Câmara libera arma de fogo para Guarda Municipal

Alteração na principal legislação do município está em debate na Câmara e permite que PJF equipe corporação com armamento letal


Por Tribuna

23/09/2017 às 06h30

Por Marcos Araújo e Renato Salles 
Foto: Olavo Prazeres

A possibilidade de uso de arma de fogo pela Guarda Municipal de Juiz de Fora pode virar realidade na próxima semana, quando projeto de emenda à Lei Orgânica, que retira trecho que vedava a utilização desse tipo de armamento pela corporação, irá à votação em segundo turno na Câmara. Especialistas da área de segurança pública defendem amplo debate com a sociedade sobre o assunto, embora considerem a medida inevitável diante do agravamento da criminalidade violenta na cidade, que, só entre janeiro e julho, registrou 997 casos de roubos consumados, segundo a Secretaria de Estado de Segurança Pública. Juiz de Fora também chegou ao homicídio de número cem em 2017, no último dia 16, conforme dados levantados pela Tribuna e que levam em conta as mortes decorrentes de atividades criminosas. Os estudiosos ressaltam que, para tal iniciativa não se transformar num equívoco, no entanto, será preciso investimento no treinamento e capacitação dos guardas municipais.

Em reunião realizada nesta sexta-feira (22), a Câmara aprovou em primeiro turno projeto de emenda à Lei Orgânica que altera a redação do artigo 2° do Ato das Disposições Transitórias. Na prática, a mudança proposta pelo vereador José Fiorilo (PTC) retira do texto trecho que vedava a utilização de armas de fogo por integrantes da Guarda Municipal. Assim, o artigo em questão pode ter nova redação e trazer o seguinte trecho: “É vedada a utilização da Guarda Municipal (GM) na repressão de manifestações públicas, sendo autorizado o porte legal de arma de fogo aos seus componentes, observadas as disposições da Lei Federal nº 13.022, de 8 de agosto de 2014.”

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Para ser incorporada à Lei Orgânica, a alteração voltará a ser discutida pelo Poder Legislativo. Se aprovada uma vez mais, seguirá para sanção do prefeito Bruno Siqueira (PMDB).

Na visão do coordenador do Centro de Estudos de Segurança Pública da PUC Minas, Luis Flávio Sapori, o armamento das guardas municipais é uma tendência nacional, uma vez que, atualmente, elas estão se transformando em polícias municipais, porque, cada vez mais, participam ostensivamente do patrulhamento das ruas. Mas o pesquisador faz uma ressalva: “Tem que haver um bom investimento e contínuo na capacitação dos guardas municipais, pois, sem isso, tal medida pode ser um problema, porque pode criar uma série de erros e equívocos por parte dos guardas”. Sapori lembra que já há um estatuto nacional que permite às guardas municipais o trabalho de patrulhamento com uso de arma de fogo. “É inevitável e justicavél também em virtude do crescimento da violência”, avalia.

Já para o professor do Departamento de Ciências Sociais da UFJF, André Gaio, a liberação do uso de armas de fogo pode ser mais uma demanda da própria Guarda em razão da insegurança do que uma medida que irá impactar de forma positiva a questão da segurança. “A Guarda existe para guardar bens públicos, hospitais, escolas e mesmo nisso tem falhado flagrantemente. Então, corre-se vários riscos, como o de essas armas serem utilizadas de maneira errada, o risco de haver aumento de índice de homicídios”, diz o professor.

Ele considera não haver necessidade de tal medida, já que a corporação conta com armas não letais, que servem para a imobilização, como spray de pimenta e tonfas. “Onde eles (os guardas) têm que atuar não temos notícias sobre troca de tiros ou uma outra situação de perigo. Isso então responde em parte ao medo da Guarda e, em parte, ao medo da própria sociedade”, frisa. Para ele, esse tipo de tema deveria ser levado com mais amplitude para discussão com a sociedade. “É bom lembrar que a licença para a pessoa portar arma de fogo, cada vez mais, está mais exigente. Então, temos que confiar que serão feitos exames rigorosos para esse acesso a essas armas entre os guardas municipais”, pontua o professor.

A Tribuna entrou em contato com a Guarda Municipal, mas foi informada que o comando só irá se posicionar após a tramitação do projeto de emenda em segundo turno.

Vereadores defendem medida

Durante a discussão da proposta, o vereador José Fiorilo (PTC), autor da matéria, pediu a palavra após ser motivado pelo líder do Governo, José Márcio (Garotinho, PV) a detalhar um pouco mais o projeto. Fiorilo argumentou que a proposição adéqüe a legislação municipal a outras regras de abrangência nacional, citando a Constituição e lei federal de 2014, que permite porte de arma de fogo por guardas municipais. “Aos guardas municipais é autorizado o porte de arma de fogo, conforme previsto em lei”, afirma o texto da lei 13.022/2014, o Estatuto Geral das Guardas Municipais. “Na própria estrutura da lei que cria a Guarda Municipal já diz que ela pode ser armada”, justificou Fiorilo.

“Tem que haver um bom investimento e contínuo na capacitação dos guardas municipais, pois, sem isso, tal medida pode ser um problema” Luiz Flávio Sapori, pesquisador

 

Por várias vezes, Fiorilo frisou que o intuito da alteração na Lei Orgânica não é o de conferir, de imediato, o acesso a armas de fogos aos guardas, mas, sim, definir um viés autorizativo que permita ao Município seguir por este caminho, mediante capacidade financeira e todo os treinamentos e capacitações necessárias. “Para armar a Guarda, tem uma série de requisitos que deve ser seguido. Minha proposta não é de armar a Guarda, mas colocar a nossa lei orgânica à legislação federal. Se vai ou não armar, ficara a critério do Executivo, que deverá atender a regras rigorosas.”

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A proposta foi defendida por outros vereadores, como Carlos Alberto Mello (PTB). “É claro que toda guarda armada precisa ter seus treinamentos, caso o Município queira implementar uma corporação armada. Esta é uma discussão que que está ocorrendo em todo o Brasil. Nós temos que nos adequar à lei federal.” Colega de partido de Fiorilo, Luiz Otávio Coelho (Pardal, PTC) considerou a mudança na Lei Orgânica pertinente e mostrou confiança de que uma possível utilização de arma de fogo poderia conferir maior segurança aos guardas na execução de suas atividades. Outro a manifestar apoio foi Charlles Evangelista (PP). “Temos que começar a nos movimentar para ir além e armar de fato a Guarda municipal.”

Medida é uma demanda da corporação

Por fim, Fiorilo afirmou que a demanda pela alteração da Lei Orgânica teria partido de integrantes da própria corporação. “Vários me procuram em meu gabinete. É um desejo deles, assim como foi a lei que já aprovamos aqui que permite o uso de spray de pimentas e tonfas.” Em julho de 2015, a Câmara aprovou projeto de lei de autoria da Prefeitura autorizando o uso de outras armas e equipamentos não letais pela Guarda Municipal. Em vigor, a lei municipal considera como instrumentos não letais artefatos projetados para conter, debilitar ou incapacitar temporariamente pessoas, como gás incapacitante e tonfa ou bastão, armamento de lançamento de projétil de borracha e pistola de condutividade elétrica.

“Temos que começar a nos movimentar para ir além e armar de fato a Guarda municipal.” André Gaio, professor da UFJF

Tramitação
O projeto de emenda à Lei Orgânica iniciou tramitação no último dia 23 de junho. O texto apareceu na pauta de votação pela primeira vez na última quarta-feira (20), quando sua apreciação, em primeira discussão, foi adiada por pedido de vista do vereador Marlon Siqueira (PMDB). A proposta retornou a ordem do dia nas reuniões desta sexta-feira, quando, após a realização de três sessões extraordinárias, acabou aprovada em caráter terminativo pelo plenário.

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