Conheça Marcos Marcelino: há 37 anos entregando cartas pelas ruas de JF

Na terça-feira, foi comemorado o Dia do Carteiro. Para homenagear estes profissionais, a Tribuna entrevistou um dos trabalhadores mais antigos dos Correios no município


Por Elisabetta Mazocoli, sob supervisão da editora Fabíola Costa

28/01/2023 às 07h00

Para o carteiro, o ofício vai muito além de entregar cartas e encomendas; difere-se pelo trato com o outro e pela relação de confiança estabelecida (Foto: Elisabetta Mazocoli)

De segunda a sexta-feira, Marcos Marcelino de Araújo inicia o trabalho às 8h25, separa as cartas que serão entregues e as organiza seguindo a numeração do trajeto que será feito durante o dia. Logo no início da jornada, ele também reúne todas as encomendas que serão entregues. Em uma segunda-feira normal, são entre 180 e 220 pacotes. Essa é a rotina que Marcelino mantém há 37 anos, desde que entrou nos Correios e começou a trabalhar como carteiro. No Dia do Carteiro (24), em especial, ele refletiu sobre como a profissão permite um contato mais estreito com as pessoas e um conhecimento maior da cidade – algo que não trocaria na sua rotina e que realmente o faz feliz.

Quando Marcelino entra na agência dos Correios, todos os outros funcionários param o que estão fazendo por um momento e o cumprimentam pelo nome. Ele conta que na rua acontece o mesmo, principalmente por trabalhar há mais de 20 anos no mesmo bairro. Marcelino conhece bem as pessoas para quem entrega encomendas. É normal, por exemplo, que ele chegue na casa de alguém no Cascatinha e, caso a pessoa não atenda, ele saiba direitinho onde ir para encontrá-la. “É uma relação de amizade e confiança mesmo”, diz. Quando precisa de um copo de água ou de ir ao banheiro, por outro lado, também tem a segurança de que vão recebê-lo com o mesmo carinho.

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Faça chuva ou faça sol, as entregas acontecem com pontualidade e compromisso. Seus amigos de trabalho dizem que a pior parte do ofício é enfrentar dias com tempestades ou os cachorros de rua que estranham os carteiros e costumam correr atrás deles. Marcelino, no entanto, não se incomoda com nenhuma das duas situações, diz que já se acostumou. “Eu trabalhei no Teixeiras, naquela região que chamam de Alegria do Boi. Fiquei seis meses subindo todo dia aquele morro enorme. Mas eu ia tranquilo, porque sabia que tinha que subir mesmo, então só ia e fazia o que era preciso.”

Ele trabalha desde os 14 anos fora de casa. Antes de poder assinar a carteira, atuava como entregador de jornal, fazia serviço como ajudante de pedreiro e recolhia lavagem para porco. Mas logo que começou sua carreira nos Correios, como auxiliar, foi progredindo até conseguir passar no concurso e exercer um cargo melhor como carteiro. A estatal mudou sua vida duas vezes, diz. Primeiro, por ter representado para ele uma oportunidade mais sólida de carreira; depois, quando ofereceu a ele “o tratamento e o acompanhamento de que precisava” para um problema complicado de saúde. Há sete anos, ele foi internado, com a ajuda dos Correios, em função de um quadro de alcoolismo e, a partir daí, foi conseguindo lutar contra a doença até se recuperar totalmente.

Mais que entregas

São tantos anos andando pelas ruas de Juiz de Fora, que Marcelino afirma que há bairros que, de fato, ele conhece muito bem. Cascatinha, Bom Pastor, Santa Luzia e Santa Efigênia, por exemplo, fizeram parte da sua atividade diária por muito tempo e, por isso, nesses lugares, ele consegue localizar até mesmo as ruas menos conhecidas. Na sua opinião, o ofício de carteiro não se limita a entregar cartas. É por isso que, enquanto vai seguindo sua rota, tantas pessoas param para conversar com ele, pedindo informações sobre os Correios, querendo orientação sobre as entregas ou até uma ajuda para encontrar algum endereço específico.

“Eu respondo a cada pessoa da melhor forma possível, porque eles confiam nos carteiros mesmo. E a gente representa os Correios sempre”, conta. Mesmo quando o tempo está corrido e ele precisa finalizar as entregas, não deixa de ser atencioso e gentil, porque entende que é dessa atenção que a população precisa, e isso faz parte do seu aprendizado diário. Em sua opinião, inclusive, um bom carteiro precisa sempre ter, além de profissionalismo, o cuidado com o outro.

Insubstituível

Em todos os anos em que trabalha nos Correios, Marcos Marcelino naturalmente notou muitas mudanças: o fim dos telegramas, a diminuição do envio de cartas, o aumento de encomendas e a necessidade de as pessoas terem entregas mais rápidas. Um desafio que enxerga agora é justamente manter a qualidade do trabalho pelo qual o órgão é conhecido, mesmo num cenário em que claramente há menos carteiros nas ruas. “Muitas pessoas se aposentaram e ainda não houve novos concursos. Por isso, hoje a gente está trabalhando mais que apertado. É muita coisa, muita encomenda”, diz.

Mas a correria do dia a dia em breve vai acabar para ele. O projeto de aposentadoria deve ser realizado em poucos anos, quando, enfim, poderá descansar. E a mudança acontecerá em boa hora: ele está prestes a se tornar avô e já planeja aproveitar ao máximo esse novo momento da vida. “Acordei cedo a minha vida toda. Quero poder relaxar”, diz. Sua vontade é poder escutar mais música da sua época, como Martinho da Vila e Cazuza, mas também tentar viajar – quem sabe para Manaus, como diz.

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Embora esteja prestes a se despedir, ele sabe que os Correios devem continuar, e que a rotina, que hoje é dele, há de ser assumida e repetida por muitos outros profissionais que vieram depois. Marcelino acredita que o trabalho deverá continuar sendo feito por carteiros de verdade, gente de carne e osso, sem uma substituição total de pessoas por máquinas. Isto porque, pra ele, “o que os carteiros fazem não é só uma simples entrega”, mas todo o contato com as pessoas, com cuidado e dedicação que só eles são capazes de demonstrar nas ruas.

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