“O Teatro Paschoal tem que dar retorno a JF”, diz diretor da Codemig
Em entrevista à Tribuna, Marco Antônio Castello Branco defende potência da cultura na economia e recomenda alugar espaço à iniciativa privada
ATO XV
A cultura e o mercado
Como todo o trajeto de décadas do Teatro Paschoal Carlos Magno, a assinatura da ordem de serviço para a retomada das obras no espaço não se fez sem titubeios. Foram tantas as expectativas quanto as dúvidas. Marco Antônio Soares da Cunha Castello Branco, diretor-presidente da Companhia de Desenvolvimento Econômico de Minas Gerais (Codemig), que viabilizou os recursos para a empreitada, reconhece a desconfiança da empresa pública e a potência do clamor da classe artística, que fez tornar-se realidade o projeto de 1981. Para o gestor, a abertura do espaço representa o triunfo da cultura. E também do Poder Público, capaz de abrir portas enquanto tantas outras se fecham. Entre elas, a da própria companhia, que passa por uma partilha para que seja rapidamente privatizada.
Recém-criada, a Codemge se responsabilizaria pelos negócios deficitários da Codemig, como a exploração de águas minerais, aeroportos e espaços como o Expominas, presente em cinco cidades do estado, além da área de economia criativa, que Marco Antônio defende por sua força transformadora. “Se compararmos o Brasil a países onde temos um histórico cultural mais longevo, veremos que o setor da economia criativa contribui muito para a formação econômica e para o produto industrial do país. Temos esse preconceito no Brasil de que investir na cultura é jogar dinheiro fora, o que não é verdade”, argumenta o gestor, por telefone, orgulhoso por ter escutado e apostado no que, para Juiz de Fora, sempre foi espera.
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Tribuna – Por que a Codemig se interessou em financiar a retomada das obras do Teatro Paschoal Carlos Magno?
Marco Antônio Soares da Cunha Castello Branco – Quando o governador Fernando Pimentel assumiu em 2015, uma das primeiras demandas que recebemos no setor de cultura veio de Juiz de Fora. Na época, várias organizações ligadas às artes cênicas se aproximaram do Governo e foram falar com o secretário (de cultura do Estado) Angelo Oswaldo, pedindo o apoio para terminar uma obra iniciada em 1981 e parada há décadas. Dentro da política cultural organizada pelo secretário, o significado de colocar o Teatro Paschoal Carlos Magno para a região da Zona da Mata era muito estratégico. Primeiro porque Juiz de Fora possui vários grupos ligados às artes cênicas, que precisam de local para apresentações, configurando uma grande demanda. Cheguei a fazer uma visita, no primeiro semestre de 2015, para conhecer o estágio da obra e para ter um contato com as entidades culturais da cidade. Fiquei muito impressionado. Chegamos, inclusive, a fazer um levantamento com a secretaria de cultura do município, para ver se essa era realmente a demanda, e acabou se confirmando. Logo em seguida, a Codemig fez um convênio com o município, e assumimos um compromisso de despender R$ 6 milhões, que foi o orçamento que recebemos na época e que foi o necessário para terminar a obra.
– Existe, nesse acordo, a obrigatoriedade de que o teatro sirva exclusivamente à cultura?
– O teatro foi montado para apresentações culturais. Nada vai impedir de fazer formaturas, seminários, encontros. Ele tem 400 lugares, é muito bem localizado e tem uma estrutura de atendimento razoável. O foco é a cultura, mas ele vai se integrar na vida de Juiz de Fora de acordo com a demanda. Ficou uma obra muito bonita. Confesso que não acreditei ser possível que com R$ 6 milhões terminássemos a obra, dado o estado de abandono que estava a estrutura em 2015, quando visitamos.
– Como enxerga o futuro do Paschoal?
– Na minha visão, estando pronto o equipamento, é importante que seja gerido sem os entraves que, infelizmente, o setor público está submetido, de compra, venda e contratação. Minha recomendação é de que o município faça um processo de contratação ou chamada pública para encontrar um operador para o teatro, trazendo o mercado para o espaço. Acabamos de fazer isso com o Expominas de Belo Horizonte, licitamos um operador do centro de exposições, com uma obrigação de comercializar o espaço, oferecendo um aluguel para a Codemig. Em Juiz de Fora poderia ser feita a mesma coisa. Como o teatro está muito bem localizado, tem um atrativo relevante, que facilita comercializar o espaço. E pode, ainda, ter, com a política pública, a inserção de grupos de artes cênicas que precisam acessar espaço de apresentação, mas não têm recursos. Seria uma contrapartida do operador, oferecendo a cessão de dias do ano para que a secretaria de cultura possa distribuir para esses grupos. Acho complicado isso, porque o investimento é a parte mais barata dos equipamentos culturais. A manutenção deles custa dinheiro, e o setor público tem muito mais dificuldades de comercializar e ter receitas que não sejam submetidas às restrições orçamentárias.
– Sua expectativa, portanto, é a de que o teatro tenha um futuro bastante diferente do Expominas de Juiz de Fora…
– O Expominas de Juiz de Fora é um problema. Convivemos com essa dificuldade porque ele está longe da cidade, não é fácil promover eventos que tenha um público razoável, porque o deslocamento é difícil. O teatro não terá esse problema. Além de ele ter um custo operacional relativamente barato, por ser pequeno, ele está bem localizado. Já tentamos fazer uma concessão no Expominas de Juiz de Fora, mas não tivemos sucesso. É um ônus muito grande para a Codemig e, ao mesmo tempo, é um equipamento que faz falta para a região, ainda que sendo pouco usado. Sem a possibilidade desse espaço, a feira de laticínios (Minas Láctea), que é o maior evento do ano, poderia não ocorrer.
– Em tempos de tantos contingenciamentos, percebe a inauguração de um teatro como uma vitória da cultura?
– Existe esse preconceito, como se o setor cultural não fizesse parte da realidade econômica da sociedade. As pessoas acham que quem trabalha na cultura vive sempre a boa vida. É um preconceito muito grande. No setor cultural e na economia criativa de uma maneira mais larga – incluindo o turismo – temos um potencial de multiplicação econômica muito importante. É um setor em que o investimento para gerar um posto de trabalho é o menor que existe, muito menor do que no setor de manufatura. E o setor cultural precisa de espaço, daí o investimento para concluir essa obra. Se compararmos o Brasil com países onde temos um histórico cultural mais longevo, veremos que o setor da economia criativa contribui muito para a formação econômica e para o produto industrial do país. Temos esse preconceito no Brasil de que investir na cultura é jogar dinheiro fora, o que não é verdade. Mesmo os eventos patrocinados só com recursos públicos, que não cobram ingresso, têm um significado de fazer a roda econômica girar, na contratação de bens e serviços. É um setor com uma alavancagem muito rápida.
– O teatro, então, representa essa potência da cultura?
– O Paschoal Carlos Magno tem a grande obrigação de dar o retorno para a cidade agora que está pronto. E tenho a convicção de que ele pode ser autossustentável se for bem gerido e se o Poder Público tiver uma modelagem de operação favorável a não consumir recursos de tributos dos contribuintes de Juiz de Fora. É possível (que isso aconteça), só precisa montar boa estrutura, colocar (empresa) operadora competente e com baixo custo, porque se os eventos forem muito caros, as pessoas terão dificuldade para pagar ingressos fora de sua capacidade de consumo. Em Juiz de Fora e na Zona da Mata, há um um público formado, disposto a consumir produtos culturais.