Bandidos invadem casas e expulsam moradores

Casos são registrados com frequência nos condomínios do Minha Casa, Minha Vida; na última quarta, seis pessoas chegaram a ser detidas pela PM, mas foram liberadas e retornaram ao bairro onde cometeram os crimes


Por Michele Meireles

28/07/2017 às 07h00- Atualizada 28/07/2017 às 15h37

Tenente Vinícius Araújo diz que, com medo, muitas famílias saem de suas casas antes mesmo de serem expulsas (Foto: Felipe Couri)

As invasões de residências nos condomínios do Minha Casa, Minha Vida em Juiz de Fora continuam tirando o sono de quem lutou para adquirir a casa própria. Criminosos expulsam os moradores, se apoderam dos imóveis e os transformam em pontos de venda de drogas. Outras casas eles usam para fazer festas ou alugam para terceiros. Na tarde da última quarta-feira (26), três famílias tiveram suas residências violadas no empreendimento Parque das Águas, na Zona Norte. Seis pessoas, entre elas adolescentes, acabaram detidas pelo crime.

A situação vem preocupando as polícias Militar e Civil, que contabilizam pelo menos 20 ocorrências em outros condomínios populares da Zona Norte da cidade. Porém as corporações acreditam que o número de episódios seja muito maior, já que a maioria das vítimas tem medo de denunciar as violações. A PM garante que vem fazendo ações contínuas e prendendo os infratores, que rapidamente retornam às ruas e voltam a agir. Já a Polícia Civil, por meio da 3ª Delegacia, tem inquéritos abertos e está apurando as ações criminosas.

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No caso da última quarta-feira, a PM recebeu denúncia de que um indivíduo armado estava ameaçando e expulsando moradores do Parque das Águas, o maior empreendimento do programa Minha Casa, Minha Vida, onde vivem 565 famílias. Os militares se deslocaram para o bairro, onde, na parte da manhã, havia ocorrido uma manifestação de moradores que não concordavam com a retirada de marcação irregular feita por eles em terrenos do loteamento.

Logo na entrada do bairro, os policiais foram parados por uma das vítimas, que relatou ter sido expulsa de sua própria casa, localizada na Rua Maestro José Quirino, por um homem de 24 anos, que já teria alugado o imóvel para terceiros. Os policiais, então, foram para a residência e constataram que a porta da sala e o portão de entrada estavam arrombados. Dentro da residência estavam dois garotos, de 17 e 18 anos, e uma adolescente, 16. Eles relataram que alugaram o imóvel, mas não apresentaram nenhum contrato. Os policiais verificaram ainda que vários utensílios e eletrodomésticos estavam danificados.

Quando ainda estavam neste endereço, os PMs receberam a informação que indivíduos estariam invadindo outro imóvel no mesmo condomínio. Eles se deslocaram para a Rua Severiano Honório da Silva e se depararam com a residência aberta e diversos utensílios jogados na rua. No interior da casa estavam o suspeito de 24 anos, uma mulher, 23, e outro homem, 28.

Houve um princípio de tumulto, e outras duas mulheres, de 19 e 22 anos, foram detidas por desacato. Os outros seis envolvidos foram detidos pelo crime de violação de domicílio e levados para a delegacia. Na unidade policial, um terceiro morador procurou a polícia e disse que sua casa havia sido arrombada enquanto ele trabalhava. Vizinhos fizeram contato com ele por telefone e avisaram da invasão. Quando ele chegou no endereço, encontrou a casa toda revirada, com utensílios e vários pertences pessoais jogados do lado de fora. Os suspeitos foram ouvidos e liberados.

Líder das invasões é reincidente

De acordo com o comandante da 269ª Companhia da PM, tenente Vinícius Araújo, o líder da última invasão, o homem de 24 anos, já havia sido preso outras vezes e teria envolvimento com tráfico de drogas e crimes violentos na região. Sua última prisão foi no dia 26 de maio, exatamente dois meses antes das invasões. Ele foi flagrado com duas armas de fogo municiadas fazendo segurança de uma boca de fumo do bairro. “Além desta prisão em flagrante, este homem já tinha invadido outras residências antes. O entrave é que na maioria dos casos os moradores não denunciam por medo. A Polícia Militar fica sem compreender como um cidadão preso com duas armas e envolvido com outros crimes pode estar na rua. No caso de ontem, eles foram ouvidos e liberados e voltaram para o mesmo bairro, possivelmente teremos problemas semelhantes em breve. É preocupante”, pontuou.

No mesmo condomínio, em 2014, a Polícia Civil investigou a expulsão de famílias por traficantes. O responsável pelo inquérito, Rodolfo Rolli, titular da 3ª delegacia distrital, vê com preocupação o aumento dos casos. “Percebemos que estas situações estão ficando rotineiras. Vejo que é um problema muito mais social do que de segurança pública. Temos muita dificuldade para agir, já que faltam denúncias e também precisaríamos de mandados itinerantes, que nos respaldam para entrar em todos os endereços da área. É uma situação bastante sensível”, comentou.

Moradores têm medo de denunciar

Conforme o tenente Vinícius Araújo, além das invasões do Parque das Águas, a PM tem denúncias de que pelo menos 20 apartamentos do residencial Belo Vale, pertencente ao mesmo programa do Governo e localizado no Bairro Jóquei Clube, foram alvo de invasões. Porém há apenas duas ocorrências registradas sobre o crime, uma do último dia 7 e outra de 23 de março deste ano. Na última, a PM encontrou drogas e arma em um dos imóveis e constatou que este foi invadido. Na ocorrência de março, também houve flagrante de tráfico de drogas em um apartamento, que também teria sido invadido. “Temos notícia de que, além do tráfico, estes imóveis são usados para que os criminosos façam festas regadas a drogas e bebidas e também estariam sendo alugados de forma ilegal”, comentou.

O delegado Rodolfo Rolli também apura a questão do Belo Vale. Segundo ele, são pelo menos 20 casos em investigação. Para ele, o número de violações é bem maior. “Percebo que as denúncias cresceram, mas ainda são poucas. Há muito medo da população em falar sobre o assunto. É triste ver pessoas de bem, que trabalharam uma vida toda para ter uma casa própria, perdê-las para bandidos. Para mim, estes problemas são muito mais de cunho social que de segurança pública. É preciso que outros órgãos ajam, senão os casos vão continuar a acontecer”, diz.
Uma idosa que mora no local há dois anos contou que convive com o medo diariamente. “Ainda não me mudei porque não tenho para onde ir. Só no bloco ao lado do meu tem uns quatro apartamento invadidos. Sabemos que lá tem drogas, armas. Mas o que posso fazer? Se eu abrir a boca, já sei: ou morro ou mudo, então, prefiro fingir que não estou vendo nada.”

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Segundo o tenente Vinícius Araújo, a PM vem agindo nestes condomínios e fazendo prisões, porém o principal problema é a falta de denúncias. “Temos conhecimento de que muitas famílias saem antes de serem expulsas. Ficam temerosas com ameaças que sofrem e acabam saindo, então, os criminosos invadem. Nós ficamos sem ter como fazer muita coisa, já que esbarramos na questão legal. As residências são invioláveis, só podemos entrar em situação de flagrante ou com mandado. O que notamos é que essas famílias são colocadas nestes condomínios, e não há um acompanhamento. Muitas vezes são pessoas de bairros rivais que vão ser vizinhas. Não se checa o que está sendo feito também com estes imóveis. No Parque das Águas tem casas que se transformaram em bares e até casa noturna”, comentou.

Ameaças
No final de maio deste ano, após sofrer diversas ameaças de criminosos, um homem de 65 anos resolveu quebrar o silêncio e acionar a Polícia Militar para denunciar que moradores do Bairro Vila Esperança II, também na região Norte, estavam sendo expulsos de suas casas por bandidos. A situação já havia sido noticiada pela Tribuna em fevereiro deste ano, mas a ocorrência registrada pelo idoso mostra que os casos continuavam a acontecer.

Órgãos públicos
Por meio de nota, a Caixa Econômica Federal, banco responsável pelo financiamento do programa habitacional do Governo, esclareceu que, em relação aos casos de segurança pública, encaminha as denúncias à Secretaria Nacional de Segurança Pública (Senasp), “com o objetivo de integrar ações preventivas e corretivas de condutas ilícitas em programas habitacionais da União”. Também procurada pela Tribuna, a Prefeitura não quis se posicionar sobre o assunto.

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