Desrespeito às vagas e falta de acessibilidade


Por Eduardo Valente

24/02/2015 às 06h00- Atualizada 24/02/2015 às 12h11

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Na Braz Bernardino, o problema está na ausência de rampas de acesso nas vagas destinadas aos cadeirantes

As vagas regulamentadas na área central de Juiz de Fora para idosos e deficientes são constantemente ocupadas por usuários não cadastrados, o que dificulta a mobilidade deste público pelas ruas. Além disso, muitos dos pontos destinados a cadeirantes não atendem às regras de acessibilidade previstas na Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT). Em muitos dos locais observados pela reportagem, não há sequer rampas de acesso em áreas próximas, o que obriga quem usa cadeira de rodas a disputar espaço no asfalto, em meio aos carros.

De acordo com a Settra, existem 40 vagas destinadas aos idosos e outras 50 para deficientes físicos na área central. No entanto, os espaços disponíveis nos bairros não foram divulgados.

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O servidor público federal Israel Pinheiro, 25 anos, usuário de cadeira de rodas desde os 11, sente na pele o desrespeito. Segundo ele, a situação é pior nos bairros, onde a fiscalização é menos intensa. Em sua opinião, a conhecida “paradinha rápida” dos condutores convencionais ainda é a grande vilã daqueles que, de alguma forma, necessitam usar as vagas especiais. “No Centro, tenho tido sorte de encontrar agentes prestativos e competentes. Mas com relação às vagas, em algumas não existe rampa ou estão em local de difícil travessia ou ainda áreas esburacadas. Ainda há aquelas rampas que ficam no meio da vaga, o que inviabiliza o uso. Sem contar aquelas curtas, o que impossibilita abrir o porta-malas.” Outra reclamação de Israel é quanto à limitação dos horários das vagas, que acompanha a regra da Área Azul, entre 8h e 18h. “Que eu saiba, nenhum deficiente volta ao ‘normal’ após as 18h. Se a condição física limitadora permanece não intermitente, não há porque a acessibilidade urbana ser mitigada.”

Problema cultural

De acordo com a chefe do Departamento de Políticas para Pessoas com Deficiência e Direitos Humanos, órgão subordinado à Secretaria de Desenvolvimento Social (SDS), Thaís Altomar, a falta de respeito é cultural. Ela, que também é cadeirante e dirige o próprio veículo, lamenta que a falta de educação ainda aconteça. “É preciso promover campanhas intensas reforçando a necessidade de respeitar estes espaços e também aplicar a multa. Em frente ao departamento mesmo (Rua São Sebastião) as vagas destinadas aos deficientes físicos nem sempre são respeitadas, o que me obriga a parar na Área Azul. Muitos cadeirantes reclamam, e isso resulta até em brigas e discussões no trânsito.”

Segundo ela, o número de pessoas com deficiência que querem usar estes espaços é cada vez maior, mas os motoristas não credenciados ainda insistem no abuso. “Acham que não irão atrapalhar ninguém se ficarem cinco minutos parados. Geralmente ligam o pisca-alerta e, quando o guarda é acionado e apita, o condutor chega e tira o carro. Pior mesmo em áreas privadas, como bancos e supermercados, onde os guardas não entram. Acontece que os proprietários não gostam de se indispor com os clientes, então as vagas não são respeitadas.”

Readequar rampas e calçadas

Conforme a Settra, o Executivo aguarda liberação de recurso, por meio do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) para readequação das calçadas, o que contemplaria rampas de acessibilidade. A proposta, avaliada em R$ 150 mil, já foi aceita pelo Ministério das Cidades e, agora, é esperado o envio do contrato, pela Caixa Econômica Federal, para contratação de empresa para desenvolver os projetos básicos. Ainda conforme a pasta, após levantamento feito no fim do ano passado, foram reformadas ou construídas 15 rampas nas avenidas Getúlio Vargas, Brasil, Governador Valadares, e também na Praça Alfredo Lage, no Bairro Manoel Honório.

De acordo com o subsecretário Operacional de Transporte e Trânsito da Settra, Eduardo Facio, a partir da operação da nova Área Azul, a ser iniciada em breve, as vagas de idosos e deficientes físicos serão realocadas. O objetivo é organizá-las de forma que fiquem mais próximas uma das outras. Sobre o horário de regulamentação para idosos e deficientes, limitado entre 8h e 18h, ele explica que a regra segue o mesmo intervalo de tempo determinado para as vagas da região central. “Essa revisão nunca foi solicitada formalmente, mas se isso ocorrer, lógico que iremos reavaliar.”

Papel articulador

Segundo a chefe do Departamento de Políticas para Pessoas com Deficiência e Direitos Humanos, Thaís Altomar, seu departamento tem papel articulador, podendo atuar na sugestão de melhorias ou solicitação de novos espaços. Sobre o desrespeito das regras de acessibilidade previstas na ABNT, como a ausência de rampas de acesso às calçadas e a necessidade de evitar a circulação entre veículos, ela informa que nenhuma vaga de estacionamento na cidade tem o desenho correto. “Na Rua Santo Antônio mesmo, que tem vaga para deficiente, se o condutor sair do carro, corre o risco de morrer, porque não tem segurança alguma.”

Falta de educação com os idosos

No caso dos idosos, as vagas são diferentes daquelas reservadas aos deficientes físicos por haver cobrança de estacionamento rotativo pago. Em flagrantes feitos pela Tribuna nas ruas do Centro, diversas irregularidades foram observadas. A mais comum era do usuário, jovem ou adulto, parar nestes espaços e colocar o cartão da Área Azul no vidro dianteiro. Em nenhum momento foram encontrados guardas para identificar e coibir os abusos.

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Para o gerontólogo José Anísio Pitico da Silva, que também é integrante da Comissão Permanente de Direitos do Idoso da Câmara Municipal, o desrespeito aos direitos das pessoas mais velhas ainda é uma realidade no país. “No cotidiano da cidade há uma grande falta de educação para com o envelhecimento das pessoas. Não é surpresa perceber que fatos como esses relacionados ao trânsito aconteçam. Isso é falta de educação social, porque a convivência ainda precisa evoluir muito. É preciso aprender a ter respeito e entender as necessidades sociais deste público. Juiz de Fora precisa avançar muito não só nesta questão, como também da acessibilidade como um todo, pois as calçadas ainda são esburacadas e a sinalização precisa ser mais evidente.”

Segundo ele, melhorar esta relação parte da necessidade de investir em educação. “Juiz de Fora tem mais de 80 mil pessoas com 60 anos ou mais, mas suas demandas não estão na agenda pública. É preciso mudar isso, e penso que os idosos precisam se organizar politicamente para buscar e exigir seus direitos.”

Mais fiscalização

De acordo com o subsecretário Operacional de Transporte e Trânsito, Eduardo Facio, a partir do início da implantação do novo sistema de rotativo pago, o que deve ocorrer em breve, a fiscalização será intensificada. “Estamos cientes do problema e vamos modificar a forma de fiscalizar estes abusos”, informa, embora tenha preferido não adiantar quais serão as mudanças e os mecanismos para que isso deixe de acontecer. Em todo o caso, ele explicou que denúncias de irregularidades podem ser registradas por meio dos telefones 3690-7400 e 2104-7400. Já pedidos de cadastramentos para uso destas vagas devem ser solicitados pelo telefone 3690-8218.

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