“Os 7 de Chicago” relembra julgamento histórico nos EUA

Produção da Netflix tem direção de Aaron Sorkin e elenco estelar, entre eles Mark Rylance, Eddie Redmayne, Sacha Baron Cohen e Joseph Gordon-Levitt


Por Júlio Black

12/11/2020 às 07h00

Yahya Abdul-Mateen II, Ben Shenkman, Mark Rylance, Eddie Redmayne e Alex Sharp estão contra o “Sistema” em “Os 7 de Chicago” (Foto: Divulgação)

Seja nos Estados Unidos, Brasil, Venezuela, Hungria, Polônia, Belarus, o noticiário tem mostrado seus governos abusando do poder para ameaçar a democracia, a Justiça, a liberdade e os direitos de seus cidadãos. Não é raro, também, ver a Justiça deixar de ser cega para abrir pelo menos um de seus olhos por posicionamentos políticos ou preconceitos por parte daqueles que deveriam ser imparciais. Tal situação, porém, não é novidade para quem conhece a História, e o diretor e roteirista Aaron Sorkin resgata do passado um dos mais polêmicos julgamentos dos Estados Unidos no poderoso “Os 7 de Chicago”, drama histórico lançado no final de outubro na Netflix.

A história é baseada no julgamento de oito (depois sete) americanos escolhidos como bodes expiatórios pelo Governo do recém-eleito presidente americano Richard Nixon. Eles participaram, em 1968, de um protesto em Chicago contra a Guerra do Vietnã durante a Convenção do Partido Democrata para escolher seu candidato à presidência nas eleições daquele ano, que descambou para repressão e violência policial, com centenas de pessoas feridas ou presas.

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Era uma massa heterogênea, que incluía hippies, estudantes pacifistas, integrantes dos Panteras Negras e defensores de ações mais radicais, entre outros. O Governo do então presidente democrata, Lyndon Johnson, acreditava que a violência partira dos policiais, mas a nova administração – agora do republicano Nixon – queria dar um exemplo, e para isso escolheu oito figuras a fim de acusá-las de conspiração por meio de quadrilha (mesmo que muitos deles sequer se conhecessem antes dos protestos).

Depois de uma ágil apresentação de seus personagens e motivações, “Os 7 de Chicago” logo vai ao que interessa, que é o julgamento do grupo. Não queremos entregar o final do filme, mesmo que baste uma pesquisa na internet para saber a história, mas desde o início o roteiro e a direção de Sorkin deixam claro que o julgamento foi preparado para que os acusados servissem de exemplo – a começar pelo juiz, tão confuso em relação aos nomes de advogados e acusados quanto no seu explícito racismo quanto ao único negro entre os réus e no seu preconceito no que diz respeito à posição política dos demais acusados.

Aaron Sorkin tinha apenas um longa como diretor na carreira (“A grande jogada”, de 2017), mas mesmo assim demonstra excepcional talento para conduzir a história e tirar o melhor de seu elenco, que tem uma verdadeira constelação de talentos em ótimas atuações: Mark Rylance, Eddie Redmayne, Joseph Gordon-Levitt, John Carroll Lynch, Yahya Abdul-Mateen II, Alex Sharp, Jeremy Strong, Ben Shenkman, Frank Langella, Michael Keaton e, principalmente, Sacha Baron Cohen, mostrando um impressionante talento dramático para quem acreditava que ele seria um comediante de uma comédia só com o absurdo “Borat”.

O ótimo trabalho de direção, aliás, ajuda a complementar o roteiro muito bem estruturado do próprio Sorkin, lembrado por trabalhos como a série “West Wing” e filmes como “A rede social”, “O homem que mudou o jogo” e “Steve Jobs”. De “A rede social”, por exemplo, ele utiliza o recurso dos flashbacks para ajudar a situar o espectador quanto ao que está em jogo na história. Os flashbacks servem, ainda, para mostrar os protagonistas fora do tribunal e, assim, conhecê-los melhor – e ajudar o elenco a brilhar ainda mais.

Não custa relembrar: vivemos tempos difíceis, em que aqueles no poder em muitos países estão dispostos a calar as vozes discordantes, seja pela força, abuso de poder ou por meios “legais” – aquele em que a Justiça está viciada. “Os 7 de Chicago” serve para nos lembrar dos absurdos do passado e que podemos impedir que eles se repitam, mas, caso ainda seja preciso lutar contra eles, é possível derrotá-los, em nome da democracia, liberdade e Justiça.

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