Primeira pista de skate de JF será demolida pela Prefeitura

Edital de requalificação da Praça Antônio Carlos prezava permanência da pista; PJF promete nova rampa até o final do ano


Por Mariana Floriano

24/06/2022 às 10h52

A primeira pista de skate de Juiz de Fora, construída no ano 2000, na Praça Antônio Carlos, será demolida pela Prefeitura (PJF) nos próximos dias. A remoção faz parte de uma série de intervenções para requalificação do centro histórico da cidade. As obras tiveram início esta semana na Praça Antônio Carlos e vão se estender por todo Complexo Mascarenhas. Como forma de compensar a destruição da pista, a PJF prometeu a construção de uma nova rampa até o final deste ano, que ficará ao lado do Viaduto Augusto Franco.

O projeto arquitetônico que definiu a reformulação da praça foi fruto de um concurso público, lançado em 2020 pelo então prefeito Antônio Almas (PSDB), chamado Concurso Fábrica Mascarenhas. Foi estabelecida a verba de R$ 5 milhões para requalificação do Espaço Mascarenhas e da Rua Dr. Paulo de Frontin, que conecta a Praça Antônio Carlos à Praça Dr. João Penido (Praça da Estação).

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(Foto: Divulgação)

No projeto, a necessidade de manter a pista de skate estava explícita, podendo esta ter sua localização revista. De acordo com o edital publicado pela Secretaria de Desenvolvimento Econômico, Trabalho e Turismo (Sedeta), em seu item 8.2.1, inserido na “Caracterização do Objeto e da Áreas de Intervenção”, a permanência era importante por se tratar da primeira pista de skate instalada na cidade. “É de grande importância cultural e social mantê-la dentro daquele perímetro”, diz o documento.

No projeto que venceu o edital, a pista seria realocada para a Praça do Canhão, terreno que pertence ao Exército Brasileiro. O arquiteto responsável pelo desenho, Henrique Zulian, da Austral Studio, empresa curitibana, afirmou à Tribuna que só ficou sabendo que a área não pertencia à Prefeitura após a assinatura do contrato. De acordo com ele, no edital, foi apresentado todo o espaço da Praça Antônio Carlos e da Praça do Canhão para ser trabalhado. “No edital, eles pediam para liberar a Praça Antônio Carlos para eventos, shows, feiras, por isso, realizei essa realocação da pista de skate para Praça do Canhão. Agora, na parte de execução do projeto, esse segundo espaço não foi previsto. Eu apresentei o projeto, ele venceu o edital, mas até a execução, ele é podado, reformulado, pelos órgãos responsáveis da Prefeitura.”

A permanência da pista já não é mais uma possibilidade, é o que afirma a diretora da Associação Juizforana de Skate (AJS), Nicole Faria. De acordo com ela, desde a publicação do edital até agora, a associação tem dialogado com a Prefeitura, para buscar formas de manter a rampa, que possui grande valor simbólico para o movimento skatista da cidade. “Antes da aprovação do projeto executivo nós já demandamos a Prefeitura sobre a permanência da pista. Eles criaram um grupo de trabalho para discutir o desenho arquitetônico. Dava tempo de mudar, mas eles não quiseram. Da nossa parte, nós tentamos tudo o que foi possível, mas já não há mais espaço para discussão. A pista vai ser demolida e ponto. O que temos avaliado agora é a promessa da construção de uma nova rampa, também na região central da cidade.”

Em um vídeo publicado nas redes sociais da AJS, a prefeita Margarida Salomão (PT), em reunião com os skatistas, promete a construção de uma nova rampa bem melhor do que a existente na Praça Antônio Carlos. No vídeo, Margarida diz: “Assino o compromisso de até o final do ano construir uma nova pista em Juiz de Fora, em comum acordo com a Associação, e muito melhor do que todas as outras que temos atualmente”. Porém, de acordo com Nicole, as discussões ainda são muito iniciais. “Não temos, projeto, verba ou orçamento definido para que isso aconteça.” Segundo ela, até o momento, o diálogo visa a construção em um terreno próximo ao Viaduto Augusto Franco.

Em nota enviada à Tribuna, a PJF afirmou que a escolha do terreno envolveu reuniões e visitas técnicas a diversos pontos da região central do município, onde a pista pudesse ser implantada de forma a atender às especificações dos skatistas.

Tapumes

Até a publicação desta matéria, a pista ainda não havia sido demolida. De acordo com a PJF, as obras na Praça Antônio Carlos seguirão pelos próximos dias, com expectativa de duração até 2023. O próximo passo será o cercamento da praça com tapumes, feito isso, será iniciada a demolição de toda estrutura existente. “Na sequência, será realizada a implantação das redes hidrossanitárias e elétricas, pisos, floreiras e bancos, além da construção do novo palco e dos banheiros públicos”, comunicou em nota.

Marco histórico do skate em Juiz de Fora

Pista da Praça Antônio Carlos é considerada um ponto de encontro para os skatistas (Foto: Leonardo Costa)

Para os usuários da pista, não há nada que compense a demolição da rampa. Brunner Lopes, um dos fundadores da AJS, afirma que frequenta a pista desde o primeiro dia e vai frequentar até o último. Ele conta que, nos anos 2000, a pista foi construída na região como forma de atender a demanda dos skatistas que praticavam o esporte em frente a Escola Normal.

“Naquela época, em 1999, tinha muita repressão à prática do skate, a polícia ia lá, aprendia o skate, destruía a rampa de madeira que a gente construía. Foi nesse contexto de opressão que a AJS surgiu, com a intenção de defender nossos interesses e lutar pela construção de pistas públicas na região central da cidade.” A primeira foi a da Praça Antonio Carlos, cerca de dois anos depois, a AJS também conseguiu a construção da segunda rampa do centro de Juiz de Fora, a do Bairro Vitorino Braga.

Brunner afirma que ter pistas no Centro de Juiz de Fora é importante, tanto por dar visibilidade ao movimento, quanto por ser um ponto de encontro de pessoas de diversos bairros. “É uma pista que tem muita demanda, mesmo sendo uma mini ramp, ou seja, só um skatistas pode usar por vez. Sem contar que nós estamos lutando por uma rampa que nem está no seu melhor estado de conservação. O certo era que a Prefeitura ampliasse os espaços e não demolisse os que já existem.” Ele afirma que, das 15 pistas de skate que existem em Juiz de Fora, poucas são boas para usos. “A da praça Antônio Carlos é uma das poucas que tem uma curvatura boa para rampar. Em um projeto de R$ 5 milhões, eu acho inconsistente não reservar uma verba que não chegaria a R$ 30 mil para revitalização da rampa.”

Movimento Salve a PAC

Com o objetivo de impedir a demolição da rampa da Praça Antônio Carlos, um grupo de skatistas levantou uma petição na internet intitulada “Salve a Pac”. Os skatistas Bruno Hagale e Geruze Freitas foram os responsáveis pela criação da petição, que já conta com quase mil assinaturas. De acordo com eles, o movimento foi criado para tentar impedir a destruição de um dos únicos bons pontos para praticar skate em Juiz de Fora.

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“Já estamos lutando pela permanência da rampa desde 2020, quando foram anunciadas as obras na Praça Antônio Carlos. É um lugar que dá muito certo, reúne muita gente, e é um dos poucos que possui as condições adequadas para praticar o esporte”, afirma Bruno. Ele ainda teme que as promessas realizadas pela PJF não sejam cumpridas e os skatistas fiquem durante um grande período de tempo sem acesso a uma pista na região central.

Geruze ressalta que o espaço é esquecido pelo Poder Público, sem receber manutenção adequada, mas mesmo assim é prezado pelos skatistas. “Existe um discurso que skatista é vândalo e gosta de destruir as coisas, mas se a gente pratica o esporte em uma calçada, ou em um local inadequado, é porque a Prefeitura não disponibiliza rampas de qualidade. Tirar a rampa da Praça Antônio Carlos do Centro é marginalizar cada vez mais o skate.”

Ponto de encontro

Além de um marco histórico para o skate em Juiz de Fora, a rampa também é um ponto de encontro para skatistas da nova geração. Daniel Ayoub, de 16 anos, frequenta a pista há pelo menos um ano, desde quando começou a praticar o esporte. “É a pista mais bem localizada e atende a todos da melhor forma. Na minha opinião, demolir (a pista) é totalmente desnecessário, porque lá não é um lugar de vandalismo, ou coisa do tipo, e sim um lugar onde a gente se reúne para andar e se divertir fazendo aquilo que ama.”

Carlos Eduardo Santos, de 18 anos, compartilha da opinião e afirma que a pista é o único local onde pessoas de todos os cantos da cidade se reúnem para praticar o skate. “Mesmo que existam outras pistas é lá que todo mundo se encontra. A pista reúne pessoas de todas as idades, os antigos e os novos que estão começando agora e querem aprimorar as habilidades. É como uma casa pra gente e por isso nós estamos lutando contra a demolição.”

Para Douglas Eduardo, de 21 anos, a demolição da pista representa o apagamento de mais de 20 anos de história. “Muitas pessoas passaram por ali, muitas lembranças foram criadas e memórias que não podem ser substituídas.” Para ele, a pista é um símbolo do skate na cidade, um lugar que reúne gerações e mostra, até mesmo para aqueles que estão apenas de passagem, a importância do skate para a cidade.

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