Websérie “X semanas depois”, de Tairone Vale, inicia terceira e última temporada

Idealizado como dramatização no formato “live” no Instagram, projeto caminha para reta final e pode virar longa-metragem


Por Júlio Black

16/07/2020 às 07h00

Tairone, em sua própria casa, interpreta um personagem sem nome (Foto: Divulgação)

Quando apresentou a série “X semanas depois“, lá no início de abril, o ator Tairone Vale explicou que a proposta era criar um trabalho que misturasse dramaturgia, improviso e pandemia num período em que o isolamento e distanciamento social mudaram a vida de tantos. No caso da classe artística, tudo praticamente parou. Nesse mesmo vídeo de apresentação, a ideia clara era de misturar ficção e notícias do cotidiano em uma série transmitida ao vivo na sua conta no Instagram (@taironevale) que duraria _ imaginava ele _ até a situação voltar ao normal.

Pois não voltamos ao normal, nem ao “novo normal”, e Tairone viu que não dava para esperar o fim da pandemia para dar um fim à série, que desde o início tem sido produzida na casa do artista, em Juiz de Fora. Por isso, “X semanas depois” iniciou sua terceira e derradeira temporada esta semana, e quem perdeu os episódios anteriores pode assisti-los tanto no perfil do artista no Instagram quanto no seu canal no YouTube.

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“No início não tinha muita noção (de como seria), mesmo quando comecei a segunda temporada. Aí, da forma como as coisas foram caminhando, veio na cabeça o fim da história. Acho que a série cumpriu a função”, afirma. “Vamos resolver o que aconteceu com o protagonista (interpretado pelo próprio Tairone e que não tem nome) no desfecho da segunda temporada.”

Estruturando a série
Ainda de acordo com o ator, a proposta inicial não era dividir a série em temporadas. “Mas vi que fechou um arco nos primeiros episódios e eu estava um pouco esgotado, precisava observar o que estava fazendo; decidi então fechar a temporada, analisar e pensar no que iria acontecer dali para frente. Tive um descanso de duas semanas, e a princípio decidi fazer apenas mais uma temporada, no máximo, mas vi que não dava para encerrar ali, precisaria de uma terceira.”

 

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Primeiro dia do diário de um sobrevivente da pandemia, em algumas semanas no futuro

Uma publicação compartilhada por Tairone Vale (@taironevale) em

A estrutura básica de produção, porém, feita a partir de um telefone celular, continuou a mesma. “O que aconteceu foi que a dramaturgia ficou um pouco mais elaborada. No início, a ideia era fazer algo no estilo das lives, conversando com a câmera, e também buscava mostrar que se passava algumas semanas no futuro, imaginava um cenário mais catastrófico. O interessante é que no início alguns números foram batendo, mas com o tempo vi que essa questão fazia mais sentido para quem assistia ao vivo. Para quem acompanhava depois, essa questão perdia relevância, pois os dados já eram conhecidos. Então fui me desprendendo naturalmente.”

“‘X semanas depois’ surgiu para mostrar o cotidiano desse personagem diante da pandemia, mas as histórias paralelas foram crescendo, ganhando mais profundidade. Surgiu a necessidade de outros personagens, fazer câmera em movimento, tiroteio, e com isso os recursos tiveram que ser mais criativos para darem conta de uma série que acontece em formato de live”, analisa Tairone. Com o passar dos episódios, a produção criou tramas paralelas, com conflitos com outros personagens, mortes e até mesmo um sequestro. Outros atores toparam participar da série, como Leo Cunha, Pri Helena, Marcos Bavuso, Ana Loureiro – esposa de Tairone – e até o neurologista Leandro Cruz. O mais recente nome, que entrará na terceira temporada, é o de Suzana Nascimento.

Tairone Vale contracena, à distância, com Marcos Bavuso (Foto: Divulgação)

No cinema?
“X semana depois” chamou a atenção da diretora Lara Koer, que assistiu a alguns episódios da série e, interessada com o projeto, se ofereceu para condensar os primeiros episódios da primeira temporada. Agora, segundo Tairone, ela quer pegar todas as três temporadas e transformá-las em um longa-metragem. “A Lara ficou apaixonada pela série e sugeriu pegar a primeira temporada e transformar num longa, acrescentando alguns efeitos sonoros e visuais para quem quiser maratonar, e ficou ótimo. Decidimos fazer o mesmo para a segunda temporada, mas aí ela propôs esperarmos as três temporadas e transformá-las num longa o mais comercial possível para tentar percorrer os festivais. Afinal, o audiovisual vai demorar a voltar, está retornando aos poucos, e agora um projeto que começou sem nenhuma pretensão está com esse potencial”, anima-se.

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‘Não tem como competir com a realidade’

Se Tairone está animado com o futuro do projeto, ao mesmo tempo encara sentimentos conflitantes ao observar os caminhos tomados pelo país durante a crise do coronavírus. “Talvez a série tenha nascido com várias funções, como o impulso de criar algo artisticamente, pois pra gente é muito doido não criar, é como uma forma de desabafo em relação à falta de noção das pessoas em relação à pandemia. Ela perdeu essa função informativa entre o final da primeira temporada e o início da segunda, pois as informações já estão muito difundidas. Com o tempo passamos a nos concentrar no que está acontecendo com o personagem.”

Tairone e Bavuso produzindo uma das raras cenas externas (Foto: Divulgação)

Quando começou ‘X semanas depois’, Tairone tinha a esperança de que a população, os governos, tivessem tomado as medidas necessárias e que agora pudéssemos estar reabrindo tudo em segurança, com a curva de mortos e infectados em descendente. Porém… “Nós banalizamos a morte. Estamos com 70 mil mortos e vemos pessoas sem máscara, sem preocupação”, critica. “Tivemos a oportunidade de ver países sofrendo com a pandemia, quais estavam tomando as ações certas e erradas; tivemos exemplos do que fazer e não fazer. Mas nós, como bons brasileiros, fizemos pior do que quem fez errado. Por isso a função de alerta foi perdendo sentido para mim, estava chovendo no molhado.”

Tantas situações surreais nestes meses, como a demissão de ministros da saúde e desatinos cometidos por políticos e povo, fazem com que o ator veja a realidade como um filme-catástrofe. “Não tem como competir com a realidade. É levar uma surra da ignorância. Estamos no momento da internet com a capacidade de transmissão ilimitada de conhecimento… A lógica diz isso, mas a realidade diz que tem um monte de gente acreditando na terra plana e que a vacina faz mal, pessoas lutando contra o conhecimento. Ao ver as pessoas com essa falta de sensibilidade, decidi me concentrar no cotidiano do personagem. Agora, quando surge um fato importante, ele solta algumas alfinetadas em seus comentários, não teve como o personagem não se posicionar politicamente. Muita coisa está presa na garganta. Nem que seja num simples comentário, ela precisa sair.”

Válvula de escape
Assim como uma pequena parcela da população, Tairone tem feito o dever de casa, ficando em… casa e saindo apenas quando necessário. Para quem está acostumado a criar, a criação de “X semanas depois” tem sido fundamental para passar esses meses de isolamento e distanciamento. “De certa forma, a série salvou minha sanidade desses meses. Em todos os períodos da minha vida em que me privei do fazer artístico sofri consequências físicas e psicológicas muito notáveis, graves. Ficava muito irritado, deprimido. Preciso me expressar, criar, isso é muito nítido pra mim. Quando termino de fazer um episódio, sinto como se tivesse aberto a válvula da panela de pressão, me renovo para mais um período.”

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