Depois do granizo, falta d’água
A chuva histórica de granizo que atingiu a cidade no domingo causou reflexos no abastecimento de água. Isso porque a Estação de Tratamento de Água (ETA) Marechal Castelo Branco, que atende a Represa João Penido, ficou sem fornecimento de energia elétrica durante 22 horas, entre 16h de domingo e 14h de ontem. Os geradores da unidade foram suficientes para produzir apenas cerca de 40% da água necessária no sistema, causando desabastecimento. A informação da Cesama é que os bairros mais atingidos são os da Zona Nordeste, que tiveram rodízio no sábado, como Granjas Bethânia, Bandeirantes e Parque Guarani, os da Zona Sul, entre eles, Santa Luzia e adjacências, Cruzeiro do Sul, Graminha, Guaruá, Boa Vista, Alto dos Passos, Bom Pastor, Cascatinha, Teixeiras, Santa Cecília, Mundo Novo, além da Vila Ozanan e Vila Ideal, na Zona Sudeste. A previsão é que o sistema de abastecimento seja totalmente restabelecido até a manhã de hoje, embora ainda possa faltar água em ruas mais altas. A partir da tempestade, a Cemig chegou a contabilizar 30.940 clientes sem energia, número que caiu para 400 no fim da tarde de ontem, com expectativa de normalização até o fim do dia.
No Parque Guarani, região Nordeste, moradores de um condomínio com 160 apartamentos, na Rua Paulo Afonso Tristão, sofrem com problema de desabastecimento desde o início da noite de domingo. “Fomos pegos de surpresa, as torneiras estão completamente secas”, disse um empresário que não quis ter seu nome divulgado. Moradores da Rua Antônio Soares Ferreira, no Bairro Grama, região Nordeste, estão sem água desde a manhã de ontem. Conforme residentes, o problema começou pela manhã. Já no Bairro Santa Luzia, Zona Sul, quem mora na Rua Água Limpa, começou a notar o problema na tarde de ontem. A jornalista Alana Rodrigues afirmou que em sua casa a falta d’água começou por volta de 13h e seguia até a noite de ontem.
Apesar da falta de água, a Cesama descartou, em princípio, suspender o rodízio de abastecimento. Isso porque o racionamento ocorreu ontem apenas na Cidade Alta, onde não houve reflexos do problema em João Penido, e hoje acontece nesta mesma região e também na Zona Norte. Nesta área, os reservatórios de água da companhia ainda estavam em níveis regulares.
Para recuperar o fornecimento de água em todas as regiões, a ETA Marechal Castelo Branco opera com capacidade máxima, sem a preservação que ocorria nos últimos meses para evitar queda acentuada do volume de água armazenado no lago da represa.
Chuvas
De acordo com dados do 5º Distrito do Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet), choveu no domingo, entre 15h e 17h, cerca de 14 milímetros. Com isso, o acumulado de precipitações em todo o mês já é 86,5% do esperado pela média histórica do período, que são 27,5 milímetros. No entanto, os pluviômetros da Defesa Civil registraram precipitações ainda mais significativas. Em Grama, Zona Nordeste, por exemplo, choveu 90 milímetros; enquanto que, no Granjas Bethânia, na mesma região, 37 milímetros; e Filgueiras, 36.
Também choveu muito no Centro, 35 milímetros; no Nova Era, Zona Norte, 29; e no Santa Rita, região Leste, com 28 milímetros.
As fortes chuvas de sábado e domingo, aliás, não foram suficientes para que o nível da Represa João Penido aumentasse. Por outro lado, não houve perda, mantendo-se com os mesmos 29% que estavam na última quinta-feira. Conforme o diretor técnico-operacional da companhia, Márcio Augusto Azevedo Pessoa, a avaliação que se faz, neste sentido, é positiva, porque a chuva contribuiu para evitar queda do volume, como ocorria gradativamente desde março. Já a Represa de São Pedro teve o nível de acumulação ampliado de 30% para 33%, enquanto Chapéu D’Uvas se manteve estável, com 55%.
Com relação ao corte de energia na região da represa, a Cemig informou que foi causado pelo rompimento de um cabo conhecido como jumper, que é mais fino que os demais, o que dificultou a identificação do problema. A recuperação da estrutura teve início às 11h30, sendo finalizado por volta das 14h05. A causa mais provável, conforme a companhia, foram as fortes rajadas de ventos durante a tempestade.
Cenário impressiona na Z. Norte
Quase 24 horas após a queda de granizo na Zona Norte, o cenário ainda impressionava nas ruas ontem. Isso porque grande quantidade de gelo ainda permanecia nas vias, cobrindo asfalto e calçadas. Pela manhã, moradores de bairros das regiões Norte e Nordeste trabalhavam na limpeza e na contabilização dos prejuízos, não só do granizo, como também dos pontos de alagamentos, observados em corredores de tráfego, como a Avenida JK.
A queda de um poste na Avenida Juiz de Fora, entrada do Recanto dos Lagos, na região do Grama, causou retenções de aproximadamente 30 quilômetros na MG-353, até a altura da Embrapa, em Coronel Pacheco. Segundo o sargento Vitório Luis Cláudio Gonçalves, do posto da Polícia Militar na rodovia, condutores levavam até quatro horas para chegar a Juiz de Fora, já que o tráfego na avenida operava no sistema pare/siga. “Começou a ficar tumultuado por volta das 16h, e o tráfego se manteve lento até 21h. O próprio posto ficou sem energia elétrica até 23h30 de domingo, e o telefone só retornou às 15h de hoje (ontem).”
De acordo com a assessoria de comunicação da Oi, houve rompimento de um cabo de fibra ótica que afetou parcialmente o serviço de telefonia fixa para alguns clientes na Zona Nordeste, com normalização total na tarde de ontem.
Prejuízos
No Mini Distrito Industrial do Milho Branco, na região Norte, o proprietário da Pães de Minas, Luiz Arantes, 50, conta que teve mais de R$ 5 mil em prejuízos só com os produtos, que foram atingidos pela água. “Um dos portões da fábrica foi arrancado pela chuva, enquanto um caminhão nosso precisou ser encostado, pois o motor dele ficou completamente alagado.” Na Rua Diomar Monteiro, área de maior concentração de comércio no Grama, região Nordeste, o clima era de desolação. “Em dois anos que tenho a loja, esta é a segunda enchente que enfrento. A diferença é que esta aconteceu em julho”, comenta o empresário Rafael Gomes, 29, que, além de ter perdido mercadorias, teve o carro danificado. “Por conta do vento, caiu uma janela sobre ele, quebrando o vidro e amassando o capô”, disse, estimando perdas na ordem dos R$ 10 mil.
Defesa Civil
A Defesa Civil recebeu 21 chamados em razão das chuvas. Entre os destaques está o caso de uma queda de muro de contenção na Rua Joaquim Borges Pereira, no Bairro Granjas Bethânia, Zona Nordeste. Preventivamente, a família de uma casa em área próxima foi retirada do imóvel e procurou abrigo na casa de parentes. A Empav também atuou ontem na reparação de danos, recolhendo árvores que caíram nas zonas Nordeste e Norte. Já o Demlurb promoveu limpezas nos bairros Cidade do Sol, Jardim Natal e o Mini Distrito Industrial do Milho Branco, com auxílio de 49 funcionários, que utilizaram máquinas e caminhões. Só no Milho Branco, 20 acautelados trabalharam na limpeza das ruas. A estimativa era de recolher, até o fim do dia, cerca de 30 caminhões cheios de lama, terra e gelo.
Tempestade de gelo também em 1985
Quem vive na cidade há mais de 30 anos comparou a tempestade de domingo com a registrada em 5 de setembro de 1985. Na época, praticamente todo o município ficou coberto por densa camada de gelo, após quedas de granizo que duraram cerca de 20 minutos. Reportagem publicada pela Tribuna naquele ano mostra que as consequências foram ainda mais graves. Na época, as rajadas de ventos chegaram a 90 quilômetros por hora, e a queda na temperatura foi de 14,4 graus, declinando de 26,2 para 11,8 graus. Na tempestade do último domingo, o Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet) registrou rajadas de 56 quilômetros por hora na Estação Automática instalada no Campus da UFJF. Embora não seja possível afirmar, provavelmente os ventos, na Zona Norte, tinham velocidades superiores. Já a temperatura também declinou, indo de 21,5 para 14,3 graus.
O editor de fotografia da Tribuna, Roberto Fulgêncio, recorda que, na época, a camada de gelo derreteu em poucas horas, diferente do que aconteceu desta vez. Isso porque, no início da tarde de ontem, quase 24 horas após a tempestade, ainda havia densa camada cobrindo calçadas e asfalto em ruas da Zona Norte.
Embora incomum durante o período de estiagem, tempestades como essas podem acontecer em qualquer época, conforme explica o meteorologista Ruibran dos Reis, diretor regional do Instituto Climatempo. Segundo ele, houve a formação de nuvens conhecidas como cumulonimbus, comuns em tempestades de raios e granizos. Elas foram formadas após o choque de uma massa de ar frio, que atuava no litoral, com massa de ar quente. O vapor d’água, condensado na nuvem, congelou rapidamente e despencou no ambiente. “Dentro destas nuvens, as gotículas de água estavam na ordem de 70 graus negativos e, desde então, não esquentou muito na cidade. Como o granizo foi muito forte, ele se mantém no ambiente por até mais de 24 horas.” Ainda segundo o especialista, é pouco provável que o município seja atingido por nova chuva de granizo durante a estiagem.
Previsão do tempo
Segundo o Centro de Previsão do Tempo e Estudos Climáticos (Cptec), os próximos dias deverão ser de estabilidade, com céu entre o claro e o parcialmente nublado. As temperaturas devem oscilar de 14 a 24 graus.