Fica Vivo será inaugurado na Olavo Costa para redução de homicídios
Centro de Prevenção à Criminalidade é demanda antiga; redução de assassinatos em áreas onde há programas chega a 27%
Após uma longa espera e mais de 800 vidas perdidas apenas nos últimos seis anos, Juiz de Fora recebe, nos próximos dias, o programa estadual de prevenção a homicídios Fica Vivo, voltado para jovens entre 12 e 24 anos. Junto com o Mediação de Conflitos, o projeto integra o Centro de Prevenção à Criminalidade (CPC) e vai funcionar no mesmo prédio do Núcleo Travessia, na Vila Olavo Costa, Zona Sudeste. O primeiro bairro a receber a iniciativa também é um dos mais violentos da cidade, como mostrado na série “Vidas perdidas – um raio X dos homicídios em JF“, publicada pela Tribuna em janeiro. O trabalho revelou que 46 pessoas foram executadas somente na Olavo Costa, entre 2012 e 2017, número equivalente a um ônibus cheio. Somando o entorno formado pelas vilas Ideal, Ozanan e o Bairro Furtado de Menezes, os óbitos chegaram a 86, representando mais de um décimo das mortes. Mais da metade das vítimas assassinadas naquele período em todo o município tinham até 25 anos, reforçando a importância da precaução nessa faixa etária.
A vulnerabilidade dos jovens da região, muita atrelada ao tráfico de drogas, pode explicar a escolha territorial para a implantação do Fica Vivo. A expectativa é mudar o cenário de violência, por meio de oficinas de esporte, arte e cultura, além de atendimento psicossocial e encaminhamento para a rede de serviços públicos. Segundo a subsecretária de Prevenção à Criminalidade em Minas Gerais, Andreza Gomes, as pessoas envolvidas na iniciativa já estão trabalhando desde meados de janeiro para conhecer as demandas da população. “Neste primeiro momento, estamos na fase de implantação. A equipe só faz diagnóstico e circula no território apresentando os programas de prevenção. Não fazemos ainda atendimento e não executamos as oficinas, porque é importante que a equipe conheça o território, e que os moradores compreendam o trabalho realizado, para conseguirmos apresentar um plano e começarmos essa execução.”
Segundo ela, na prática, as atividades devem começar na segunda quinzena de abril, com a parte metodológica do programa. Por enquanto, o contato está sendo feito junto a lideranças comunitárias, associação de bairro, espaços de rede e serviços públicos já existentes. O Fica Vivo também se articula com representantes dos órgãos de segurança pública e da Justiça criminal, para que medidas de redução da criminalidade violenta integradas sejam aplicadas. “Entre as funções neste início, está levantar as oficinas a serem desenvolvidas. Para acontecer, precisamos de duas coisas: compreender qual é a demanda do jovem, o que ele gostaria que fosse executado no território, e quais são os possíveis oficineiros que já existem, quem já têm um vínculo com a comunidade, para que possam apresentar seus projetos. Após a avaliação e, a partir da viabilidade, implantamos as oficinas”, explicou Andreza, destacando que a prioridade é de oficineiros moradores.
Questionada sobre a pouca adesão inicial aos serviços oferecidos pelo Núcleo Travessia, inaugurado em parceria com a Prefeitura em 2016, cuja sede chegou a ser apedrejada, Andreza garantiu que as ações do Centro de Prevenção à Criminalidade não acontecem “de fora para dentro”. “Esse histórico foi repassado pela própria comunidade, e isso é um ponto bem interessante, porque falaram da dificuldade da entrada do Travessia no território. Propomos construir essa chegada com os moradores. Por exemplo, a inauguração vai ter a participação de grupos da comunidade, de dança, de escola de samba, e mostra de talentos. Para além disso, temos explicado o tempo todo o que os programas fazem, a partir dos problemas que eles apresentam em termos de segurança pública. Não fazemos uma política de fora para dentro, construímos para a comunidade ser protagonista, junto com o Poder Público e com os programas de prevenção, na solução de problemas.”
‘Temos um histórico de legitimação’
A subsecretária de Prevenção à Criminalidade em Minas Gerais, Andreza Gomes, destacou o funcionamento do Fica Vivo atualmente em 32 centros de prevenção de todo o estado. A abrangência chega a 201 bairros, atendendo, em média, dez mil jovens por mês, realizando cerca de quatro mil atividades mensais. Segundo ela, a experiência começou há cerca de 13 anos. “Já temos um histórico de legitimação das comunidades, que aderem aos programas, procuram os centros de prevenção e vêem ali um ponto de apoio.”
Sobre a questão de verbas para o projeto, Andreza afirmou terem sido planejadas. “O recurso foi apresentado no ano passado no PPA (Plano Plurianual) na Assembleia. Está garantido para a implantação, já sendo executada. Está previsto para os próximos anos também no montante total da secretaria.” Por enquanto, conforme ela, não há expectativa de expansão do programa para outros bairros de Juiz de Fora. “Temos que fazer dar certo a Olavo Costa primeiro”, enfatizou. “É uma intervenção específica para aquela área, para haver uma mudança social. Mas trabalhamos em conjunto com as redes do município e do próprio estado”, disse ela, no caso de uma procura por assistência externa ao bairro.
Para a subsecretária, a redução dos homicídios em 27%, na comparação entre 2017 e 2016, levando em conta a faixa etária atendida pelo Fica Vivo e os locais em que acontece, é bem significativa. “Tentamos o tempo todo compreender qual é a leitura do público. Existe uma legitimação por parte dos moradores e um pedido para não sairmos do território, porque o trabalho é contínuo.”
A subsecretária explicou que, apesar de o Fica Vivo ser voltado para jovens entre 12 e 24 anos, as famílias deles também podem ser atendidas. “Temos uma equipe qualificada com vários profissionais de áreas como psicologia, serviço social e, no caso da mediação, direito. Fazemos o atendimento da demanda que a comunidade, família, ou o jovem apresentar. Não tem restrição. Dependente do pedido, vamos atender ou encaminhar da melhor forma.” Como exemplo, ela citou algum familiar que comunique uma possível evasão escolar, questão de empregabilidade ou mesmo de envolvimento do jovem com a criminalidade. “Vamos trabalhar isso de uma forma bem ampliada.”
Mediação para locais sem acesso a direitos
Áreas com sociabilidade violenta e baixo acesso a direitos são o alvo do programa Mediação de Conflitos, que vai integrar o Centro de Prevenção à Criminalidade (CPC), junto com o Fica Vivo, na Vila Olavo Costa. A proposta é trabalhar meios pacíficos de resolução de problemas. Dados da Secretaria de Estado de Segurança Pública (Sesp) revelam que cerca de 70% dos atendimentos são realizados para o público feminino, principalmente em torno de violência doméstica e familiar, reconhecimento de paternidade, processos de divórcio e separação. Presente em 31 territórios no estado, o projeto realizou 11.870 atendimentos no ano passado.
“O Fica Vivo tem o objetivo de trabalhar com os jovens moradores de 12 a 24 anos na perspectiva de prevenir homicídios. E o Mediação de Conflitos trabalha com a comunidade como um todo. Qualquer morador pode ser atendido, para acesso a direitos e/ou mediação de conflitos comunitários e individuais. Pode ser desde casos que envolvam crianças, adolescentes, até mulheres mais velhas e homens. Por exemplo, um caso de família, em que um irmão brigou com outro; conflito de vizinhança; marido com ex-mulher, que não consegue chegar a um valor de pensão ou de guarda e visita; conflitos comunitários, que envolvam uma rua com o Poder Público ou o problema de uma rua com outra; questões de infraestrutura urbana”, detalhou a subsecretária de Prevenção à Criminalidade em Minas Gerais, Andreza Gomes.