eu vou precisar estar lá, e ela também. O disco, a pessoa pode ouvir de onde quiser, ela controla a experiência, a mesma coisa com os vídeos, em tudo a banda pode ter um comportamento muito passivo, mas no show, não. A graça é tentar fazer a pessoa entrar em sua experiência. É o que faz valer a pena o cara pagar ingresso”, conclui João, dizendo que não fazem ensaio e nem mesmo um roteiro, os três já sabem o caminho das músicas e estão entregues ao inesperado de cada palco e contato com um novo público.

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Rise Together Festival
Molho Negro + Traste + Sleeping Scissors. Neste domingo (22), às 17h, no Maquinaria (Rua São Mateus 552)

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