Shows do carnaval de JF são interrompidos para folia terminar às 21h

Para Funalfa, é preciso flexibilidade para horário de 21h, considerado cedo. Segundo PM, é legítima orientação para desligar caixas de som


Por Mauro Morais e Renato Salles

09/02/2018 às 20h26- Atualizada 10/02/2018 às 09h50

Matheus VK, contratado para o pré-carnaval de JF, teve show interrompido a pedido da PM (Foto: Gil Velloso/ Divulgação)

Os três shows realizados entre terça (6) e quinta-feira (8) desta semana, dentro da programação oficial do carnaval, na Praça Antônio Carlos, não foram concluídos como o planejado. Terminaram antes do bis e pontualmente às 21h, conforme acordo firmado pela comissão de carnaval, que inclui diferentes setores da Prefeitura, Corpo de Bombeiros, Polícia Militar e associações de moradores. Ao custo de R$ 26 mil para o Poder Público, a apresentação do carioca Bloco Fogo & Paixão teve seu término anunciado às 20h52.

Logo que a canção foi concluída e diante dos pedidos da plateia de mais de mil pessoas, o vocalista Matheus VK anunciou: “A gente foi liberado para tocar mais uma música”. Diante da permissão da organização, a cargo da Funalfa, a Polícia Militar exigiu o imediato desligamento das caixas de som do evento. O episódio repetiu-se no espetáculo de Alessandra Crispim e Thiago Miranda, na terça (6), e do grupo de tambor Ingoma com a maranhense Rita Benneditto, que, na quarta (7), lamentou em cena a interrupção após exigência da PM.

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“Entendemos que a Polícia Militar é importante por colocar seu efetivo na rua. O público na Praça Antônio Carlos, por três dias, têm sido muito alegre e divertido. Não vimos, eu e os funcionários da Funalfa, nenhum ponto focal de confusão. Nesses três dias, embora estivesse transcorrendo a normalidade, a polícia pediu para acabar pontualmente às 21h. Procuramos acabar nesse horário, mas algumas situações fogem do controle na organização de um evento. Talvez acabasse 21h05 ou 21h10. O problema foi a falta de diálogo”, pontua o superintendente da Funalfa Rômulo Veiga, que ainda in loco tentou negociar, sem êxito.

“Representantes da Polícia subiram ao palco e pediram para desligar o som, o que pode excitar ainda mais o público, que vai se sentir expulso da praça”, acrescenta, referindo-se aos gritos de “Eu não vou embora”, ouvidos no final da apresentação do Fogo & Paixão de uma plateia frustrada.

“A orientação é cumprir com o que foi combinado. Houve uma comissão antes de começar o carnaval, que padronizou os horários, que devem ser cumpridos à risca. Os horários de todos os blocos e shows é até 21h, o horário exato de terminar”, afirma o comandante da 30ª Companhia da Polícia Militar, responsável pela segurança da região central, capitão Alexandre Barbosa Antunes.

“A orientação para desligar o som foi minha, para cumprir com o que foi combinado”, assume, caracterizando como legítimo o ato. “Acho que é um gesto legal.” Segundo o militar, a interrupção do espetáculo é um problema relativo à organização do evento. “Tem que começar o show na hora que está programada e terminar no horário previsto. Minha preocupação é com a segurança pública. O mesmo policial que faz a segurança ontem faz hoje e amanhã. Os horários devem ser cumpridos à risca. Não tem flexibilidade”, radicaliza.

Folia frustrada

De acordo com o superintendente da Funalfa, trata-se de uma atitude alheia às práticas culturais e artísticas, tão alardeadas como eixo de transformação social. “Todo artista faz um encaminhamento para terminar seu show. E atrasamos um pouco no início não por questões técnicas, mas porque as pessoas estão saindo do trabalho. Todos os dias os eventos começaram com dez pessoas e terminou com 1.500 ou 2.000. É natural que atrase, portanto. A polícia não pode interferir diretamente na organização de um evento que a Funalfa faz. Podem repreender depois, pedir para conversar, buscar mudanças para o ano que vem. Um evento é um ecossistema extremamente complexo, que vai do público ao artista, que é contratado por um prazo, representando um custo para Prefeitura. Não é tão simples desligar o som. Entendemos desligar no caso de uma briga, mas, sem motivo algum, interromper um show como tem sido solicitado pela polícia entendemos que não é a maneira correta. Pela experiência que a Funalfa tem, entendemos que esse tipo de gesto é pior, porque o público se revolta”, observa Rômulo Veiga.

“Normalmente (os shows) acabavam às 22h. Ano passado acabaram às 21h30. Esse ano a Polícia pediu para acabar 30 minutos antes, passando para 21h. Para o ano que vem, vamos tentar, pelo menos, voltar para 21h30 ou 22h. Ano passado não teve problema. Não entendemos essa restrição de mais meia hora”, questiona o gestor da Funalfa, apontando para a ausência de diálogo numa comissão que visava dar celeridade aos pedidos de apoio e organização da folia na cidade. “Em todas as reuniões da comissão de carnaval, solicitamos que estendessem o horário. Não houve diálogo. Não houve concessão. Entendemos, então, que se tratava de motivos concretos e atendemos. Mas para o próximos anos esperamos estender mais meia hora”, compromete-se, reconhecendo as interrupções como desestímulo à folia. “As pessoas ficam frustradas. A população demanda festividades carnavalescas. Inclusive, é uma garantia constitucional o direito à felicidade e à dignidade humana.”

Autoridades negam orientação para “limpar” praça

Segundo relato de foliões, a Polícia Militar teria atuado com truculência para a evacuação da Praça Antônio Carlos, após o encerramento dos shows. De acordo com o capitão Alexandre Barbosa Antunes, comandante da 30ª Companhia da Polícia Militar, responsável pela segurança da região central, a orientação é fazer valer a Lei do Silêncio, que estipula o limite de 22h. “A orientação é: deu o horário, a gente avisa, falando ‘Meu amigo, sua licença vai até tal hora’. A partir daí, ele está sujeito a sanções que nem são da Polícia Militar, mas da Prefeitura, com multa e apreensão da mercadoria”, diz, negando que os militares atuaram na dispersão do público.

Os relatos sobre possíveis atitudes truculentas para fazer valer, com rigor excessivo, horários predefinidos e argumentações sobre a necessidade de se “limpar” a Praça Antônio Carlos também foram atribuídos a guardas municipais e fiscais da Secretaria de Atividades Urbanas (SAU). Assim, a reportagem levou tais questionamentos à SAU e à Secretaria de Segurança e Cidadania (Sesuc). A despeito de testemunhas afirmarem à Tribuna que, de fato, integrantes da corporação declararam a foliões sobre a obrigatoriedade de se evacuar o espaço público após o término das atrações, a Guarda Municipal (GM) disse que “não há orientação de ‘limpar a praça’. Não é essa a competência do órgão.”

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Em nota encaminhada por meio da assessoria de imprensa da Sesuc, a GM ressaltou que sua função é a de apoiar a equipe de fiscalização de posturas da Secretaria de Atividades Urbanas, “que orienta aos ambulantes irregulares que, ao término do evento, eles devem se retirar do local”. A Guarda ainda afirmou que seus integrantes participaram de capacitação específica e reciclagem para atuar no carnaval, na forma de prevenção ostensiva nas vias de acesso ao trajeto dos foliões, visando a garantir a segurança e a proteção de bens, serviços e instalações do município, bem como a atuação de servidores da Prefeitura. “A capacitação acontece de forma continuada. A GM atua há nove anos no carnaval de Juiz de Fora, e nunca foi registrada uma intercorrência”, reforça a nota da Sesuc.

A Secretaria de Atividades Urbanas também negou que os fiscais tenham qualquer orientação para atuar na evacuação da Praça Antônio Carlos após os shows. Também por meio de nota, a SAU reforçou que a atuação de seus servidores tem por objetivo realizar o ordenamento dos vendedores nas vias públicas, para que não aconteça a comercialização de produtos em vasilhames de vidro e serpentinas metálicas, além de obstrução do espaço por mesas e cadeiras, entre outros pontos específicos. Segundo a pasta, tal organização é necessária de forma a garantir a passagem dos blocos com segurança.

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