PJF aciona donos de prédios


Por Guilherme Arêas

27/12/2014 às 07h00- Atualizada 30/12/2014 às 14h44

“Deus não está aqui”. A frase pintada em vermelho na parede de um dos cômodos da antiga clínica São Domingos (ver fotos na galeria abaixo), no Bairro Paineiras, região central, choca, mas resume a sensação de quem entra na unidade completamente abandonada há mais de um ano e meio. O medo é real diante da sensação de vazio em meio a um cenário de destruição e de pichações com incitações à violência e ao anticristianismo. O prédio, que atendeu pacientes psiquiátricos por décadas, foi fechado no início de 2013, após interdição das vigilâncias sanitária municipal e estadual e desde então sofre com as ações dos invasores, saqueadores, moradores de rua, usuários de drogas e grupos que procuram o local para prática de sexo e rituais. A situação leva insegurança aos vizinhos, que por inúmeras vezes acionaram a Polícia Militar na tentativa de minimizar os incômodos.

O quadro é o mesmo na também extinta Casa de Saúde Doutor Aragão Villar (ver fotos na galeria abaixo), no Bairro São Sebastião, na Zona Leste. Na edificação de três andares, a depredação é total: portas e guarnições inteiras foram arrancadas, paredes quebradas e cômodos incendiados. Móveis, documentos e remédios deixados para trás quando do fechamento das unidades se misturam a outros objetos que mostram que a ocupação é frequente. Há garrafas e latas de bebidas alcoólicas vazias, cachimbos improvisados de crack, preservativos usados, roupas e cobertas, além de marcas de sangue e fezes humanas.

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Além das invasões aos prédios, as comunidades relatam depredações, pichações e furtos em imóveis próximos. Outro problema relatado pela comunidade é a presença de muito mato, entulhos e lixo, o que atrai animais para proximidades. A situação é de conhecimento da Polícia Militar, Ministério Público, Prefeitura e Vigilância Sanitária, mesmo assim, o problema persiste. “Nós atendemos sempre que há solicitações, mas não há muita coisa a ser feita. Se nada de ilegal é encontrado com os ocupantes, pedimos para se retirarem. E já fizemos prisões, mas infelizmente a solução definitiva não depende somente da Polícia Militar”, explicou o comandante da 30ª Companhia da PM, capitão Erivelton Soares.

As duas edificações são de particulares e conforme a Secretaria de Atividades Urbanas (SAU) os proprietários já foram autuados por diversas vezes. Na semana passada a Prefeitura informou que irá acionar judicialmente os donos dos imóveis, já que todas as medidas administrativas foram adotadas. Em nota, o órgão afirma que “diante da situação, o setor jurídico da pasta foi acionado para que possam ser tomadas providências judiciais contra o responsáveis pelos imóveis onde funcionavam as unidades hospitalares, considerando que são necessárias e urgentes providências com vistas a resguardar a segurança e saúde da população do entorno, não podendo o poder público mais aguardá-las indefinidamente, visto que as consequências do decurso de tempo agravam substancialmente os prejuízos causados pela omissão do responsável.” O processo agora está sendo avaliado na Procuradoria Geral do Município (PGM). A Tribuna chegou a representantes dos donos dos antigos hospitais e de seus advogados, mas ninguém quis comentar a situação.

 

Pedido de intervenção urgente

Moradores dos bairros São Sebastião, São Bernardo, Jardim do Sol e Cesário Alvim, vizinhos à Casa de Saúde Aragão, na interseção das ruas Goiás e Alexandre Visentim finalizam um abaixo-assinado pedindo a intervenção da Prefeitura no prédio. Presidente da Sociedade Pró-Melhoramentos dos bairros, Sérgio Neves, conta que desde o fechamento, a comunidade relata insegurança. “A presença de pessoas no local é diária.Tivemos registros de furtos próximos, sem contar que também há o risco de proliferação da dengue. Não temos acesso ao proprietário e o município precisa intervir, exigir o cercamento, a revitalização ou a presença de vigias no local.”

Um garçom, 55 anos, vizinho à antiga clínica, teve a casa arrombada. “A circulação de pessoas é enorme. Primeiro vieram e depredaram tudo lá dentro. Saiam com portas e tudo nas mãos. Agora estão entrando nas casas vizinhas. Tive que instalar grades na garagem, na sacada e colocar concertina em todo o muro para evitar novas invasões”, contou. Outra vizinha, uma aposentada, 62, também reclama. “A situação está crítica por conta desse abandono. Por volta de 22h30, 23h chega muita gente para usar drogas e dormir lá dentro. E no início da manhã, ou ainda de madrugada, costumam deixar o local”, contou.

Já no Paineiras, os moradores pedem a ocupação do prédio pela própria Prefeitura, Polícia Militar ou UFJF. “Apesar do vandalismo, a estrutura do prédio é muito boa e abrigaria um excelente hospital, um batalhão da polícia ou até laboratórios da universidade”, sugere um empresário, vizinho ao local. “Moro aqui há mais de 30 anos. Tem dia que fico aqui perto da porta só ouvido os gritos de socorro. Fico com medo pois moro sozinha”, relatou uma aposentada, 67.

Outra moradora cobra a intervenção urgente dos órgãos públicos. “Que acionem os proprietários na Justiça. Não podemos pagar o preço pelo abandono. Usam o espaço para tudo. E são diversos os frequentadores. Já vimos estudantes, moradores de rua, grupos todos de preto e usam para consumir bebidas e drogas, para sexo, para rituais de magia negra e agora tem alguns jovens morando aí, inclusive uma criança”, contou uma empresária. 51.

No momento em que a Tribuna conversava com os moradores, na manhã do último dia 17, dois adolescentes e um menino, aparentando cerca de 11 anos de idade, deixaram o local. “A situação é crítica. Tem crianças ficando aqui também. O conselho tutelar também precisa ser acionado”, cobra a empresária.

 

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Prontuários e medicamentos amontoados

Na antiga clínica São Domingos, no Paineiras, o acesso é feito pelo portão, no fim da Rua Doutor Ávila, que teve parte das grades arrancadas. O mato toma conta de todo o entorno do prédio de quatro andares e as pichações e sujeira encontrada na parte do estacionamento já indicam o que será encontrado também dentro da unidade. “Bem vindo ao inferno”, diz a inscrição na parede, em meio a tantas outras macabras. No refeitório, ainda restam utensílios e eletrodomésticos industriais. No meio do pátio, há marcas de objetos queimados recentemente.

Na entrada principal e na ala onde funcionavam recepção, administração, diretoria e almoxarifado mobiliário, roupas, livros documentos e prontuários de pacientes formam um amontoado. Há também muitos frascos de remédios, seringas e ampolas espalhadas. E na entrada do segundo andar, as frases de referência a demônios assustam. Há ainda cômodos com camas, cobertas, preservativos e até fezes humanas. No terceiro andar há indícios de que o local é usado como morada. Apesar do cenário, a estrutura do prédio não foi afetada.

Já na Casa de Saúde Aragão Villar, no São Sebastião, não há mais sequer o portão de entrada. O acesso é livre a qualquer um que se aventure, e a estrutura já foi comprometida com a quebra de paredes para retirada de portas, janelas, guarnições, fiações e louças. Algumas também já foram incendiadas. Os destroços se misturam também a documentos de antigos pacientes. Até frascos com urina e sangue foram encontrados na antiga sala de enfermagem. Do mesmo modo, há também marcas de ocupação: roupas, calçados e cachimbos improvisados para uso do crack.

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