Irmãos morrem abraçados com tiros na cabeça
Dois irmãos, de 17 e 19 anos, morreram abraçados após serem alvejados por tiros, no final da manhã de ontem, na Vila Ozanan, Zona Sudeste. Um amigo deles, 16, que também estava sentado em uma escada de acesso a residências na Rua Aníbal de Paiva Garcia, conseguiu correr e sobreviveu, mas acabou baleado na nádega. O duplo homicídio e a tentativa de assassinato em plena luz do dia acentuaram o medo de moradores daquela região, que têm convivido com vários episódios de violência em via pública. A dor da mãe que perdeu os dois filhos de forma trágica, a poucos metros de casa, também reflete o sentimento de dezenas de outras que passaram pela mesma situação: até ontem, pelo menos 88 pessoas foram assassinadas em Juiz de Fora este ano, conforme levantamento da Tribuna. O número já é bem maior do que o registrado no mesmo período de 2015, quando 76 vítimas morreram em decorrência de crimes. O crescimento de homicídios, após uma ligeira queda no ano passado, acende o alerta sobre a segurança pública na cidade.
Na ação violenta de ontem, Elias Alves Ribeiro,19, e Lucas Ribeiro da Silva,17, estavam conversando com o adolescente na escada, perto de um ponto de ônibus e quase na esquina com a Rua Pedro Silva Macedo, quando o atirador surgiu a pé e disparou à queima-roupa contra o trio. O sobrevivente estava sentado degraus acima dos irmãos e ainda teve chance de escapar da morte, correndo para se esconder na casa de um amigo. Já Elias e Lucas apenas tiveram tempo de se abraçar, como se tentassem se proteger dos tiros. O mais jovem foi atingido na cabeça e na mão direita, enquanto o outro foi ferido na cabeça e braço esquerdo. “Na hora que eu vi, ele já estava atirando contra nós”, contou o adolescente baleado, que também mora nas imediações de onde aconteceu o crime. Os óbitos foram confirmados no local por uma equipe do Samu. O jovem ferido foi socorrido e encaminhado para atendimento médico no HPS.
A ocorrência atraiu a atenção de muitos moradores e mobilizou várias viaturas da Polícia Militar. “Estávamos fazendo patrulhamento em outras áreas, quando populares ligaram para o Copom (Centro de Operações da PM), dizendo que havia acontecido um crime na Vila Ozanan. Nos deparamos com três vítimas, sendo duas possivelmente em óbito e outra com um disparo nas nádegas. Tivemos informações sobre um suspeito e estamos diligenciando para buscá-lo. Mas a própria vítima (sobrevivente) não quer falar, afirma que era um pessoa desconhecida, que nunca viu”, informou o comandante de policiamento do 2º Batalhão da PM, tenente Ruanlemberg Marques.
‘Tenho medo de sair de casa’, desabafa moradora
Segundo a PM, o suspeito seria um adolescente de 17 anos, morador da Vila Olavo Costa, na mesma região. “Os três estavam na escada conversando, e o suspeito, em tese, passou por um trilho que liga os dois bairros e, após os disparos, teria fugido pelo mesmo local”, contou o tenente Ruanlemberg Marques. Apesar das buscas, o atirador não foi localizado. Ainda conforme informações obtidas pela PM, as vítimas já estariam sendo ameaçadas de morte em decorrência de outro homicídio ocorrido há cerca de seis meses.
Os conflitos entre grupos das vilas Olavo Costa e Ozanan têm se tornado frequentes e aterrorizam a população. “Tenho medo de sair de casa. Quando meu filho de 21 anos vai trabalhar, sempre falo para ele ter cuidado, porque os tiros aqui acontecem a qualquer hora. No Dia das Mães, eu saí da missa de manhã e tive que voltar, porque estava tendo tiroteio no meio da rua”, desabafou uma moradora, 43, que preferiu não se identificar por temer represálias.
O crime ao qual a mulher se referiu aconteceu no dia 8 de maio, quando tiros levaram pânico a moradores da Vila Ozanan, e até um ônibus urbano foi atingido pelos disparos. A violência também aconteceu na Rua Aníbal de Paiva Garcia, mesma via onde os irmãos foram mortos. Na ocasião, um homem, 27, foi atingido por quatro tiros. Na época, a PM apurou que a tentativa de assassinato havia sido praticada por dois moradores da Olavo Costa, que teriam descido a rua atirando em direção ao homem ferido e também contra um adolescente, 16, que escapou ileso.
A ação citada teria sido motivada por rivalidade entre grupos dos dois bairros e aconteceu um dia depois da morte de um jovem, 19, que havia sido baleado na Olavo Costa. Já o homicídio desse rapaz teria sido praticado por um adolescente, 17, que havia saído do Centro Socioeducativo e sido recapturado no dia 26 do mesmo mês portando uma pistola ponto 40, usada “para se defender de desafetos de bairros vizinhos”.
Disputas acirradas pelo tráfico de drogas
O vaivém de crimes envolvendo infratores das vilas Olavo Costa e Ozanan deixa os moradores reféns da violência. Após o duplo homicídio de ontem, o temor é de que haja o acirramento dessas disputas, permeadas pelo tráfico de drogas, conforme avaliação da PM. “Como uma popular acabou de dizer: ‘eles vão ver, na hora em que a gente for lá’. Isso mostra a intenção de que vai existir futuramente uma vingança por causa desses crimes. É aí que a Polícia Militar tenta justamente intervir para minimizar os impactos na sociedade. Vamos atuar de forma preventiva, identificando as pessoas e os suspeitos”, garantiu o comandante de policiamento do 2º Batalhão da PM, tenente Ruanlemberg Marques.
Os enfrentamentos de grupos rivais e o tráfico de drogas são considerados pela polícia como as principais motivações de homicídios. Apesar de o município ter sofrido uma suave queda nas mortes violentas em 2015, quando a Tribuna contabilizou 131 óbitos, contra 141 em 2014 e 139 em 2013, a escalada da violência continua. Execuções em vias públicas, infelizmente, já fazem parte da rotina de alguns bairros. Dos 88 homicídios este ano,16 aconteceram na Zona Sudeste, mesma região onde os irmãos foram mortos, e uma das áreas consideradas mais violentas, ao lado da Leste e Norte. Dos 16 casos, cinco ocorreram na Vila Olavo Costa.
Conforme o tenente Ruanlemberg, a prevenção tem sido realizada. “Temos um portfólio preventivo muito grande. Agimos, por exemplo, com a Patrulha de Prevenção à Violência Doméstica, com uma equipe de policiais fazendo visitas frequentes às vítimas. Temos o Programa de Resistência às Drogas (Proerd), para tentar ensinar às crianças que o caminho das drogas é um caminho ruim. Atualmente estamos fazendo ocupação na região da Vila Alpina e São Benedito, na Zona Leste, local crítico de tráfico de drogas. Viaturas preventivas estão atuando na região, tentando identificar os cidadãos infratores, para evitar os crimes.”
O crescimento dos assassinatos este ano coincide com a redução de delegados na Especializada de Homicídios. Pouco tempo depois do afastamento de Rodrigo Rolli, no início de abril, devido à sua candidatura ao Legislativo Municipal, e do deslocamento de Carlos Eduardo Rodrigues para outra delegacia, o titular José Márcio de Almeida Lopes passou a responder sozinho pela especializada, que também teria sofrido baixa de outras funções, como de investigadores.
Investigações intensificadas
De acordo com a delegada regional de Juiz de Fora, Patrícia Ribeiro, a Polícia Civil tem intensificado o serviço de investigação dos crimes violentos, inclusive, com forças-tarefas integradas e “trabalhando de forma enérgica para que os criminosos respondam pelos seus atos”.
Ainda segundo a Polícia Civil, o resultado de todo esse trabalho já vem sendo acompanhado pela população de Juiz de Fora com a apresentação de diversos autores e informação sobre apuração desses crimes. “Trabalhamos com um alto índice de apuração de homicídios tentados e consumados e com respostas rápidas, inclusive com prisões em flagrante dos autores”, assegurou o delegado de Homicídios, José Márcio.